“Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem” (ver Lucas 23:34). É sempre importante ler essas palavras que o Mestre, Cristo Jesus, disse quando, diante de seus olhos, os elementos mais agressivos do pensamento material se desdobravam, em toda a sua crueldade. De fato, essas palavras nos convidam a considerar o perdão sob uma perspectiva diferente.
Era o conhecimento que Jesus possuía da realidade espiritual que o capacitava a compreender o perdão divino e a ver a si mesmo e aos outros livres do sofrimento e do pesar. Se desejamos compreender melhor a capacidade que o Mestre tinha de perdoar, devemos começar a entender a teologia que ele ensinou e demonstrou.
Parecia que a história de Jesus não teria um bom desfecho, mas ela não termina com a crucificação e sim com o triunfo completo sobre a morte, mediante a ressurreição e ascensão. Ele estava travando o “bom combate” (1 Timóteo 6:12); ele estava se atendo à sua compreensão de que a vida é eterna e de que sua identidade é espiritual. Ao agir assim, ele estava se libertando completamente de qualquer senso material de identidade e se identificando com sua identidade espiritual, o Cristo, que perdura, independentemente do tempo.
Quando seguimos seu exemplo, nos identificando persistentemente como o reflexo de Deus, e estamos conscientes da nossa unidade indestrutível com a Vida, Deus, conseguimos comprovar que quaisquer pensamentos sombrios que tenhamos hoje, e que talvez consideremos como consequências inevitáveis de experiências do passado, são superados com toda naturalidade.
O perdão que vem de Deus remove da consciência humana todo pensamento errôneo ou malicioso, e esse perdão abençoa a todos nós.
O perdão que vem do Cristo traz à tona as imagens mentais dolorosas, associadas ao nosso passado terreno, para destruí-las com a luz da Verdade.
Aquilo que não perdoamos parece estar conosco no presente, como uma ferida a ser curada. Ficar ressentido é reviver aquele sentimento ruim repetidas vezes, como se fosse uma música que se repete em nossa mente e que não conseguimos tirar do pensamento. Quando compreendemos mais claramente que esses pensamentos errôneos, e o sofrimento que trazem, pertencem somente ao presente, temos a possibilidade de corrigir agora mesmo esse sentimento doloroso, independentemente de quando ocorreram os eventos considerados por nosso senso sofredor como aqueles que ocasionaram a dor.
Por trás da resistência em perdoar, está o sentimento de que alguém está em débito conosco. Na raiz da palavra perdoar está a ideia de “renunciar à nossa demanda de gratificação ou vingança”. Isso exige uma nova atitude mental, como também estarmos dispostos a deixar de lado a exigência de algum tipo de “compensação”.
Sob um ponto de vista metafísico, aquilo pelo qual acreditamos estar sofrendo não tem nenhuma origem verdadeira, uma vez que, em realidade, nunca estivemos separados da fonte de toda bem-aventurança, o Amor divino. Nada pode afetar nossa plenitude e bem-estar, porque esses sempre provêm do onipresente Deus, e nós coexistimos com Deus e dEle emana toda bênção verdadeira.
Também devemos considerar o senso de autocondenação. Condenar a nós mesmos por erros cometidos no passado é algo que tenta resistir à transformação que o Cristo vem realizar em nossa consciência. O Cristo, a Verdade, nos salva dessa ilusão, dando-nos a certeza de que nunca deixamos o estado de perfeição, dado por Deus, para então cairmos em pecado. A pureza, a inocência e a santidade permanecem para sempre intactas.
Quando nos damos conta de que estivemos pensando erroneamente, sentimos o arrependimento que nos leva a estabelecer a ideia correta em nosso pensamento. Ao pensarmos corretamente no presente, ficamos livres do fardo de qualquer senso de que temos um “débito” pendente que não conseguiremos pagar, porque esse débito, ou erro, é destruído.
Quando Cristo Jesus resgatou a mulher adúltera daqueles que desejavam apedrejá-la e a libertou do pecado de adultério, ele dissolveu da consciência da mulher a percepção de que havia um “acusador”. Ele a fez compreender que ela não tinha acusadores, pois, em realidade, ela era espiritualmente livre e pura.
Quando Jesus a despediu, simplesmente lhe disse: “Vai e não peques mais” (João 8:11). Poderíamos parafrasear essas palavras, desta forma: “De agora em diante, certifique-se de pensar corretamente e de agir de acordo com sua nova maneira de pensar”. Ele nunca disse que ela teria de pagar pelos atos cometidos no passado. A justiça divina é sempre restauradora.
Jesus exemplificou o perdão que vem de Deus e como esse perdão, que procede da compreensão, liberta-nos definitivamente de todo sofrimento.
A incapacidade de perdoar assenta sobre alguma forma de idolatria, porque quando agimos assim estamos dando identidade ao mal e considerando que “alguém” seja a causa do nosso infortúnio ou mal-estar. Essa é uma teologia errônea.
Mary Baker Eddy, a Descobridora e Fundadora da Ciência Cristã, e fiel seguidora de Cristo Jesus, teve uma vida cheia de contrastes. Seu pensamento ascendente teve de enfrentar muitas situações difíceis, e ela venceu todas elas por meio de sua crescente compreensão de Deus e de Sua criação pura e perfeita. No final de seus dias terrenos, ela havia se libertado de muitas limitações, recuperado a saúde e deixado para a humanidade um legado maravilhoso e de valor indescritível: a Ciência Cristã.
No livro Mary Baker Eddy, The Years of Discovery [Mary Baker Eddy, Os Anos de Descoberta], Robert Peel relata que, quando a Sra. Eddy foi cruelmente separada de seu filho, porque sua família não a considerava forte o suficiente para cuidar do menino de maneira adequada, ela ficou totalmente desolada. Mas, ao lutar, apoiando-se no amor e no apoio sanador de Deus, ela conseguiu progredir espiritualmente e se elevar cada vez mais acima do sonho de sofrimento.
Quando ela já havia se elevado acima de todo o pesar mediante a compreensão espiritual que adquiriu, ela escreveu: “É bom saber, caro leitor, que nossa história material, mortal, é apenas um registro de sonhos, e não da existência real do homem, e o sonho não tem lugar na Ciência do [existir]. É como ‘um conto ligeiro’, e ‘como a sombra que declina’ ’’ (Retrospecção e Introspecção, p. 21). Depois, ela acrescenta: “É preciso revisar a história humana, e apagar o registro material” (p. 22).
Descobrimos cada vez mais nossa verdadeira história, a realidade espiritual da nossa eterna unidade com Deus, conforme crescemos em compreensão espiritual e fortalecemos nosso caráter cristão, e isso acontece à medida que nos tornamos cada vez mais conscientes de Deus e de que somos semelhantes a Ele.
Em Não e Sim, a Sra. Eddy escreve: “Para mim, o perdão divino é aquela presença divina que infalivelmente destrói o pecado; e insisto na destruição do pecado como a única prova completa de seu perdão. ‘Para isto se manifestou o Filho de Deus: para destruir as obras do diabo’ (1 João 3:8)”. No parágrafo seguinte, ela completa: “Jesus expulsava os males, servindo como mediador entre o que é e o que não é, até ser alcançada uma consciência perfeita” (p. 31).
A compreensão crescente da verdadeira natureza de Deus, o bem, apaga as impressões deixadas pelas experiências do passado, da mesma maneira que o pleno despertar apaga os vestígios dos sonhos quando acordamos pela manhã. Então compreendemos que tudo está bem, que não perdemos nada e que nada nos falta; que esse sonho agitado nunca modificou nem sequer um pouquinho da nossa identidade e herança divinas, que podem ser comprovadas aqui e agora.
Podemos seguir os passos do nosso Mestre, empenhando-nos em alcançar a compreensão que traz o verdadeiro perdão e demonstra nossa herança de vida eterna.
