Paulo Duarte é um atleta que optou por moldar sua vida aplicando os ensinamentos da arte marcial conhecida como Judô. Esse estilo de luta, idealizado em 1882 por um jovem japonês, Jigoro Kano, se expandiu pelo mundo todo e conta, na atualidade, com milhares de praticantes.
Devido à filosofia de integrar corpo e mente, o judô teve participação decisiva na vida de Paulo. A história de sua vida conta com muitas lutas fora do tatame, que resultaram em crescimento espiritual, visível por um desejo nobre de contribuir para o bem-estar físico e mental da comunidade em que vive, por meio de ações humanitárias. Essa dedicação pode ser conferida pelo seu projeto “Cidadania através do Judô”, uma atividade que desenvolve com crianças e jovens carentes de 13 a 17 anos, em parceria com a Prefeitura Municipal de Cubatão, SP.
Paulo Duarte, também autor do livro “A Saga de um atleta da vida” (Scor Editora Tecci, 2005), contou para O Arauto como contribui para a formação de cidadãos aplicando os conceitos que desenvolveu na prática do judô e com o estudo da Christian Science.
Maranatha Milani: Paulo, em seu livro você conta que a decisão de aprender judô foi uma imposição de seu pai quando você tinha apenas 12 anos. Se você relutou com a idéia naquela época, por que acredita que o judô pode ser útil na educação dos jovens de Cubatão?
Paulo Duarte: Relutei porque não sabia o que era. Meu pai conhecia os princípios filosóficos e doutrinários utilizados pelo judô. Passados alguns anos, ele me confidenciou que, na época, eu não estava preparado para compreender a importância desses valores, mas teve a esperança de que eu os sentisse em minha vida. Não só os compreendi como lhe agradeci! Foi por isso que comecei o trabalho em Cubatão, com adolescentes, e agora estou incluindo crianças. Eles absorvem valores que serão expressos em suas condutas.
MM: Não o preocupa o fato de que, com a crescente violência, o judô prepare jovens para agredir com golpes técnicos?
PD: As lutas fazem parte da história da humanidade. No caso do judô, o Prof. Jigoro Kano dissipou o barbarismo e desenvolveu um sistema em que, utilizando-se das formas de lutas existentes, eliminou todos os golpes que poderiam ser lesivos à saúde, dando uma nova roupagem às lutas corporais, sem violência. Esse método foi tão bem aceito que o governo japonês o introduziu nas escolas primárias como contribuição para uma conduta mais ética.
Quando nos afastamos da falsa e temporária sensação de poder e conquista, aproximamos da verdadeira compreensão da existência de um só Poder.
MM: Se o judô é uma filosofia de vida, conte-nos quais os princípios que desenvolve com as crianças e jovens em seu projeto de cidadania.
PD: O criador do judô, estudante de ciências estéticas e morais, tinha em mente um único objetivo: o aprimoramento do ser humano. “Bem-estar comum para todos” e “Maior eficácia com o mínimo de esforço” refletem bem seu ideal de harmonia. Sua visão, bem avançada para a época, já mostrava como uma teia de relações interdependentes, a natureza e o homem. Quando essa consciência se apodera do homem, ele passa a contemplar o universo como criação espiritual de Deus e a se sentir integrado a ela.
MM: Segundo o mestre Jigoro Kano, cada vitória “representa um fortalecimento espiritual”. Como você conduz o pensamento desses jovens para que desenvolvam a espiritualidade?
PD: Procuro lhes mostrar que, quando nos afastamos do envaidecedor sentido humano de vitória assim como da falsa e temporária sensação de poder e conquista, nos aproximamos da verdadeira compreensão da existência de um só Poder. Essa prática mental leva ao crescimento espiritual.
MM: Mesmo sendo o judô uma arte marcial, você tem a oportunidade de inserir os ensinamentos de Jesus: amar a Deus e amar o próximo?
PD: Primeiro, há que se fazer uma correção: o Judô não é uma arte marcial. Ele veio, exatamente, para se contrapor à guerra. Ao corrigir essa imagem equivocada sobre o judô, descortinamos o horizonte compatível com os ensinamentos de Jesus. Seu próprio nome (Ju = suave; do = caminho) indica que o “caminho é suave” para os que se alinham com os valores espirituais. A suavidade é um atributo divino que se expressa pela correta compreensão de Deus. Quem compreende a natureza de Deus, ama o próximo.
MM: “O homem feito à semelhança de Deus possui e reflete o domínio de Deus sobre toda a terra” (Ciência e Saúde, p. 516). Como somos essa semelhança, temos todos o mesmo poder. Como você lida com o fato de que em uma luta sempre há um vencedor e um perdedor?
PD: Jesus via o homem imortal onde um mortal vê outro mortal, ou seja, não via o outro como adversário nem percebia as adversidades. Não se deixava guiar pelas aparências. É isso que procuro mostrar aos meus alunos. Um resultado adverso não significa necessariamente uma coisa negativa. Podemos sempre extrair algo positivo, mesmo de uma derrota. Se analisarmos por esse prisma, nunca seremos perdedores.
Um resultado adverso não significa necessariamente uma coisa negativa. Se analisarmos por esse prisma, nunca seremos perdedores.
MM: Que tipo de problemas seus alunos apresentam e qual a sua proposta de ajuda?
PD: O difícil acesso à escolaridade formal os desencanta, pois o quadro é sombrio, sem perspectivas. A qualificação profissional se faz necessária para qualquer segmento e a competição no mercado de trabalho é muito grande. Procuro mostrarlhes que isso são só aparências. A Bíblia ensina que Deus tem “pensamentos de paz e não de mal” (Jeremias 29) para cada um de seus filhos. Na Christian Science aprendi que esses pensamentos divinos são “perfeitos e eternos, são substância e Vida” (Ciência e Saúde, p. 286). Assim, inverte-se o desânimo e se fortalece a esperança.
MM: Há algum exemplo de reintegração na sociedade que gostaria de nos contar?
PD: Para as camadas mais carentes da população, os cursos técnicos são mais viáveis. Incentivei-os para que aderissem a essa idéia e, hoje, três de meus alunos estão fazendo o Curso Técnico de Meio Ambiente. Atribuo esse resultado ao processo de espiritualização do pensamento.
MM: Como você ora e aplica os ensinamentos da Christian Science nesse trabalho com crianças e jovens?
PD: Procuro me colocar em estado de receptividade, sabendo que Deus disponibiliza tudo que é necessário para que Seus ensinamentos sejam expressos. Oro para alinhar meus pensamentos aos Seus pensamentos e, assim, cumprir a minha missão, ajudando o próximo.
MM: Para terminar, qual a mensagem que você deixa para nossos leitores?
PD: A convivência com as crianças reforça minha convicção de que a pureza é uma qualidade que nos aproxima de Deus. Minha mensagem é para que todos preservem essa pureza inata e se sintam filhos de Deus. Tomando posse da harmonia e do bem-estar que temos por herança, passamos a vivenciar o bem, a ter saúde, alegria, oportunidades de convívio e de desenvolvimento de aptidões físicas e espirituais.
