Quando eu era garotinha, muitas vezes ficava à noite observando as estrelas com meu pai, e juntos ponderávamos sobre a grandiosidade de Deus. Nós nos deitávamos de costas, em silêncio, e nos deleitávamos admirando o céu — uma janela que se abria a um universo infinito. Em momentos como esses, eu sentia uma proximidade especial com meu pai, possivelmente porque juntos ali, nós nos sentíamos muito próximos de Deus. A lembrança dessas noites permanece comigo e continua a me ensinar valiosas lições sobre o poder da humildade, para revelar um vislumbre da Vida infinita.
Uma compreensão da Vida, Deus, tornou-se de repente imperativa, quando meu pai faleceu inesperadamente, fazendo com que eu me deparasse com o maior desafio que já enfrentara. Depois de meses oscilando entre a oração e muita luta, finalmente percebi que orar a respeito de perda e dor tem a ver com descobrir outra história: aquela que revela que, exatamente ali onde a dor e a perda parecem estar, existe uma porta aberta para a alegria e a transformação.
É preciso um imenso esforço espiritual para navegar pela história humana relativa à morte. Para mim, isso é maravilhosamente expresso nesta declaração de Mary Baker Eddy, a qual me guia de maneira infalível: “O propósito celestial das sombras terrenais é o de purificar os afetos, repreender a consciência humana e fazer com que ela se volte, de bom grado, de um senso material e falso de vida e felicidade, para a alegria espiritual e a avaliação correta a respeito do existir” (Retrospecção e Introspecção, p. 21).
Embora eu não tenha percebido no início, o que a Sra. Eddy nos revela é o fato de que há um único fluxo infinito da Vida, no qual todos nós existimos continuamente — e do qual não podemos sair. Uma estimativa material e mortal de vida sugere que seja possível nos desligarmos desse fluxo e ficarmos separados dele. No entanto, apesar da noção difundida de que a mortalidade é a natureza da nossa existência, as batalhas da vida humana podem nos tornar humildes e nos incitar a reconhecer que a imortalidade é nossa verdadeira vida. Nesse sentido, o sofrimento humano nos convida tanto a nos elevar, quanto a aprofundar ainda mais nossa compreensão.
Durante os primeiros meses após ter perdido meu pai, temi haver perdido parte da minha própria identidade, bem como a conexão palpável com a Vida divina. Apesar das orações diárias e do apoio que havia a meu redor, eu caí em profunda depressão. O pesar e a escuridão pareciam uma prisão. Ainda assim, apesar dessa batalha mental, eu sabia que, ao voltar-me a Deus de todo o coração, encontraria um novo caminho. Fiquei exausta devido ao constante senso de perda e me senti disposta a empreender uma completa renovação de minha compreensão da Vida.
Podemos superar a morte a cada dia, vencendo toda e qualquer crença na finitude.
A jornada rumo a uma maior compreensão espiritual me fez repensar minha percepção a respeito do passado. As lembranças de eventos passados, que pipocam a todo instante, tentam explicar a dor, justificar a depressão ou reviver a perda. Essas imposições mentais podem ameaçar nosso progresso.
Para a mente humana, a depressão parece ser algo do qual não conseguimos escapar. Mas Deus, a Mente divina, está sempre nos chamando de volta ao Espírito. Por várias semanas depois que meu pai faleceu, minha mãe e eu adotamos diferentes conceitos espirituais para nos orientar em nossas orações. Durante as primeiras semanas, nosso tema foi vigilância mental. Enquanto lutava contra a forte depressão, passei a vigiar mais os pensamentos.
Podemos superar a morte a cada dia, vencendo toda e qualquer crença na finitude.
Antes disso, eu havia permitido que a depressão me fizesse sentir separada de Deus, a Vida divina. Percebi que a depressão não me poderia ser imposta, apesar de todo o senso comum afirmar o contrário. Eu não era vítima, mas um agente ativo que podia escolher entre permitir ou não que pensamentos deprimentes tivessem o controle sobre mim. Deus, o Amor, permanecera imutável o tempo todo, e agora me pedia ternamente que eu mudasse minha perspectiva para ver esse fato com mais clareza. Essa percepção não curou, de uma só vez, todos os sintomas de depressão mas foi o primeiro passo para a cura.
Embora o peso da depressão tenha começado a diminuir nos meses seguintes, um senso de pesar e um sentimento persistente de perda ainda me assolavam com frequência. Certa noite, angustiada, ajoelhei-me no chão, buscando em Deus uma resposta. E a resposta veio, terna e clara, como sempre acontece quando a buscamos com sinceridade. Como se Deus redirecionasse meu pensamento, lembrei-me de algo que meu pai me havia dito: “Você só vence a morte por meio do Amor. Ame, simplesmente”.
Por muito tempo, eu não havia entendido por completo essa afirmação mas, naquele momento, tudo ficou claro. Quando eu observava as estrelas com meu pai, caso eu tentasse encontrar alguma luz no espaço escuro ao redor das estrelas, nunca conseguia ver nada. Da mesma forma, percebi que estava tentando encontrar significado e respostas na morte e no desespero. Mas, não tendo por natureza nenhuma substância, essa busca só fazia com que me sentisse ainda mais perdida e envolta na escuridão. A resposta era o Amor, que é espiritual e permanente, e é a única verdadeira substância, forma ou formato.
Tentar encontrar respostas ou significado na morte é como tentar obter luz das trevas. Por isso, o passo seguinte foi focar novamente a luz — o Amor — para compreender que a graça de Deus cria constelações de significado e conexão espiritual em nossa vida.
É impossível encontrar uma solução para a perda enquanto tentamos entender por que a morte aconteceu. Mas, ao reajustar meu foco e minhas ações no Amor, eu me realinhei com a verdadeira substância e com a Vida e pude vivenciar as qualidades paternas de Deus. Aprendi que só conseguiria perceber a infinita individualidade espiritual de meu pai, quando me voltasse para nosso infinito Pai-Mãe Deus, o Espírito. Como afirma o Salmista: “...em ti está o manancial da vida; na tua luz, vemos a luz” (Salmos 36:9).
Em sua autobiografia, Retrospecção e Introspecção, a Sra. Eddy escreveu sua própria história familiar, que incluía vários eventos trágicos, como a morte do primeiro marido, a separação do único filho, um infeliz segundo casamento e uma quase constante invalidez, antes da descoberta da Ciência Cristã. Mas, após contar esses eventos, ela escreveu: “É preciso revisar a história humana, e o registro material precisa ser totalmente apagado” (p. 22). Por saber que essas palavras vinham de sua luta pessoal com um passado difícil, eu senti que encontrara uma instrução confiável para seguir.
Revisar algo significa alterá-lo, geralmente à luz de mais informações. Nos meses que se seguiram, ao lutar com as lembranças — quer as tristes que atemorizavam, quer as felizes que provocavam saudade — eu disse muitas vezes a mim mesma para “revisar e apagar”. Tendo aprendido que só aquilo que expressa o Amor e a Vida constitui a verdadeira experiência, passei a me empenhar em libertar-me daquilo que não expressava o Amor e a Vida, e a guardar só aquilo que estava de acordo com o Amor e a Vida, trocando assim uma lembrança trágica pelo seu oposto, a verdade espiritual. Constatei que esse processo, assim como revisar um artigo ou um livro, exige disciplina e humildade. Também me trouxe paz, força e a mais profunda alegria. E foi isso o que permaneceu. Hoje, estou livre do pesar e da depressão, e sinto o terno convite para uma caminhada mais próxima a Deus.
Um querido amigo me disse, certa vez, que podemos realmente superar a morte a cada dia, vencendo toda e qualquer crença na finitude. Aprendi isso por meio das inúmeras e ternas maneiras pelas quais Deus me guiou em cada vale sombrio dessa experiência. E hoje tenho a certeza de que Deus sempre responde quando pedimos, e que a porta está sempre aberta quando batemos. A proximidade com meu pai continua a se aprofundar de maneiras lindas, por meio da proximidade com nosso Pai, e minha alegria e leveza espiritual foram restauradas.
