Admito. Quando minha filha era um bebê e eu ficava em casa 24 horas por dia, procedia de forma indulgente para a satisfazer todos os meus caprichos. Indulgente é a palavra certa. Isso foi antes da era do vídeo cassete ou do TiVo, gravador digital que captura e armazena programas. Se uma pessoa quisesse seguir uma novela, ela teria de estar diante da TV todos os dias na mesma hora. Portanto, além de cuidar de uma criança, minha agenda incluía novelas. Uma delas envolvia a heroína da história, a personagem Maria, que era corajosa e bondosa. Maria, diferentemente dos outros personagens, era altruísta e sempre fazia a coisa certa. Talvez eu e muitos outros aficionados por novela gostássemos de ver o contraste entre a "bondosa" Maria e a (menos bondosa) Erica.
Eventualmente voltei a trabalhar fora e tinha de perguntar aos outros sobre o que estava acontecendo com a família da novela. Contudo, em um determinado ano, achei-me assistindo a alguns trechos da novela, enquanto trabalhava em um abrigo para mulheres e crianças. Essas mulheres foram vítimas de violência doméstica e muitas delas pareciam traumatizadas por terem sido desarraigadas de sua vida. A ajuda que o abrigo podia proporcionar, preparar as refeições, cuidar de seus filhos e a possibilidade de assistir à novela favorita, ajudava a consolar aquelas mulheres que se encontravam em meio a uma grande convulsão emocional. Além disso, a novela me dava a oportunidade de estabelecer uma ligação com elas, enquanto acompanhávamos o que acontecia com nossos amigos e inimigos mútuos, as famílias da novela.
À medida que o Natal se aproximava, fiquei especialmente sensibilizada com o fato de que era importante para aquelas famílias estarem em um ambiente de apoio, em um lugar que celebrava tudo o que era bom durante a época natalina. Infelizmente, os autores da nossa novela haviam decidido que era hora de fazer desaparecer a altruísta Mary, que então teve uma morte inesperada. A cada dia, as residentes do abrigo e eu assistíamos ao elenco reagindo àquela perda repentina, e eu percebia como isso afetava as famílias que lá estavam. Chorávamos e lamentávamos como se nossa velha amiga Maria tivesse realmente morrido. Os preparativos natalinos ao invés de serem uma época cheia de esperança, estavam repletos de tristeza.
Sabia que tinha de renovar minha compreensão do significado mais profundo do Natal, a fim de afastar a melancolia. Os cultos na igreja que freqüentava foram muito úteis nesse sentido, pois me fizeram lembrar de que tanto os humildes pastores como os homens sábios foram guiados a procurar e a encontrar o santo menino, seguindo uma estrela. Compreendi que qualquer que fosse nosso propósito na vida, não poderia haver um momento em que estivéssemos fora do cuidado de Deus. Sabia que isso também tinha de ser verdadeiro no abrigo para as famílias, que, muito freqüentemente, pareciam suspirar diante de quadros e fotos de famílias felizes, mas sentiam-se excluídas.
Para mim, isso significava que aqueles que celebram o Natal, celebram, na verdade, o nascimento de um novo conceito do amor de Deus que elevaria toda a humanidade a uma nova era, chamada Cristandade.
Fui solidária com elas. Quando comecei a estudar a Ciência Cristã, sentia-me excluída do amor de Deus e realmente indigna por fazer parte de Sua família. Quando conversei sobre isso com uma amiga, ela me perguntou se era possível que eu fosse a única exceção à regra. Seria eu realmente a única pessoa que Deus criara sem prover suprimento nem cuidados? "Claro que não!", disse eu com indignação. Posso não ter percebido na ocasião, mas compreendo agora que a intenção dela foi me ajudar a me libertar dos altos e baixos emocionais da minha vida, da minha própria novela pessoal.
Semelhantemente, compreendi que a ninguém no abrigo poderia ser negada a capacidade de prosperar e seguir rumo a uma vida segura, um lar que abrigasse os filhos e os pais, um lugar onde eles pudessem viver sem medo. Mesmo o período vivido no abrigo podia abençoar essas famílias. Sabia que a tragédia da violência não era maior do que a realidade do amor de Deus por Seus filhos.
Um dos hinos que cantei na igreja, "Manhã de Natal", descreve Cristo Jesus como "Suave luz de paz, Amor" (Hinário da Ciência Cristã, 23). Para mim, isso significava que aqueles que celebram o Natal, celebram, na verdade, o nascimento de um novo conceito do amor de Deus que elevaria toda a humanidade a uma nova era, chamada Cristandade. Percebi também que o "Amor" vivo tinha de alcançar cada um de Seus filhos, incluindo aquelas mulheres do abrigo. À medida que orava dessa maneira, comecei a sentir uma mudança na atmosfera do abrigo. Ajudar as crianças a comprarem presentes para suas mães trouxe felizes cochichos. O mesmo se dava com as mães, quando colocavam algumas coisas sob a árvore para seus filhos. À medida que o Natal se aproximava, percebi que agíamos como uma única família e que o novo ano por vir parecia menos assustador para todos nós.
Jesus ensinou que Deus é o Pai divino de todos. Aliás, é tanto Pai, quanto Mãe. Esse Deus ama a cada um de Seus preciosos filhos e cuida deles como um bom pai o faria, encoraja seus esforços e nunca causa dor ou sofrimento. Como Jesus o demonstrou, a novela de sofrimento não é a realidade da vida, e ela não tem nenhuma autoridade ou capacidade de arrastar alguém a uma trágica perda diária. Desligar essa mensagem e sintonizar na promessa de paz do Cristo traz à luz o significado real, a alegria e a pureza da época natalina.
Mary Baker Eddy escreveu certa vez que ela celebrava o Natal ao entrar no quarto do pensamento, um quarto mais elevado: "onde todas as coisas são puras e de boa fama..." (Miscellaneous Writings 1883–1896, p. 159). Essa passagem me remete ao fato de que regozijar no espírito do Cristo que Jesus incorporou, e vivê-lo, não se restringe apenas a um determinado dia em dezembro. Ao contrário, refere-se ao nascimento da esperança e da alegria, a ver que o amor de Deus abrange todos, no mundo inteiro, cura doenças e tristezas e eleva a consciência de cada um a uma compreensão e apreciação mais amplas de todas as coisas duradouras e eternas.
Minha oração neste Natal é que esse amor impulsione a cada um de nós a olhar para cima, não para baixo, para as assim-chamadas novelas da vida, ou seja, a procurar e a encontrar algo além do que se apresenta como escuridão inevitável.
O terno Cristo é o meio pelo qual o amor de Deus alcança nossa consciência. Cristo é tão cheio de luz que, mesmo na escuridão da noite, pastores vigilantes e homens sábios que o buscavam puderam encontrar aquela estrela de amor reluzente, guiando-os a uma nova oportunidade de honrar tudo o que é bom e esperançoso. Minha oração neste Natal é que esse amor impulsione a cada um de nós a olhar para cima, não para baixo, para as assim-chamadas novelas da vida, ou seja, a procurar e a encontrar algo além do que se apresenta como escuridão inevitável. Então, seguir aquela luz, aquela estrela.
Em 25 de dezembro de 1927, Calvin Coolidge escreveu de próprio punho e publicou na Casa Branca, em Washington, esta mensagem: "O Natal não é um dia ou uma época, mas um estado da mente. Acalentar a paz e a boa vontade, ser rico em misericórdia, é ter o espírito real do Natal. Se pensássemos nessas coisas, nasceria em nós um Salvador e sobre nós brilharia uma estrela enviando seu raio de esperança ao mundo."
