Skip to main content Skip to search Skip to header Skip to footer
Original para a Internet

Como poderia eu perdoar?

Da edição de dezembro de 2022 dO Arauto da Ciência Cristã

Publicado anteriormente como um original para a Internet em 12 de setembro de 2022.


Sentei-me em um banco ao ar livre, totalmente arrasada pelo que acabara de ouvir.

Um jovem, que fiquei conhecendo inesperadamente, acabava de me informar que seus avós haviam participado das forças rebeldes que, havia mais de cinquenta anos, durante minha infância, tinham matado meu irmão mais novo, destruído meu lar e devastado a vida de nossa família. Todas as lembranças terríveis voltaram à tona: eu vi a criança pequena que eu havia sido, a violência que aquela criança havia testemunhado, e fiquei dominada pela dor, pela raiva e por um ódio que eu não sabia que ainda estava tão vivo dentro de mim. A história humana que eu tentara suprimir durante tantos anos veio à tona ― e agora estava diante de mim, me encarando.

Naquele dia, enquanto conversávamos, o jovem havia apresentado uma expressão de perplexidade e ficou desconcertado quando, de repente, ele começou a dar-se conta de quem eu era. Eu nasci em uma parte da África que havia sido colonizada por europeus. Meu pai, um engenheiro de cor branca, havia sido designado para trabalhar para uma empresa naquela região, em um momento em que as forças rebeldes locais estavam causando agitações, lutando para o país ficar independente do domínio colonial. Fomos pegos bem no meio daquela luta. Quando a agitação pela busca da independência começou, as forças rebeldes invadiram e vandalizaram nossa pequena cidade, estuprando ou massacrando quase todos os que estavam em seu caminho e forçando os moradores brancos restantes, incluindo minha família, a fugir às pressas apenas com a roupa do corpo. 

Só muitos anos mais tarde, quando conheci o homem que se tornaria meu marido, comecei a encontrar uma saída daquela angústia mental que, embora eu não houvesse percebido, ainda assombrava todos os meus passos. Ele era Cientista Cristão, assim como sua mãe, uma praticista da Ciência Cristã. Fiquei atraída pelo modo como eles encaravam a vida, e que eu mesma comecei a pôr em prática. Era uma vida centrada em Deus e no reconhecimento de que Deus é o bem e é tudo, e na perfeição e natureza sem pecado de Sua criação.

Nas décadas que se seguiram, tive muitas provas de cura como resultado dessa visão espiritual da existência. Mas eu ainda não havia tratado integralmente dos eventos de minha infância, que me haviam ancorado no ódio, no ressentimento e na tendência de me perguntar constantemente “Por que eu?”

Depois de ouvir a admissão daquele jovem, ajoelhei-me mentalmente e pedi ajuda a Deus. Como poderia eu chegar a algum ponto onde encontrar paz e perdão?

Eu levava comigo naquela viagem um exemplar do livro-texto da Ciência Cristã, Ciência e Saúde com a Chave das Escrituras, escrito por Mary Baker Eddy. Quando o abri aleatoriamente mais tarde naquele dia, meus olhos se depararam com a definição de Getsêmani, o jardim onde Cristo Jesus pediu a seus discípulos que vigiassem e orassem com ele na noite anterior à sua crucificação, mas, em vez disso, eles acabaram adormecendo. A palavra Getsêmani está ali definida como “Paciência no sofrimento, o humano cedendo ao que é divino; amor que não vê retorno, mas ainda assim permanece amor” (p. 586).

Amor que não vê retorno, mas ainda assim permanece amor? Como podemos amar quando nos deparamos com a indiferença ou, especialmente, com o ódio?

Então me veio ao pensamento esta resposta de Deus: “Não é o amor humano que é necessário, mas sim Meu amor. É Meu amor que permite que você ame até mesmo aqueles que você considera seus inimigos; é Meu amor que enxuga suas lágrimas; é Meu amor que está com você, que vai curar suas feridas”. 

Comecei a ver uma saída para aquela situação devastadora. 

Abri um livro que contém ensaios escritos pela Sra. Eddy, e li um deles, intitulado “Amai os vossos inimigos”, no qual ela pergunta: “O que é que te causa dano? Pode a altura, ou a profundidade, ou qualquer outra criatura separar-te do Amor que é o bem onipresente — que abençoa infinitamente a um e a todos?” A passagem continua dizendo: “Simplesmente considera como inimigo aquilo que contamina, desfigura e destrona a imagem-Cristo que tu deverias refletir” (Escritos Diversos 1883–1896, p. 8).

Perguntei a mim mesma: Estaria eu sustentando um inimigo em minha mente durante todo esse tempo, revivendo as lembranças do que uma pessoa ou várias pessoas haviam feito, e fazendo disso uma realidade? Compreendi que o ódio e a falta de vontade de perdoar resultavam de eu acreditar que tinha uma história mortal na qual havia sido vítima. Era esse o verdadeiro inimigo. Teria eu me permitido lançar raízes nesse falso senso de história, e ignorado a única história que eu possuo ou que qualquer outra pessoa possui — uma história espiritual e eterna com Deus, que inclui apenas o bem? Deixar para trás a história material e aceitar nossa verdadeira história espiritual significa que o humano está cedendo ao divino. 

Esse era o meu momento Getsêmani — estaria eu disposta a fazer o que Cristo Jesus teria esperado de um discípulo? O que eu estava sendo solicitada a fazer era estar bem desperta, vigiar e orar para ter a Mente que havia em Cristo Jesus; ver apenas a expressão do Amor divino vivo dentro de mim, dentro daquele jovem, na criança que eu havia sido, em minha família, na família dele. E saber que todo o continente foi e sempre será governado por esse Amor, não pela vingança, nem pelo ódio, nem pelo medo. Todos estão incluídos nas infinitas bênçãos do Amor, que estão eternamente se desdobrando diretamente do nosso divino Pai-Mãe.

Fiquei mais em paz, e o pânico que havia se instalado dentro de mim foi desaparecendo.

Tanto no Antigo como no Novo Testamento, a mensagem “Amarás o teu próximo como a ti mesmo” é repetida. Ciência e Saúde explica: “Amar o próximo como a si mesmo é uma ideia divina; mas essa ideia jamais pode ser vista, sentida, ou compreendida pelos sentidos físicos” (p. 88). Somente por meio do senso espiritual, que é derivado de Deus, podemos discernir a natureza verdadeira e inocente do homem e amar o homem e a mulher que a Mente divina criou.

Jesus demonstrou esse amor puro, mesmo em face ao ódio declarado. Embora tivesse muitos inimigos, Jesus nunca devolveu o mal com o mal. Nada do que alguém tenha dito ou feito conseguiu impedi-lo de amar e perdoar até mesmo aqueles que tentaram matá-lo, e essa expressão do amor do Cristo capacitou-o para vencer o mal com o bem, e para ser ressuscitado da sepultura.

A voz de Deus me veio novamente: “Eu sou Tudo”. Eu sabia que em Deus, que é tudo, está incluída Sua criação, onde não há nem sequer um único vestígio de ódio. Vestigium em latim significa pegada, vestígio, que são deixados para trás. Pensei em uma pegada que fica para trás na areia, ou uma marca impressa na memória humana a respeito de algum evento. Ambos são vestígios de alguma coisa.

Quando o Amor divino dissolve o ódio, não resta mais nenhum vestígio desse ódio, exatamente como a luz, quando aparece, elimina a escuridão, e não deixa mais nenhum vestígio dessa escuridão, nenhum vestígio de que ela alguma vez tenha existido. Eu não tinha de remover o ódio de meu pensamento, eu apenas tinha de sentir o amor todoabrangente de Deus, e esse amor apagaria a escuridão do ódio.

O alívio de abandonar o fardo de ódio e medo de tantos anos foi algo que não se pode comparar a nada. Literalmente, senti que esse fardo se esvaía. Senti-me grata, livre e amada.

No dia seguinte, quando vi aquele jovem novamente, ele estava sorrindo e o olhar em seu rosto era de amor e alegria. Vi o mesmo alívio estampado em sua face que, tenho certeza, também estava estampado na minha. Ele me deu um abraço e disse: “Eu perdoo”. Que liberdade ele deve ter sentido para poder dizer isso, e talvez também de ver para além das gerações de angústia acumulada que minha pele branca representava para ele.

“Eu perdoo”, disse eu de volta para ele. Não havia necessidade de dizer nada mais.

Para conhecer mais conteúdo como este, convidamos você a se inscrever para receber as notificações semanais do Arauto. Você receberá artigos, gravações em áudio e anúncios diretamente via WhatsApp ou e-mail.

Inscreva-se

Mais nesta edição / dezembro de 2022

A missão dO Arauto da Ciência Cristã 

“...anunciar a atividade e disponibilidade universal da Verdade...”

                                                                                        Mary Baker Eddy

Conheça melhor o Arauto e sua missão.