O ser verdadeiro é a expressão espiritual e eternamente perfeita de Deus, a Vida divina. Seu desenvolvimento é o desdobrar das idéias da Mente infinita, Deus. Sua história é o registro do grandioso progresso no surgimento da manifestação e do propósito do Amor divino na consciência imortal.
A história humana, por outro lado, é um registro de acontecimentos de um sonho. É o relato de acontecimentos como se manifestam à assim chamada mente dos mortais, errônea, a qual está consciente apenas dos fenômenos construídos por ela mesma. Essa história não é uma apresentação da verdadeira existência do homem como descendente de Deus. Alguns incidentes desse relato, porém, podem indicar vislumbres da inteligência espiritual pela qual a compreensão crística da verdadeira natureza espiritual do ser verdadeiro — criado e governado por Deus, o Princípio divino — desponta na consciência humana e, em certo grau, a transforma.
Esses vislumbres da Verdade na história de um indivíduo ou de uma nação são sempre preciosos — são recordações que devem ser acalentadas. Na Bíblia encontramos exemplos em que idéias espirituais vieram iluminar e salvar pessoas do perigo, trazer-lhes liberdade, guiá-las a melhores condições sociais e a uma existência mais semelhante à divina. Esses vislumbres da realidade não vieram somente àqueles que eram sempre bons e fortes, atentos às mensagens de Deus, mas também para gente que cometeu erros, que nem sempre foi firme na fé, e que às vezes desobedeceu às leis de Deus. Essas pessoas, no entanto, estavam suficientemente despertas para a verdade espiritual para receberem a bênção das mensagens divinas, até mesmo em momentos de temor e depressão, como na ocasião em que Elias dormiu sob um zimbro Ver 1 Reis 19:4; — ou de dúvida, quando Tomé foi tranqüilizado por Cristo Jesus depois da ressurreição Ver João 20:24–28;. Esses momentos de fraqueza humana transformaram-se não somente em oportunidades para inspiração naquela ocasião, mas também em recordações a serem registradas para iluminação das gerações vindouras. Suas lições não deviam ser esquecidas.
Quando hoje passamos por experiências semelhantes, temos o direito de atribuir-lhes grande valor, na proporção em que são marcos indicadores dos estágios de nosso despertar do sonho de haver vida na matéria, para a compreensão da glória da eterna Vida divina. Se assim procedermos, essas experiências também poderão servir de postes indicadores para outros, em sua jornada para fora da crença mortal falsa e ignorante e rumo à compreensão e demonstração da realidade espiritual. Por mais modestas que essas experiências possam ser, são sempre dignas de serem mantidas com gratidão no pensamento, como lembretes do desenvolvimento da idéia espiritual na consciência humana, e o conseqüente abandono de falsas crenças, em favor daquilo que é eternamente verdadeiro a respeito da Vida na Mente divina.
Foi com esse espírito de gratidão pelo primeiro e tênue surgimento da idéia-Cristo em sua consciência, que a Sra. Eddy evidentemente pensou nas anotações que fez depois de seu primeiro vislumbre da Ciência Cristã em 1866, e antes de publicar a primeira edição do seu livro Ciência e Saúde. No Prefácio das edições posteriores, escreveu impessoalmente a respeito das anotações preliminares dela (a autora): “Esses esforços mostram como, até aquela época, estava ela numa relativa ignorância acerca do estupendo problema da Vida, e as etapas pelas quais chegou, finalmente, à sua solução; ela, porém, preza esses apontamentos, tal como os pais têm estima pelas recordações do desenvolvimento de um filho, e não gostaria que fossem modificados.” Ciência e Saúde com a Chave das Escrituras, pp. ix–x;
Em semelhante espírito de gratidão por fatos passados e pelos quais foram aprendidas lições que promoveram seu progresso rumo à compreensão espiritual, a Sra. Eddy relata alguns incidentes infelizes ocorridos nos primeiros anos de sua vida. Em seu livro Retrospecção e Introspecção ela menciona viuvez, má saúde, um infeliz segundo casamento e a perda do filho; e, ainda que mencione esses acontecimentos como não sendo nada mais que incidentes no sonho de vida na matéria, diz: “As sombras terrenais servem ao propósito do céu de purificar os afetos, repreender a consciência humana, fazê-la voltar-se com satisfação de um sentido material e falso de vida e felicidade, para a alegria espiritual e a apreciação verdadeira do ser.” E continua: “O despertar que nos eleva acima da noção errônea de que haja vida, substância e mente na matéria, é ainda imperfeito; mas bendigo a Deus pelas claras e inesquecíveis lições do Amor, que conduzem a esse resultado.” Retr., p. 21;
Quem não dirá “bendigo a Deus”, em gratidão aos sinais de um despertar ensejado pelas nossas próprias experiências humanas passadas, seja qual for seu contexto? Talvez não estejam elas relacionadas com momentos espetaculares de pensamentos iluminados, tais como os que o apóstolo Paulo viveu no caminho de Damasco quando “subitamente uma luz do céu brilhou ao seu redor” Atos 9:3; e toda a sua natureza foi transformada. Poderão às vezes acompanhar vislumbres imaturos da Verdade e tímidos esforços de pôr em prática a sanadora lei de Deus. Ou poderão ser provas tão pequenas de Seu poder e Sua presença, que não serão particularmente significativas para outros, apesar de o serem muito profundamente para nós. Poderão até estar relacionadas com acontecimentos que aparentemente foram enganos, erros de julgamento, ou outras sombras de fraqueza humana — eventos negativos, tais como um casamento infeliz ou a morte de um parente. Ao lidarmos com tais situações, porém, lições foram muitas vezes aprendidas, afetos purificados, e fomos forçados a nos voltar “de um sentido material e falso de vida e felicidade, para a alegria espiritual e a apreciação verdadeira do ser”. Em tais ocasiões provamos o que diz a Sra. Eddy: “O pesar é salutar. É através de grandes tribulações que entramos no reino dos céus. As aflições são provas da solicitude de Deus.” Ciência e Saúde, p. 66.
Não há dúvida, então, que tais acontecimentos, sonhos, podem ser estimados como ganho ao invés de perda, devido às lições que nos reservaram. Podem ser cultivados na memória como portadores de luz ao invés de cicatrizes que devem ser escondidas, ou vergonhosos sinais de pecado ou imaturidade que devem ser esquecidos. Encarados sob o ponto de vista correto, apontam para as passadas que demos afastandonos da ignorância mortal para a verdadeira compreensão do ser imortal. Com gratidão podemos encarar essas tribulações como monumentos de crescimento em graça em vez de em desgraça. Não deveríamos desejar vê-los modificados ou obliterados.
