Como é que os praticistas que têm família conciliam as exigências da vida familiar com uma vocação que pode exigir muitas horas de trabalho e horários irregulares, incluindo com freqüência fins de semana e serões? A julgar por diversas entrevistas recentes com praticistas, a resposta mais simples é: “Por meio da oração”.
Muitíssimas vezes a prática é algo que envolve a família. O apoio e a capacidade de adaptação do cônjuge ou dos filhos é de grande valor. A esposa de um praticista muito ocupado, por exemplo, lembrou-se de um piquenique da família que serviria de despedida de um filho que ia passar um ano no exterior. O marido estava aguardando um telefonema de um paciente. Como a chamada demorasse, os planos de fazer o piquenique na praia foram cancelados. O marido retirouse para seu escritório a fim de trabalhar, enquanto o restante da família fez o piquenique na sala de jantar. A esposa recorda que todos ficaram muito aborrecidos, até se lembrarem de que felicidade de toda a família advinha do apoio recíproco no trabalho abnegado e na obediência à orientação de Deus. À tarde, acabou surgindo a oportunidade para um passeio não planejado, mas que foi particularmente memorável.
A família é muito importante para mim. Quando estava pensando se deveria aceitar chamados pedindo tratamento pela Ciência Cristã, perguntava-me se isso seria compatível com meus compromissos familiares. Questionava-me se a prática iria separarme da família.
Certa vez, quando estava esperando meu segundo filho, o telefone tocou no momento em que eu entrava em casa com meu filhinho pequeno e os braços carregados de compras. Corri para atender e era uma aluna da Escola Dominical, dizendo que havia caído da bicicleta e havia se machucado. Pedia-me que orasse por ela. Eu estava esperando visitas, tinha de preparar o jantar e pensei: “Meu Deus do céu, onde vou conseguir tempo para isso?” Veio-me o pensamento: “Você tem tempo agora mesmo”. Então respondi que oraria por ela. Eu tinha cinco minutos antes de começar a fazer o jantar e simplesmente me sentei e pus-me a orar. Quando chegou a hora de preparar a comida, levantei-me e o telefone tocou. Era ela e estava curada.
Meu filho estava comigo, tudo estava prosseguindo normalmente e isso provou-me que é possível orar em qualquer lugar e que Deus provê o tempo necessário. Às vezes precisamos muito mais do que cinco minutos, mas compreendi que realmente não era uma questão de tempo. Era uma questão de amor. Compreendi que se eu tivesse o amor, teria também o tempo e não existiria conflito entre a prática e outras necessidades. Comecei a perceber que minha prática seria uma bênção para meus filhos.
Trabalhei com a idéia de ritmo, a idéia de que Deus estabeleceu um ritmo perfeito para os acontecimentos de nossa vida e que os pedidos de ajuda a Ele nunca poderiam interferir um com o outro ou com alguma outra atividade correta. Em ocasiões em que as coisas pareciam não estar funcionando num ritmo suave, orava bastante, com base na seguinte declaração de Mary Baker Eddy em Ciênia e Saúde: “É nossa ignorância acerca de Deus, o Princípio divino, que produz aparente desarmonia, e compreendê-Lo corretamente restabelece a harmonia”. Ciência e Saúde, p. 390. Comecei a encarar toda aparente desarmonia como falta de compreensão de Deus ou negação de algum aspecto de Deus.
Tendo começado na prática enquanto as crianças eram pequenas, aprendi que a prática não é uma atividade separada da vida. Fundamentalmente, ela consiste em viver uma vida de amor. Minha vida não estava dividida. Não era mãe em certas horas e praticista em outras. Estava sempre trabalhando como praticista proque a função do praticista é a de amar. Amar a Deus com tamanha clareza, que reconhecemos a criação de Deus, inclusive o homem, conforme Ele a fez. Para mim, essa é a essência da cura.
A princípio, aceitava chamados geralmente quando as crianças dormiam, durante a tarde. Minha prática foi crescendo. Então, quando ambos os filhos entraram na escola, passei a trabalhar em horário regular. Pedi meu registro no Journal e aluguei um escritório fora de casa. Com o passar dos anos, percebi que minha família foi uma bênção para minha prática e minha prática foi uma bênção para minha família.
Eu estava na prática pública em horário parcial e achei que era tempo de devotar-me a ela em tempo integral. Minha esposa, nossos quatro filhos e eu tiramos duas semanas de férias. Nesse período, conversamos sobre toda a situação, analisando os problemas que poderiam surgir, se eu deixasse o emprego. Todos concordamos que era isso o que eu devia fazer.
Decidimos comprar uma propriedade agrícola e nos mudamos para lá. Achávamos que podíamos arrendar a terra para pagar os impostos e, se necessário, poderíamos plantar alimentos para nosso próprio consumo.
Houve muitas oportunidades de demonstrar que o Deus que me levara à prática pública sanadora da Ciência Cristã era o mesmo Deus que cuidava de todas as necessidades da família. Por exemplo, quando chegou a época de nosso filho mais velho ir para a faculdade, ele planejava estudar em uma universidade de New Jersey, onde eu também estudara. Antes de entrar na prática pública, na vigésima quinta reunião de minha turma de faculdode, eu prometera fazer uma doação à minha universidade e havia me comprometido a dar uma certa quantia. Chegara a hora de cumprir a promessa, mas não sabíamos como fazê-lo. Meu filho tinha a esperança de entrar nessa universidade e, de certa maneira, parecia que se eu fizesse a doação, estaria privando-o dos fundos necessários para pagar a anuidade. Mas senti que seria correto enviar o dinheiro prometido. Eu sabia que se eu fizesse o que era certo, minha família e eu não ficaríamos privados de nenhum bem. Fui em frente, converti em dinheiro uma apólice de seguro de vida que possuía e usei o valor para fazer a doação. Dentro de seis meses, meu filho conseguiu uma bolsa de estudos que cobria suas despesas.
Todos os quatro filhos cursaram a universidade de sua escolha. Deus realmente nos sustém. E os meninos aprenderam isso. Aprenderam que poderiam ir em frente e, embora pudesse parecer que não havia fundos suficientes para quatro anos de estudo, poderiam começar, pois o caminho se abriria.
Há épocas em que você se sente como se estivesse privando sua família de algo, pelo fato de estar na prática. Realmente é preciso trabalhar com afinco para ter certeza de que isso não é assim, para perceber claramente que eles não podem ser privados de nada, porque o que é bom para uma pessoa não pode redundar em escassez para outra. O bem que você está fazendo não pode retardar o suprimento das necessidades deles. Essa é a lei de Deus, a lei do Amor divino. Minha família não foi prejudicada de forma alguma por eu ter entrado na prática. Nunca nos faltou nada. Não que tivéssemos muitos bens, mas sentíamos a abundância da bondade de Deus. Estávamos aprendendo a apoiar toda a nossa fé no fato de que nossas necessidades seriam satisfeitas porque já estavam supridas espiritualmente. É uma alegria demonstrar isso no plano humano, sermos gratos e continuar em nosso caminho.
Conversamos com um dos quatro filhos mencionados acima. Atualmente está casado e tem dois filhos pequenos. Encarou a época descrita por seu pai de um ângulo um pouco diferente, através dos olhos de um jovem adolescente.
Eu tinha quinze anos, era o segundo dos quatro filhos, quando meu pai tomou a decisão de entrar na prática em tempo integral. Digo que ele tomou a decisão, mas de fato foi uma decisão tomada em família. Obviamente, meus pais explicaram que haveria mudanças em nosso estilo de vida, pelo menos no começo: meu pai deixaria o cargo de vice-presidente de uma companhia e passaria a ser praticista. Por isso conversamos sobre o significado dessa mudança.
Humanamente, significava ir comer fora menos vezes e comprar menos coisas. Meus irmãos e eu sempre quiséramos ter uma casa de campo. Meus pais compraram aquela propriedade agrícola que nos deu a oportunidade de plantar legumes, enlatá-los e assim por diante, para ajudar.
Aos dezesseis anos, comecei a trabalhar, a fim de juntar dinheiro para poder cursar a universidade. Juntei mil dólares. Isso era o bastante para pagar a passagem de avião e o primeiro semestre. Pensei: “Bem, vou lá e ao menos farei um semestre e depois verei o que fazer”. Consegui ganhar o bastante trabalhando algumas horas por dia e durante o verão. Também obtive financiamentos suficientes para completar o curso e suprir todas as minhas necessidades.
Creio que não havia medo à escassez. Tinha visto meus pais resolverem problemas metafisicamente e não tínhamos medo de “não ter dinheiro suficiente”, porque eu havia visto como se dá um passo de cada vez e se espera em Deus. Simplesmente não encarava a questão tanto em termos de dólares e centavos. Fomos ajudados de muitas maneiras ou surgiram oportunidades para fazer as coisas e nem sempre era preciso ter dinheiro na mão para nós quatro termos uma série de oportunidades. Quando penso naquela época, fico maravilhado com tudo o que fiz: “Puxa, eu realmente não tinha dinheiro, como é que fiz tudo aquilo?” Obviamente não tinha sido eu. Era a Mente que supria tudo.
Não, realmente não nos faltou nada. Tivemos muitas experiências bonitas. No Natal, por exemplo: não havia tantos presentes como antes, mas havia um sentido mais profundo de alegria, de dar, um sentido mais amplo do significado do Natal, uma apreciação do advento do Cristo. Lembro-me de outros Natais, mas os Natais que se seguiram à entrada de meu pai na prática pública são os que recordo com carinho. Uniram-nos mais como família, porque todos nós estávamos tentando ajudar, todos nós precisávamos confiar totalmente em Deus. Lembro-me de que o Natal passou a ter mais conteúdo do que antes e isso nada tinha a ver com os presentes. Não sei bem como explicar isso. Foi quase um alívio, não havia mais todas aquelas coisas para atrapalhar. Isso não quer dizer que não houvesse presentes. Havia presentes bonitos. Simplesmente tínhamos de ser mais criativos.
Não sei como descrever o que aprendi durante aqueles anos. Creio que é a convicção de que Deus cuida de nós, ver isso de perto, ser testemunha disso. Atualmente, quando surge algum desafio, um problema físico ou uma questão financeira, tenho no que me agarrar, tenho a experiência.
Nunca tive uma sensação de falta. De fato, à medida que o tempo passa, sinto que aqueles anos foram muito especiais. Constituem um fundamento ao qual recorro muitas vezes. Justamente o oposto de carência. Se não tivesse passado por aquelas experiências, acho que teria perdido algo que serve de base para a vida, algo que tento passar para meus filhos.
Algumas das primeiras lições que aprendi na prática: o efeito sanador de pôr o pecado a descoberto, o papel do arrependimento, a maneira pela qual mesmo as situações mais difíceis são sanadas e transformadas em alegria. Todas essas lições ajudaram a construir uma base muito sólida para enfrentar os desafios em minha própria vida. Esses desafios incluem um divórcio, o que naturalmente não é fácil para ninguém. Fui obrigada a me apoiar ainda mais em Deus.
Durante os primeiros nove anos de prática não tive filhos. Casei-me de novo e nos últimos dez anos os tive. Pensava que havia aprendido muito nos primeiros nove anos, mas aquilo não era nada perante o que aprendi nos últimos dez! Atribuo isso às exigências que me são feitas pelos filhos, não tanto no plano humano ou físico, mas no sentido de precisar mudar por dentro.
Creio que as maiores transformações por que passei na vida ocorreram desde que as crianças nasceram. Fizeram-me reestruturar meu conceito de paciência, de amor verdadeiro, de dedicação, de humildade, daquilo a que um antigo hino se refere como um “manso coração”.Hinário da Ciência Cristã, hino n° 69. Vejo que em todos esses aspectos, tive de aprender e crescer muito mais do que jamais pensara necessário.
Houve muitos desafios interessantes, em relação às crianças. Mas cada um levou-me a um auto-exame, obrigou-me a esclarecer minha relação com Deus, a relação do homem com Deus. Isso se relaciona com minha visão da prática como sendo de redenção, de regeneração do pensamento, como uma contribuição para a salvação tanto universal como individual. A cura é o que mais proporciona regozijo.
Criar filhos requer um trabalho abnegado e sem fim. Uma das idéias fundamentais em meu conceito de prática, que se formou com o passar dos anos, é a idéia de servir, de servir à humanidade. Sempre tive um desejo profundo, muito profundo, de ajudar outras pessoas, de servir, de beneficiar outros e minha família. Tanto a boa prática como a boa criação dos filhos estão baseadas na função de servir, servir a Deus e à humanidade.
