Na sala de estar da minúscula casa havia uma fileira de pequenas cadeiras formando um trenzinho. Numa delas estava sentado um ursinho felpudo; um ursinho de chita, noutra; um vidro de geléia na terceira. “Viajamos bem preparados”, disse zombeteiramente a mãe, enquanto o pequenino de três anos de idade pegava seu martelo para “consertar” a cadeira da frente e sua irmãzinha simplesmente andava em círculos, falando sobre telefones e “so’vete”, ignorando o plano segundo o qual ela devia sentar-se e ser passageira do “trem”.
As conversas onde há crianças pequenas são interrompidas, por vezes dominadas, por sons tais como de pequeninos pés e vozes infantis por entre coisas em desordem. Nossa conversa não fugiu à regra.
Girou em torno da decisão de u’a mãe que interrompera sua carreira e renunciara a seu salário, para ficar em casa e tomar conta dos filhos. Eis o que essa jovem mãe comentou sobre sua decisão.
Ora, Quando Alguém decide ter filhos, precisa sacrificar algumas coisas que deseja ter ou fazer. No entanto, nunca consideramos isso perda ou revés em nossa identidade. Talvez seja preciso fazer concessões. Mas sacrificar um ganho a curto prazo em troca de uma meta a longo prazo, resulta em crescimento, nunca significa perda. Se a coisa é realmente considerada em termos de prioridades, é possível remover o entulho mental a fim de dar lugar ao que realmente conta. O amor, a espontaneidade, os valores espirituais abrem caminho para os impulsos criativos.
Por exemplo: Não podemos nos dar ao luxo de comprar brinquedos quando nos dá vontade. Por isso, toda sorte de coisas à nossa volta vira brinquedo, desde caixas de biscoitos, pedaços de cartolina para fazer bonecos, retalhos de tecido e “grandes descobertas” tais como tubos, restos de tapete, etc. Ao deixar de lado todo sentido limitado de recursos, aprendemos a apreciar a diversidade. Assim também aumentam nossas reservas de paciência, honestidade e energia.
Realmente, durante bastante tempo eu precisava ter mais vigor, em particular para agüentar as tardes em casa. Uma noite, ao ler a definição de criador em Ciência e Saúde, vi algo novo, algo deslumbrante. A Sra. Eddy explica que criador é: “O Espírito; a Mente; a inteligência; o divino Princípio vivificador de tudo o que é real e bom; a Vida, a Verdade e o Amor auto-existentes; ... Deus, que fez tudo o que foi feito e que não poderia criar um átomo ou um elemento que fosse o oposto dEle mesmo.” Percebi que o que eu preferia não era mais vigor, mas sim compreender melhor o Princípio vivificador. Um dicionário diz que vivificar significa “dar vida, inspirar, colocar em ação”. O Princípio divino, a única fonte real, dá e sustenta toda vida. Ao entender isso, coloca-se todo o conceito numa base mais segura — numa base espiritual — e assim comecei a verificar que tinha ao meu dispor fontes mais sólidas a que recorrer.
No que respeita ao conceito de carreira e à educação das crianças, acho que cada família tem de procurar perceber qual a orientação de Deus e qual o caminho que os membros da família devem individualmente seguir. Para mim a resposta não veio num momento de lucidez fulminante. Foram precisos meses de oração e foi necessário passar pela peneira muitos sentimentos confusos, até que por fim despontou uma clara orientação a seguir.
Antes do nascimento de nosso filho, em junho, eu havia assinado um contrato para lecionar após as férias de verão. A maioria de minhas amigas trabalhava em tempo integral. Eu vinha trabalhando desde há anos e estava diante do duro fato de que financeiramente necessitávamos de meu salário.
No entanto, após o nascimento de nosso filho, eu me senti confusa, quase traída por meus sentimentos. Queria ficar em casa com o bebê e, no entanto, isso não coadunava com o estilo de vida que pensávamos viria a evoluir após o nascimento da criança. Tomar uma decisão em meio a esses sentimentos em conflito não dava certo, eu o sabia, e dei-me conta de que precisava ser honesta, a fim de ouvir as intuições mais profundas do divino Amor.
Em Ciência e Saúde a Sra. Eddy diz: “A honestidade é poder espiritual.” Percebi que essa honestidade ia mais fundo do que simplesmente concordar com as razões ou emoções do momento. Decidi obedecer a meus próprios desejos e orações mais profundas. Embora contrariasse planos anteriores, eu realmente queria ficar em casa com nosso recémnascido. Meu marido concordou e tive a certeza de que teríamos toda coragem, vigor e suprimento necessários.
Contudo, eu havia dado minha palavra e assinado o contrato para lecionar. Por fim, telefonei à diretora da escola. Ela recebeu gentilmente a notícia, dizendo que não se sentia nem um pouco surpresa. Ela já havia pensado que talvez eu mudasse de idéia após o nascimento da criança. Rimos muito da minha determinação anterior em fazer o que todas as demais mulheres estavam fazendo.
E os recursos financeiros? Parecia óbvio que precisávamos de dois salários. Mas eu não conseguia pensar noutra coisa, senão no fato de que estava ajudando financeiramente a família ao tomar conta da casa. Essa profunda confiança no amor divino não nos deixaria mal.
E assim foi, num processo diário. A certa altura, nosso filho precisava de roupa nova para o inverno. Uma tarde abri a porta da casa para pegar a correspondência e, ali pendurado na porta da entrada estava um conjunto de casaco e calças. Mais tarde fiquei sabendo que a pessoa que os deixara ali morava a algumas quadras de distância. Eu nem sequer a conhecia.
Foi assim que tive inúmeras belas provas de que as necessidades são atendidas por completo e não apenas em parte. Muitas vezes eu pensava, nesse sentido, nas mensagens que os Salmos dão, como por exemplo: “Como é preciosa, ó Deus, a tua benignidade! por isso os filhos dos homens se acolhem à sombra das tuas asas. Fartam-se da abundância da tua casa.”
Cristo Jesus ensinou de maneira clara aos seus seguidores as exigências e bênçãos resultantes de depender sem restrições de Deus. Em minha própria vida, passei a ver aos poucos que eu podia confiar em Deus para o atendimento de todas as necessidades de nossa família, inclusive confiar o desenvolvimento de minha carreira profissional à Verdade, em vez de a qualquer tipo de prazo. Consegui obter rendimento trabalhando em casa como artista autônoma, desenvolvendo um programa para crianças à tarde e, ainda, fazendo trabalhos no computador.
Outra das citações da Sra. Eddy em Ciência e Saúde, que também se ajusta muito a essas minhas prioridades, é: “Acaso a propagação da espécie humana não é uma responsabilidade maior, um encargo mais solene, do que o cultivo de teu jardim ou a criação de gado para aumentar teus rebanhos e manadas? Nada indigno de ser perpetuado deve ser transmitido às crianças.”
Estando em casa, como eu estou, realmente aprendi o significado específico da palavra vizinho. Vejo que minha prática da Ciência Cristã tem de incluir minha vizinhança. A Mente, Deus, de fato provê cada uma das pessoas da vizinhança, porque, de um ponto de vista espiritual, a verdade é que todos temos um só Pai-Mãe Deus.
Recordo que certa vez o filho de um casal vizinho baixou ao hospital, devido a uma doença contagiosa. Todos na vizinhança pareciam ter entrado em pânico. As conversas no bairro não eram muito agradáveis. Havia troca de rumores cheios de temor sobre o diagnóstico, as origens e o que deveríamos esperar para nossos próprios filhos. Senti muito medo.
Nessa noite telefonei a uma praticista e lhe pedi que orasse comigo. Eu desejava profundamente não estar com medo, quer por mim mesma, quer por nossa família e pela vizinhança. Não me recordo especificamente do que falamos, mas senti a profundidade do Amor — a presença e o poder curativo de Deus. O medo se desfez. Não foi diminuindo aos poucos até desaparecer, simplesmente evaporou-se.
No dia seguinte, uma vizinha começou uma conversa semelhante, permeada de medo, e uma amiga se voltou para mim e perguntou: “Que devemos fazer?” Surpreendi-me ao ouvir minha própria resposta: “Bem, não vamos ficar com medo.” O resultado foi que a conversa parou por aí naquele dia e ao que eu saiba, nunca mais houve mexerico entre as vizinhas acerca desse problema. Mesmo após a criança em questão ter voltado para casa, nada mais ouvi relacionado com teorias amedrontadoras ou conversas nervosas que, por si mesmas são contagiosas.
É preciso disposição para orar de modo que nada possa ser aceito além do bem e estar disposto a corrigir os filhos, se necessário. Por exemplo, se uma criança bate em outra, deve ser corrigida na hora. Ela tem de aprender. Um firme e gentil “Você não pode fazer isso” é melhor do que uma reprimenda cheia de ira. E, ainda mais importante, é apoiar a correção, reconhecendo que o amor e a inocência são naturais ao filho de Deus.
Ou, suponhamos, uma criança precisa de um pouco mais de coragem do que está expressando. Então o ponto de partida talvez seja orar no sentido de que, como reflexo de Deus, a criança em realidade já tem tudo aquilo de que necessita. Reflete Deus, a Verdade divina, e isso é o que governa sua atividade e atende a toda necessidade. Não se trata de quantas atividades educativas proporcionamos. É “o divino Princípio vivificador” que transmite as verdadeiras qualidades.
Isto significa, para mim, que os filhos de Deus (e isso inclui a mim e a meu marido também, é claro) não têm quantidades limitadas de amor, alegria ou coragem. Por natureza, somos amáveis. Somos a prova de tudo o que Deus, a Verdade, cria. Não é que aqui em casa esteja havendo um pouquinho de verdade e outro tipo de verdade esteja atuando em algum lugar, lá na casa da vizinha. A Verdade é onipresente. O filho de Deus é completo.
Ficar em casa requer oração e não somente para mim mesma e nossa família, mas por toda a família do homem. Estar em casa nos dá oportunidades para orar e estudar. Isso vale muito para mim. Procuro aprender mais sobre o homem como o reflexo espiritual de Deus. Não existe intermediário entre Deus e o homem. Isto é, não me compete interferir no relacionamento de Deus e Seus filhos. De um ponto de vista humano, compete-me guiá-los e prestar-lhes todo o cuidado. Mas não tenho de tentar moldá-los. O reflexo é direto, não passa por mim para chegar às crianças. O relacionamento primordial deles é diretamente com Deus.
Ainda outra coisa que penso com relação às crianças é que Deus, como Amor divino, me proveu do tipo certo de satisfação. Isso inclui necessidades humanas — as minhas e as das crianças. No Amor, que é infinito, existe apenas a unicidade da Mente, que diz: “Eu sou Tudo-em-tudo.” Portanto, gosto de pensar em todos nós como Seus progênitos, como filhos da luz, incluindo tudo aquilo de que necessitamos. Isso permeia nossas manhãs e nossas tardes.
Isso soa idealístico demais? Quando alguém destila quatro anos de “coisas que aprendi e sobre as quais orei” no contexto de uma conversa, parece simples. Mas nada disso é simples, quer a vivência, quer o aprendizado, no que se refere a crianças. O que vi é que a honestidade e a confiança em Deus trazem satisfação e são práticas.
Confia no Senhor de todo o teu coração, e
não te estribes no teu próprio entendimento.
Reconhece-o em todos os teus caminhos,
e ele endireitará as tuas veredas.
Provérbios 3:5, 6
