Antigamente, eu me esforçava para entender qual o benefício de seguir esta orientação que Jesus dá no Sermão do Monte: “Ouvistes que foi dito: Olho por olho, dente por dente. Eu, porém, vos digo: não resistais ao perverso; mas, a qualquer que te ferir na face direita, volta-lhe também a outra” (Mateus 5:38, 39). Compreendi que a qualidade a que Jesus estava se referindo era a mansidão.
Um dicionário define mansidão como “falta de determinação ou coragem”, outros a consideram sinônimo de fraqueza e submissão, e outros ainda a definem como sinônimo de covardia.
Eu, com certeza, não queria ser um fraco. Decidi pesquisar o que a Bíblia e a Ciência Cristã falam sobre a mansidão.
Uma das bem-aventuranças, que também faz parte do Sermão do Monte proferido por Jesus, diz: “Bem-aventurados os mansos, porque herdarão a terra” (Mateus 5:5). Um comentário bíblico sugere que essas palavras “são a profecia de que será constatado que a mansidão é um poder maior no mundo, do que o orgulho”, e também acrescenta que “a mansidão é irresistivelmente atraente e exerce uma influência espiritual maior do que qualquer outro tipo de característica” (J.R. Dummelow, ed., A Commentary on the Holy Bible [Comentário sobre a Bíblia Sagrada], p. 640). Na introdução do comentário sobre as bem-aventuranças, um dos colaboradores sugere que ser abençoado é ser feliz sem nenhum motivo relacionado ao que está acontecendo no mundo, mas compreendendo o relacionamento de si mesmo com Deus (ver p. 639).
Fiquei surpreso ao concluir que minha felicidade e meu bem-estar exigem que eu sacrifique o orgulho humano e expresse mansidão. Embora eu pensasse anteriormente que levar um soco na cara e mansamente não reagir significasse aceitar a subserviência e a vergonha, passei a entender que a base desse pensamento era a crença de que a existência seja material. Essa maneira de pensar dificultaria a percepção da mensagem sanadora do Cristo e perpetuaria o mal ao invés de vencê-lo.
Mary Baker Eddy, a Descobridora e Fundadora da Ciência Cristã, escreve sobre o significado de voltar a outra face: “ ‘A qualquer que te ferir na face direita, volta-lhe também a outra.’ Isso quer dizer: não temas que ele te bata outra vez por tua longanimidade” (Ciência e Saúde com a Chave das Escrituras, p. 444). A longanimidade requer paciência, autocontrole e moderação. Pode significar ser tolerante e perdoar quando provocado. Esses são fortes atributos, qualidades divinas, e devemos almejar manifestá-los com mais clareza e frequência. A Sra. Eddy também escreve: “Há demasiada coragem animal na sociedade e não há suficiente coragem moral” (Ciência e Saúde, pp. 28–29). Comecei a compreender que a mansidão se assemelha mais à longanimidade do que à fraqueza.
A inspiração do Cristo nos faz sentir felicidade, harmonia e bem-estar. Essa percepção espiritual é uma escolha. Quando somos tentados pelas circunstâncias, atitudes ou sensações a ceder a paixões como raiva, orgulho ou ressentimento, sempre temos a liberdade de decidir se vamos reagir espiritualmente ou emocionalmente.
Jesus mantinha seu pensamento em constante sintonia com as percepções espirituais provenientes de Deus, em vez de ceder a qualquer uma dessas paixões. Essa sintonia constante com a verdadeira ideia espiritual do existir é o que lhe permitia curar instantaneamente. Não é por acaso que Jesus conseguiu demonstrar a perfeição eterna de Deus — o Espírito — e a criação espiritual. Essa demonstração foi o resultado de escolher constantemente reconhecer que tanto ele como todos os outros, por serem a expressão espiritual do único Deus, que é todo-amoroso e todo-poderoso, não poderiam ser prejudicados de nenhuma maneira, ou seja, não eram vulneráveis ao que os sentidos físicos erroneamente relatam.
Jesus poderia ter sentido a tentação de ter pena de si mesmo, de sentir medo, raiva e vergonha quando os soldados romanos o humilharam, açoitaram e crucificaram. Mas, em vez disso, ele expressou compaixão, orando na cruz por seus inimigos: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem” (Lucas 23:34). Essa foi uma verdadeira expressão de mansidão e preparou o caminho para a ressurreição e ascensão de Jesus.
A mansidão mantém o pensamento focado naquilo que Deus sabe, e não no que a mente mortal — uma mentalidade supostamente oposta a Deus — imagina. Esse enfoque impede que sejamos enganados ou passíveis de engano, independentemente da gravidade das circunstâncias ou dos sintomas que possamos apresentar. O pensamento focado no que Deus sabe — que Sua criação é totalmente boa — não pode ser levado a acreditar que o sofrimento seja real. E esse pensamento com compreensão traz harmonia à nossa vida. Nele reside o poder da mansidão.
Recentemente, ao dar marcha a ré em meu carro, acabei saindo um pouco rápido demais da garagem. Quando olhei pelo retrovisor, notei que havia um homem passeando com seu cachorro no meio da rua, bem atrás do carro. Pisei bruscamente no freio, parando a uma distância pequena do homem e do cão. Isso irritou o homem, que atirou algo contra a lateral do meu carro, com uma pancada forte.
Saí do carro e fui verificar se havia algum amassado. O homem tinha arremessado um saco de fezes de cachorro recolhidas durante sua caminhada. O saco havia se rasgado e o conteúdo acabara sujando a porta do carro.
O homem assumiu uma postura defensiva. Parecia pronto para uma briga. Fiz uma pausa e ponderei sobre a pesquisa que eu fizera havia pouco tempo sobre o significado de voltar a outra face. A seguinte mensagem do Cristo veio ao meu pensamento: nós dois éramos a expressão da Mente perfeita, Deus, por isso eu não poderia prejudicar nem assustar esse homem, e ele não poderia ficar com raiva de mim nem querer me prejudicar. Decidi reagir a partir desse ponto de vista espiritual.
Pedi desculpas ao homem. Perguntei sobre o cão dele e falei sobre o meu. Comentei que poderíamos acabar nos encontrando ao passear com nossos cães. Nós nos apresentamos, e então ele perguntou se eu queria ajuda para limpar a porta do carro. Disse-lhe que não seria necessário. Ele retomou sua caminhada, e eu limpei a sujeira. Fiquei feliz com minha reação espiritual. Ninguém ficou envergonhado. Alguns anos antes, eu teria reagido de maneira defensiva, e depois me arrependeria.
Essa experiência me levou a dar uma nova definição para o termo mansidão em meu próprio pensamento: vencer a tentação de reagir com orgulho, medo, ressentimento etc. Quando fico tentado a reagir, eu me pergunto: “Quando é que a circunstância material é tão grave ou a sensação física tão forte que justifique eu me deixar levar por alguma dessas emoções?” Atualmente, mesmo que eu levasse um soco, esperaria ter a coragem moral de voltar a outra face. Sei que eu seria abençoado se o fizesse.
Isso não significa simplesmente aceitar algo errado que tenha sido feito contra nós. Significa compreender que podemos rejeitar qualquer sugestão de que corremos algum risco e precisamos assumir uma postura defensiva ou agressiva, pois todos nós expressamos naturalmente a invulnerabilidade e o bem de Deus. Podemos ser gratos pelo fato de tudo ser exatamente como tem de ser na realidade divina — imutavelmente harmonioso. Essa é a mansidão que não é enganada e nem é passível de engano.