No Brasil, há um ditado que diz: “farinha pouca, meu pirão primeiro”, significando que devemos dar ao próximo apenas aquilo que nos sobra. Eu vejo esse raciocínio sendo aplicado em muitas situações. Para mim, esse ditado popular resume de forma simples a lógica do egoísmo.
Parece normal, até legítimo, que cada um busque em primeiro lugar a sua própria segurança e bem-estar; que ter as nossas necessidades atendidas é condição prévia para ajudar o próximo; que devemos dar apenas aquilo que nos sobra. Todavia, se esse raciocínio estiver fundamentado no medo de que algo nos venha a faltar, pode ser que não compartilhemos com o próximo nem mesmo aquilo que nos sobra. Não há nada de errado em ser prevenido e em manter uma reserva, mas Jesus nos disse para não acumular “tesouros sobre a terra, onde a traça e a ferrugem corroem e onde ladrões escavam e roubam”, mas para ajuntarmos “tesouros no céu, onde traça nem ferrugem corrói, e onde ladrões não escavam, nem roubam” (ver Mateus 6:19, 20). Onde está esse céu?
Muitas pessoas aceitam a ideia de que o céu seja um lugar bom, a ser alcançado depois da morte e do qual poucos são merecedores. Mas será que o céu é uma localidade? Ou será que ele representa um estado de consciência? No contexto das palavras de Jesus, a terra pode ser considerada como um ponto de vista material, em oposição a um ponto de vista espiritual, representado pelo céu. Em Ciência e Saúde com a Chave das Escrituras, Mary Baker Eddy define céu, como: “Harmonia; o reino do Espírito; o governo do Princípio divino; espiritualidade; felicidade suprema; a atmosfera da Alma” (p. 587).
A partir dessa perspectiva, podemos entender melhor o que significa acumular tesouros no céu, e há uma história no Antigo Testamento que ilustra como é possível colocar essa compreensão em prática no dia a dia (ver 1 Reis 17:7-16). Nessa história, a farinha era pouca, mas a lógica do ditado popular não funcionou. Durante um período de seca, o profeta Elias foi orientado por Deus a procurar uma viúva na cidade de Sarepta. Todavia, ao encontrá-la à porta da cidade e lhe pedir pão, a viúva respondeu que tinha apenas “um punhado de farinha numa panela e um pouco de azeite numa botija”. Com esse escasso mantimento, a viúva prepararia o último alimento para ela e seu filho, eles o comeriam e então morreriam. Mas Elias lhe disse: “Não temas, faze o que disseste, mas primeiro faze dele para mim um bolo pequeno e traze-mo aqui fora; depois farás para ti mesma e para teu filho. Porque assim diz o Senhor, Deus de Israel: A farinha da tua panela não se acabará e o azeite da tua botija não faltará...”
A viúva expressou desprendimento e confiança para oferecer a Elias de seu próprio alimento, quando parecia que ela não tinha o suficiente. Ela agiu “segundo a palavra de Elias; assim comeram ele, ela e a sua casa muitos dias. Da panela a farinha não se acabou, e da botija o azeite não faltou, segundo a palavra do Senhor, por intermédio de Elias.” Ela primeiro alimentou o profeta, ou seja, primeiro ela venceu o medo e confiou, e então comprovou que o suprimento de Deus é ilimitado e está sempre disponível a todos nós. Esse suprimento se revela em nossa experiência da maneira mais apropriada para atender a todas as nossas necessidades, quando, apesar das adversidades, nossa confiança em Deus permanece inabalável.
Em Ciência e Saúde, lemos a seguinte definição: “Elias. Profecia; evidência espiritual que se opõe ao senso material; a Ciência Cristã, pela qual se pode discernir o fato espiritual em lugar de tudo o que os sentidos materiais veem; a base da imortalidade” (p. 585). Quando a viúva obedeceu à ordem de Elias de não temer, ela conseguiu perceber além do que os sentidos materiais estavam percebendo e discernir o fato espiritual que elevou sua compreensão de suprimento de uma base material e limitada para uma base espiritual e ilimitada. Essa compreensão capacitou a viúva a manter o terreno mental fértil, receptivo à Verdade, apesar da seca que castigava a região em que vivia, e, assim, a ajudar o próximo. Essa compreensão também a capacitou a ser receptiva e obediente às palavras de Elias, a expressar um amor isento de ego, a perceber que seu suprimento seria sempre abundante e contínuo e, assim, a compartilhá-lo com o profeta.
Quando confiamos em coisas materiais para nossa segurança, estamos acumulando tesouros sobre a terra, e não conseguimos nos libertar do medo da limitação e da falta. Acumular tesouros no céu equivale a desenvolver o senso espiritual, a ampliar nossa compreensão de que Deus é o Espírito infinito, a fonte inesgotável de todo o bem. Quando desviamos o olhar do senso material e o volvemos para o senso espiritual de suprimento, percebemos a evidência espiritual de que a provisão abundante já está ao nosso alcance, ali mesmo, onde antes víamos limitação e escassez; adquirimos a certeza de que, como filhos de Deus, todos somos continuamente supridos de todo o bem que emana de Deus, a Mente única e infinita. Nosso tesouro celestial se multiplica e se desdobra em qualidades como inteligência, criatividade, percepção, solidariedade, compaixão e amor fraternal, de uma forma que esse tesouro transborda e abençoa a nós e ao próximo.
