“E agora, glorifica-me, ó Pai, contigo mesmo, com a glória que eu tive junto de ti, antes que houvesse mundo” (ver João 17:5). Essas palavras não foram proferidas por um triunfante potentado, regressando da conquista, mas por um homem prestes a sofrer a crucificação devido à sua bondade. Não foram proferidas em uma época em que a paz reinava em todo o mundo civilizado, mas sim, quando a crueldade, a injustiça, a perseguição, a agressão, e a maldade assolavam a terra. Essa notável declaração foi proferida em um país onde preconceitos raciais permeavam as doutrinas religiosas, as ações políticas e os decretos governamentais. Elas foram ditas por alguém “desprezado e o mais rejeitado entre os homens”, mas continuaram vivas no coração dos homens, ao longo de todas as eras que se seguiram. Foram proferidas à sombra de uma cruz, mas se cumpriram na ressurreição de Jesus Cristo.
Pouco antes de judeus e romanos, políticos e soldados, sacerdotes e povo se unirem, na tentativa de destruir a vida temporal desse homem justo, ele havia declarado que tinha poder para dar a vida eterna a todos os que Deus lhe havia dado. Quando a carnalidade se vangloriava de que iria dar fim à sua missão, destruir sua existência e roubar-lhe toda a fama sagrada, Jesus sabia que estava sendo glorificado pelo poder que era o Amor primordial, eterno e universal. Ele não pediu a glória do mundo, mas sim a glória de “antes que houvesse mundo”. Poderia a força física impedir que esse pedido fosse atendido? Poderia o ódio humano afastá-lo da presença do Pai? Poderia o mundo interferir entre a Vida eterna e a sua manifestação revelada?
O fato de Jesus ter proferido essa notável oração indica que ele sabia que a Vida estava mantendo o homem no ponto da perfeição, ali mesmo e naquele exato momento. Ele estava declarando que a natureza divina, naquele exato momento, estava fazendo com que os fatos da Vida eterna aparecessem no homem, que é sempre o filho espiritual de Deus, e ele, Jesus, estava trazendo essa verdade à consciência humana. Estava praticamente repetindo a sua própria declaração: “…ninguém subiu ao céu, senão aquele que de lá desceu, a saber, o Filho do Homem [que está no céu]” (ver João 3:13). Nenhum poder podia manter fora do céu o homem que estava no céu.
A glória “antes que houvesse mundo” significava para Jesus a capacidade da Vida eterna de preservar para sempre, no homem, a felicidade do paraíso do Espírito, “o senso espiritual da Vida e do poder”, como a Sra. Eddy escreve em Miscellaneous Writings [Escritos Diversos] 1883–1896, p. 70. Essa glória proclamava a ação da lei divina, que mantém o homem inseparável de Deus, e nunca o abandona à aniquilação. Essa glória era também a existência no Espírito e pelo Espírito, onde as capacidades e as oportunidades do infinito são eternamente expressas no homem. Isso significava o eterno desdobramento da identidade consciente do Ser indestrutível.
Nossa Líder declara: “A progressão infinita é o existir concreto, que os mortais finitos veem e compreendem apenas como glória abstrata. À medida que a mente mortal, ou seja, o senso material de vida é descartado, vem à luz o senso espiritual, a Ciência, do existir” (Ibid., p. 82). No momento em que a mente carnal acreditava que a carreira do homem Jesus estava no fim, ele estava consciente e reivindicando a “progressão infinita” como a glória constantemente outorgada ao homem por seu Pai divino. Jesus reivindicava isso, não como algo novo que alcançaria mais tarde, mas como o estado no qual o homem habita eternamente com Deus; como aquilo que o mundo nunca havia desestabilizado ou modificado.
A consciência da unificação com Deus, a qual nosso Mestre irradiava, expressa nas sagradas palavras em João 17:5, brilhou no momento da mais profunda escuridão que a terra conheceu. O Cristo, a Verdade, estava prestes a ser repudiado por autoridades seculares e religiosas; o homem que havia ensinado e demonstrado o poder divino seria crucificado, e os seus discípulos dispersados. Os amigos iriam traí-lo, os inimigos caluniá-lo, e as pretensas forças do suposto mal pareceram se unir para apagar da terra o nome e os ensinamentos de Jesus Cristo. Os métodos insidiosos da maldade entronizada eram uma tentativa de banir o Cristianismo do coração e do pensamento dos homens. O poder de Deus seria abertamente desprezado e ridicularizado pelas massas, inclusive talvez por alguns a quem Jesus havia curado. No entanto, aquele que nos mostrou o Caminho, sabendo que tudo isso iria acontecer e já se encontrando no limiar do ameaçador cataclismo, disse: “…e agora, glorifica-me, ó Pai, contigo mesmo, com a glória que eu tive junto de ti, antes que houvesse mundo”.
Nesse pedido, Jesus praticamente declarou que estava pronto para deixar que aparecesse o homem espiritual, ali onde o mortal parecia estar; que estava pronto para deixar o Filho de Deus substituir o filho de Maria; para deixar que a individualidade do infinito e do eterno dissipasse a aparência do finito e temporal. Ele estava ciente de que o humano estava pronto para ceder ao que é divino, em todos os pontos. Estava pronto a renunciar a todas as crenças de vida, substância e inteligência na matéria e, inevitavelmente, vivenciar o surgimento do homem espiritual à semelhança de Deus. Jesus sabia que o erro só estava se desmascarando e agindo para sua própria destruição, ao passo que ele próprio permanecia com a Ciência do Princípio divino e sua paz perpétua.
Por meio de passos pacientes e persistentes de compreensão e superação, o poderoso e gentil Nazareno havia percorrido o caminho dos sentidos para a Alma, durante mais de trinta anos. Ele sabia que o último e maior ataque do aparente mal não poderia destruir o ganho espiritual das suas realizações anteriores, mas que essa evidência acumulada de poder divino silenciaria para sempre, em sua consciência pura, o último sussurro de um poder oposto a Deus. Os fatos da existência espiritual eram mais reais para ele do que as sombras da materialidade. A glória da identidade divina era mais vívida em seu pensamento do que a escuridão do senso mortal. Ele confiava em que a natureza divina abarcaria a natureza humana, com sua inquestionável demonstração de onipotência.
Essa confiança não era descabida. A oração de Jesus foi atendida e seu trabalho concluído. Os gritos de “crucifica-o” foram engolidos pela doçura eterna das palavras do Mestre: “Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou; não vo-la dou como a dá o mundo. Não se turbe o vosso coração, nem se atemorize” (João 14:27). O sepultamento foi seguido pela ressurreição e, os quarenta dias seguintes, pela ascensão. A vitalidade dos seus ensinamentos e demonstrações tem aumentado ao longo de todos os séculos e a profecia se cumpriu na Ciência Cristã, que está ensinando cada um de nós a despertar para a glória da nossa verdadeira identidade como filhos de Deus.
A Ciência Cristã, a Ciência que Jesus ensinou e viveu, declara que “…os fatos primordiais do existir são eternos; nunca se extinguem em uma noite de desarmonia” (Miscellaneous Writings, p. 187). Esse claro eco do ensinamento daquele que nos mostrou o Caminho chega hoje aos corações feridos, apontando a vereda da harmonia. Não importa quão profundas possam parecer as trevas da experiência mortal, não importa quão agressivos tenham se tornado os argumentos do erro, não importa quão cruéis sejam as circunstâncias que parecem nos engolir, esse é o momento de os fiéis orarem: “…e agora, glorifica-me, ó Pai, contigo mesmo, com a glória que eu tive junto de ti, antes que houvesse mundo”. O fato primordial de que o homem é um com Deus não foi destruído pelas aparências do erro. O poder do bem onipotente e onipresente permanece inalterado e é capaz de transformar nosso tropeço em ascensão. Hoje, como no tempo de Jesus, o Amor divino pode trazer à compreensão humana a Vida que é Deus, bem como o homem amado por Deus, ou seja, a verdadeira e eterna identidade de todos e de cada um de nós.
A mesma verdade que elevou Jesus acima do senso de desgraça iminente, e que o levou a vencê-la, diz ao coração entristecido ou desanimado de hoje:
“Ao triste chama: ‘Vem ao meu peito,
Teu pranto quero secar
E a tristeza dissipar;
Lar sublime vim te dar
Entre as glórias de um dia sem fim’.”
(Hino 298 do Hinário da Ciência Cristã, trad. © CSBD)
O Amor divino não mantém os homens lutando em longos dias de privação e desespero, mas os eleva ao “dia sem fim” do Espírito, onde há um “lar sublime” para todos. Mas notemos que a exortação para nos chegarmos ao peito do Amor precede a declaração de que o Amor quer ministrar-nos ternos cuidados. Isso significa reconhecermos antes a presença de Deus com o homem, reconhecermos a identidade espiritual do homem como filho de Deus, e subordinarmos o senso humano e material das coisas à Verdade divina. Esse aproximar-se humanamente da realidade eterna não deveria ser difícil nem causar apreensão, pois a palavra “peito” indica que a realidade é o Amor da Mãe, que está pronto para, ao menor toque, responder com consolo e satisfação, para transmitir imediatamente ao necessitado a própria essência da harmonia divina.
Não existe nenhuma “tristeza” tão densa que não possa ser dissipada pela glória da Verdade espiritual. Não existe aparência de perigo tão iminente que não se possa provar sua impotência, por meio da compreensão do Amor divino. Não existe nenhuma ameaça do mal que não possa ser silenciada pela Palavra de Deus. Não existem dois poderes, o bem e o mal, mas apenas um, ou seja, o bem. Neste bem infinito o homem vive, se move, e tem sua existência eterna. Jesus conhecia essa verdade, por isso ela se revelou no seu caso em grau cada vez maior, até se tornar o tudo-em-tudo de sua existência. O mesmo privilégio pertence a todos os que hoje estudam e aplicam os ensinamentos de Jesus, tal como foram revelados na Ciência Cristã.
A hora mais escura na experiência humana oferece a oportunidade de deixarmos a materialidade e nos volvermos para a realidade divina, ou seja, passarmos do finito para o infinito. Esse é o momento em que a consciência humana pode fechar a porta ao senso mortal, e abri-la de par em par para a compreensão espiritual. Nesse ponto, a aparência de submissão ao mal pode ser descartada, e o relacionamento indissolúvel entre Deus e o homem pode ser compreendido. O pensamento pode se tornar consciente daquilo que Deus é capaz de fazer por Seus amados filhos, em vez de acreditar no que o erro ameaça ser capaz de fazer ao suposto objeto do seu ódio. Nesse momento, o mundo dos sentidos materiais dá lugar ao céu da Alma.
A hora mais escura, quando divinamente iluminada, é o momento em que nossos campos já branquejam para a ceifa e nossa colheita é recolhida ao “lar sublime” da compreensão espiritual, não para ser destruída pelo falso ceifeiro, a morte. Isso, e muito mais, é o que Jesus deixou implícito em sua declaração sobre a glória dada por Deus ao homem. É isso que a Ciência Cristã está demonstrando aos corações fiéis nesta época, reiterando, repetindo a salvação pelo Cristo. O coração dos homens não precisa ficar perturbado nem amedrontado. A glória “antes que houvesse mundo” está aqui e ainda estará quando o senso mortal de mundo tiver desaparecido.