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“Não temos nós todos o mesmo Pai?”

Da edição de maio de 1997 dO Arauto da Ciência Cristã


Um Dia Um advogado angolano me fez uma visita, em Boston. Havia emigrado de seu país assolado pela guerra e queria estabelecer-se com sua família no continente americano. Como profissional altamente conceituado, tencionava exercer a advocacia. Sabendo que eu era do Brasil, perguntou-me se a discriminação racial seria um obstáculo para um negro, na América do Sul.

Estas palavras de Castro Alves, poeta de meados do século XIX, soaram forte em meu pensamento:

Ó mar, por que não apagas
Co'a esponja de tuas vagas
Do teu manto este borrão? O Navio Negreiro, Castro Alves: Poesias Completas de Castro Alves, São Paulo, Edição Saraiva, 1953.

O poema alude às atrocidades cometidas nos navios negreiros que atravessaram o Atlântico alguns séculos atrás, deixando um "borrão" no oceano. Já hoje não existe, virtualmente, a escravidão, pois foi abolida. O processo não foi rápido. De início, houve decretos que libertaram as crianças nascidas de mulheres escravas: em 1813, na Argentina e em 1860 no Brasil. Em 1853, a primeira Constituição argentina declarou livres todos os cidadãos. Nos Estados Unidos, esse penoso desenvolvimento se revestiu da Guerra de Secessão, causando muito sofrimento. A Décima Terceira Emenda da Constituição norte-americana, em 1865, baniu a escravidão dentro dos Estados Unidos e de todas as terras sob sua jurisdição. No Brasil, a Princesa Isabel assinou a Lei Áurea, libertando todos os escravos, no dia 13 de maio de 1888. Mas apesar de todas essas medidas, o borrão não foi apagado. Só desaparecerá quando a discriminação racial deixar de existir.

Não consegui dar uma resposta definida ao advogado angolano. Mas durante nossa conversa concordamos que era importante conhecer nossa origem real, espiritual, a fim de encontrar terreno comum, onde os ideais se harmonizam e onde se pode estabelecer uma sociedade pacífica. Não se trata de conquistar outros povos a fim de obter direitos, ou de tentar ficar quites com os outros. Trata-se isto sim, de reconhecer onde é que nós todos nos originamos e o que temos em comum por direito divino.

Todos nos relacionamos com Deus como nosso Pai e Mãe. Por essa razão, relacionamo-nos entre nós como parentes e como iguais.

Estas palavras de Malaquias, na Bíblia, surgiram durante a conversa: "Não temos nós todos o mesmo Pai? Não nos criou o mesmo Deus?" Malaquias 2:10. A maioria das pessoas que admite a existência de Deus, seja qual for sua religião, responderá afirmativamente. Deus, a Mente divina, é o Pai e Mãe de todos nós. Todos somos criados pelo mesmo Deus, à Sua semelhança. Temos essa origem espiritual em comum. Todos nos relacionamos com Deus como nosso Pai e Mãe. Por essa razão, relacionamo-nos entre nós como parentes e como iguais.

Assim sendo, quais são algumas das pretensões históricas que explicam a discriminação e o ódio entre as raças? Para muitos, elas repousam sobre a suposição de que todos os nossos antepassados provêm de gerações humanas limitadas, que começaram com as figuras bíblicas de Adão e Eva. Nessa alegoria ocorre uma criação material que constitui, a partir daí, o palco para todas as discórdias e divisões entre os homens. No relato, Adão adormece profundamente. Ver Gênesis 2:21–24. Não há nenhum registro de que ele acorda desse sono. E nós, se acreditarmos que nossa própria vida se limita e se sujeita às discórdias e divisões da criação material, acaso não estaremos aceitando esse mesmo "sono adâmico"? Acaso não podemos, nós mesmos, despertar, ainda que Adão não tenha despertado, e compreender que nosso verdadeiro Pai é Deus, o Espírito divino? Acaso não podemos nós, hoje em dia, encontrar a verdadeira relação entre Deus e o homem, uma relação onde reina a harmonia? Não podemos recuperar a verdadeira irmandade entre os homens e vencer o tumulto da discriminação racial?

Os filhos da criação de Deus são livres. Eles têm todos os privilégios da filiação divina. Na história da criação de Deus não houve nenhum borrão.

Os ensinamentos de Cristo Jesus apresentam uma nova medida de amor, capaz de superar todas as formas de ressentimentos e separações. Eles revelam o Cristo, a influência divina que fala diretamente à consciência humana e apresentam o amor imutável de Deus para o homem. O Cristo está falando à consciência humana hoje, a você e a mim. Nenhuma situação está fora do alcance ou além da capacidade do Cristo. O Cristo é capaz de apaziguar o tumulto de um mundo onde parece prevalecer o racismo. O Cristo não se intimida nem se detém diante da violência. Ele está rompendo as barreiras de separação e discriminação, revelando a identidade real e espiritual de cada indivíduo.

Quando reconhecemos essa identidade do homem, uma identidade espiritual, outorgada por Deus, ajudamos a apagar o triste registro histórico dos mortais. Os filhos da criação de Deus são livres. Nunca foram escravizados nem deslocados, nunca estão em posição de desvantagem, nunca são menos do que dignos. São plenamente capazes de expressar a Deus e de compreendê-Lo. Eles têm todos os privilégios da filiação divina. Na história da criação de Deus não houve nenhum borrão.

A fim de apagar o registro material, precisamos elevar-nos a um conceito mais alto sobre nosso próximo, não somente daqueles que nos rodeiam hoje, mas também daqueles que nos precederam. Nossos pais humanos, nossos avós, bisavós, etc., todos eles se relacionam com Deus como Pai divino. A identidade real, espiritual, de todos eles não está marcada de cicatrizes, ela permanece intacta.

Não nos esquecemos do sofrimento humano nem o ignoramos. Ao contrário, reconhecemos que ninguém jamais ficou fora do cuidado de Deus. O amor de Deus nunca esteve confinado a um bairro, nem foi excluído dele. Ninguém jamais usurpou o amor de Deus nem o gastou. Esse amor não está destinado somente a um número seleto de pessoas ou a um grupo de uma determinada ancestralidade.

Falando da história e da ancestralidade humana, a Sra. Eddy diz: "Meros incidentes históricos e acontecimentos pessoais são frívolos e sem importância, a menos que elucidem a ética da Verdade. Com esse fim, e somente com esse fim, tais narrativas podem ser admissíveis e recomendáveis; mas se as conclusões espirituais forem separadas de suas premissas, o nexo se perde, e o argumento com suas conclusões corretas torna-se por isso mesmo obscuro. É preciso revisar a história humana, e apagar o registro material." Retrospecção e Introspecção, pp. 21–22.

Ao ler esta revista, pense em como você pode, em seu próprio pensamento, fazer desaparecer o registro das diferenças humanas, das injustiças ou do ódio racial, elevando-o com um conceito mais nobre a seu próprio respeito e a respeito dos outros. A Sra. Eddy também escreve: "Admitir no íntimo que o homem é a própria semelhança de Deus, põe o homem em liberdade para assenhorear-se da idéia infinita." Ciência e Saúde, p. 90. Você é essa semelhança. Você é livre, você é digno, você merece o amor de seu Pai. Você não é vítima, porque sua verdadeira origem é divina, não importa como sua raça, cultura ou história humana pretendam descrevê-lo. Aí mesmo onde você está, ou onde está o seu próximo, está o filho de Deus, o herdeiro de Deus.

A conversa com o advogado angolano não foi em vão. Os tópicos que abordamos nos deixaram a ambos com uma sensação de que o que temos em comum é muito mais e maior do que nossas diferenças. Tanto ele como eu nos sentimos comprometidos a fazer a nossa parte, a respeito do assunto da nossa longa entrevista. Ambos sentimos a necessidade de levar avante a obra de ver cada indivíduo da forma como Deus o vê.

A abolição da escravatura no século XIX foi apenas o primeiro passo adiante, em nosso despertar para reconhecer os direitos individuais do homem. Houve mais progresso neste século, em que vimos cair o Muro de Berlim e o sistema de apartheid. A atividade liberadora do Cristo na consciência humana prossegue, sem interrupção. Estamos entrando no século XXI com maior reconhecimento de que todas as boas qualidades que reivindicamos para nós, já as temos em comum com nosso próximo. À medida que aceitamos esse fato, percebemos que as palavras de Cristo Jesus se aplicam a todos, em todas as nações, até hoje: "Vinde, benditos de meu Pai! Entrai na posse do reino que vos está preparado desde a fundação do mundo." Mateus 25:34.


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O Arauto da Ciência Cristã

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