Não há nada que se compare a enfrentar uma grande luta, a sós com Deus. Talvez pensemos que seria preferível enfrentar o problema se outra pessoa nos estendesse a mão. Dessa maneira a situação pareceria mais fácil, mais cheia de esperança. Cada um de nós, porém, concluirá alguma vez que a ajuda humana não é suficiente para resolver nosso profundo problema. Aí se nos apresenta a oportunidade de aprender que é unicamente Deus que nos proporciona ajuda.
Nesses momentos em que apelamos ao Amor divino como nunca o fizéramos antes, começamos a entender a luta de Jesus no Getsêmani. Aprendemos a entregar-nos incondicionalmente ao Amor infinito, pois este nos ampara sob quaisquer circunstâncias, assim como amparou a Jesus.
Esses momentos quase nunca são fáceis. Admitir sinceramente que o Amor divino é todo-poderoso e que o ódio nada é; que o Espírito é Tudo, e a matéria não se encontra em nenhum lugar; que nossa identidade é eterna, perfeita e tangível no reino da Alma — essas admissões, quando feitas a sós com Deus, representam um desafio. No entanto, não quereríamos perder a noção de segurança permanente que obtemos graças a essa admissão, e a reconhecermos que só Deus constitui nossa ajuda! Entregar-nos completamente ao Espírito, quando evidentemente não há outra fonte de ajuda (e ainda quando cremos que há), é dar um passo solene e valoroso em nosso progresso espiritual, um momento que não se deve temer, mas, sim, compreender.
Na proporção, portanto, em que compreendemos as implicações dessa entrega, os temores do materialismo, os temores ao pecado, à doença e à morte, cessam de restringir-nos. A sensação de incompetência pessoal se dissolve perante a convicção da completa capacidade do Espírito e do bem espiritual. As discórdias, o sofrimento e a solidão se vêem conquistados.
Nossa Líder, a Sra. Eddy, confiou em Deus durante muitos momentos de solidão, e escreve em Ciência e Saúde: “Ser-te-ia a existência, sem amigos pessoais, um vazio? Virá então a ocasião em que estarás solitário e privado de simpatia; esse aparente vácuo, porém, já está preenchido pelo Amor divino. Quando chegar essa hora de desenvolvimento, ainda que te apegues a um sentido de alegrias pessoais, o Amor espiritual te forçará a aceitar o que melhor promover teu crescimento. Os amigos te trairão e os inimigos te caluniarão, até que a lição seja suficiente para te sublimar; pois ‘a extrema necessidade homem é a oportunidade de Deus’. A autora passou pela experiência dessa profecia e suas bênçãos.” Ciência e Saúde, p. 266.
Os episódios conhecidos da vida da Sra. Eddy revelam que ela de fato viveu períodos de solidão, nos quais não contava com solidariedade, e que foi atraiçoada e caluniada. E com que amor cristão e fé os enfrentou a todos, obtendo assim uma bênção não só para ela mesma, mas uma enorme bênção para o mundo inteiro!
As bênçãos das quais a Sra. Eddy fala, nos advêm quando essa entrega à totalidade de Deus aflora em nosso coração. Na maior parte das vezes ocorrem gradativamente, aos poucos, mas cada vitória nos fortalece. Quando nos esforçamos por demonstrar a verdade do ser, a possibilidade de termos de vencer a sensação de estar totalmente a sós não nos parecerá uma ameaça, se compreendermos o que está acontecendo, por que acontece, e qual o resultado inevitável.
Por certo, é muito reconfortante contar com o apoio de outras pessoas durante momentos de provação. No entanto, se esse apoio não se manifesta, isso não significa que estamos em posição de desvantagem para colher uma demonstração completa. Toda e qualquer forma de amor e de consolo realmente provém de Deus. O Espírito e a bondade do Espírito só podem ser refletidos. Na realidade, estão refletidos, em toda parte. O mundo, de si próprio, não pode oferecer consolo espiritual, nem nos pode privar desse consolo, pois o amor de Deus flui sem cessar de Deus para o homem. Cristo no-lo revela em formas que atendem às nossas necessidades.
Sem dúvida nosso grande Mestre, Cristo Jesus, tinha o anseio de ver os demais participarem de suas experiências e compreenderem aquilo que ele amava. A Bíblia o deixa claro. Em certa ocasião, Jesus chegou a chorar por causa da rejeição indiferente e da falta de compreensão acerca daquilo que ele sabia digno, em plena escala, de ser reconhecido e alcançado. Contudo, ainda que destituída do apoio moral de outros, a convicção de Jesus, de que Deus o amava, a ele e a toda a humanidade, triunfou.
Acaso algum de nós já se sentiu devastado por causa de solidão, de rejeição, de desânimo? Ou alguma vez nos sentimos tremendamente longe do espírito de unidade e harmonia pelo qual tanto ansiamos? Pois bem, temos a vida e as palavras do Mestre, para iluminar-nos o caminho reto e estreito.
O tema do ministério de cura de Cristo Jesus foi o da filiação do homem com Deus, sua união perfeita com o Pai. “Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo” Mateus 3:17., disse a voz do céu, quando Jesus emergiu do batismo no rio Jordão. O Mestre sempre sabia intuitivamente o quanto era amado de Deus, o quanto Deus estava satisfeito com ele. Os Evangelhos indicam que as orações de Jesus eram simples e profundas, plenas do reconhecimento do Pai celeste e do louvor a Ele. Jesus passou ileso por uma multidão enfurecida, enfrentou e curou doenças inveteradas, acalmou a tempestade, e o fez com confiança tão profunda que não se vê outra maneira de configurar essas ações senão nos seus ensinamentos.
Jesus esperava que esses ensinamentos fossem compreendidos, pelo menos até certo ponto. Para ele, as coisas do Espírito não eram mistérios diante dos quais ficar maravilhados, mas verdades a serem compreendidas e comprovadas, de maneira que mesmo nos momentos de maior necessidade, talvez numa hora solitária de decisão, reconhecêssemos em nós a condição de bem-amado, de objeto precioso do amor do Pai.
“Quando levantardes o Filho do homem,” disse Jesus, “então sabereis que eu sou, e que nada faço por mim mesmo; mas falo como o Pai me ensinou. E aquele que me enviou está comigo, não me deixou só, porque eu faço sempre o que lhe agrada.” João 8:28, 29.
“O Pai ... não me deixou só.” Essas palavras, uma vez aceitas, ficarão abrigadas a salvo, em nosso coração, para os momentos em que mais precisarmos delas, momentos em que a inclinação às coisas materiais pretende sugerir que estamos em alguma circunstância onde Deus não está conosco para manter completa e íntegra a nossa indentidade. Mas, nunca estivemos, nem jamais estaremos, destituídos da ajuda sempre presente de Deus, pois essa ajuda é infinita.
Se nos virmos envolvidos em luta árdua, podemos vencê-la sem medo graças a elevarmo-nos à altura do Cristo, a vermos no filho de Deus a nossa única identidade. Podemos considerar-nos, e a outros, não como meros mortais em luta, mas como o reflexo de Deus: amado, inteligente, destemido e incapaz de cometer pecado, incapaz de estar sujeito à doença, ao sofrimento ou à morte.
Sim, podemos ver essa realidade, acompanhada de resultados de cura. Quando nos desfazemos de um conceito de vida baseado na matéria e discernimos nossa identidade à semelhança de Deus, identidade individual, espiritual, então o poder do Cristo nos sustenta e nos cura. O Cristo sempre presente pode anular qualquer conceito errôneo material, e trazer à tona a convicção científica da infinidade do Espírito.
Quando tomamos uma decisão a favor da totalidade do Espírito em alguma luta como a do Getsêmani, a vitória nos está assegurada, mesmo que o pó da batalha ainda obscureça a visão. Quando entregamos nossa consciência incondicionalmente à Vida, à Verdade, ao Amor, ao Espírito, à Alma, à Mente, e vemos em Deus o próprio Princípio de nosso ser, a vitória se estabelece.
Jamais devemos temer desconhecer o caminho. Este foi traçado desde aquele primeiro Getsêmani. A partir daí, esboçou-se um mapa. De modo que para nós, agora, não existe “desconhecido”. Jesus traçou o caminho de maneira completa.
Contudo, mesmo para Jesus, na luta se incluía vencer o desejo ardente de encontrar apoio humano. Depois de se referir à angústia que Jesus sentiu em resultado da “ignorância fanatizada” que o rodeava, e ao fato de que seus próprios discípulos dormiram enquanto ele orava no horto, a Sra. Eddy escreve: “Não podiam eles velar com aquele que, esperando e lutando em muda agonia, velava sobre todo um mundo, sem se queixar? Esse anseio humano não foi correspondido, e assim Jesus volveu-se para sempre da terra para o céu, do sentido para a Alma.” Ciência e Saúde, p. 48.
Se, em algum período difícil de nossa própria existência, não há resposta para o anseio de que alguém nos acompanhe no momento em que oramos com a maior intensidade, não será isso motivo de tragédia. Se, nesse momento, nos afastarmos nitidamente da noção de sermos mortais dependentes de outros mortais para obter apoio; se nos desviarmos das versões limitadas e materialistas daquilo que a vida e o amor permitem, não nos sentiremos separados do amor, nem daqueles a quem amamos, mas compreenderemos que somos geração de Deus e que, portanto, estamos unidos a tudo o que é real e nos proporciona apoio.
Jesus não perdeu as esperanças sobre o mundo ou sobre os seus amigos, embora não o apoiassem quando mais necessitou de apoio. Sabia que sua própria vida pertencia a Deus, seu amor era divino e ilimitado, sua verdade era imutável e eterna, seu espírito era inseparável do Pai. Jesus compreendia que sua relação com Deus permanecia eternamente intata, e que não estava só.
Cristo Jesus sabia que não existe, simplesmente, verdadeira segurança ou esperança numa noção material das coisas. Sabia que não podia depender, em absoluto, desses fatores. Por meio de seu contínuo amor e de suas afirmações da Verdade (conquistadas a duras penas, ao ponto de as Escrituras dizerem que seu suor foi como gotas de sangue), sua vitória ficou assegurada. Ele pôde, sem medo e serenamente, elevar-se e saudar aquele a quem a mente mortal utilizou para atraiçoá-lo — disposto a demonstrar as grandes verdades que havia acabado de compreender profundamente.
A maneira pela qual os eventos da crucificação se apresentaram aos discípulos, ainda materialmente orientados, e a outros observadores, não era a maneira por que Jesus a encarava. A sensação de tragédia e de medo que acometeu os discípulos, apoderou-se do pensamento deles em razão de não haverem ainda passado por sua própria experiência do Getsêmani. Tinham ainda de entender claramente os verdadeiros pontos da questão. Jesus, porém, os conhecia: a realidade do Amor, a irrealidade do ódio; a realidade da Vida, a irrealidade da morte; a realidade da Verdade, a irrealidade do mal — numa palavra, a completa falsidade da mentira de haver vida, verdade e inteligência na matéria.
A crucificação não representava apenas a questão de que algumas pessoas de inclinações más tentavam aniquilar a vida de um homem bom. Não consistia apenas numa acusação injusta contra Jesus de Nazaré. Era um ataque do assim chamado erro contra Deus e Sua imagem. E essa é a intenção de cada aparente ataque do erro.
Ao tratar dos problemas nesse nível elevado e impessoal, também nós podemos ser elevados a demonstrar a indestrutibilidade do homem, tal como o Cristo a apresenta. A luz do Amor divino nos permite agir dessa maneira. Elimina também o medo, o próprio medo de ter de demonstrar, a sós, a verdade.
O Amor divino nos guiará ao atravessarmos qualquer vale que tenhamos de transpor. Não é preciso que nos detenhamos a meio caminho. E o vale é meramente o vale “da sombra” — pois é só isso que o mal pode pretender ser, isto é, sombra. Verdadeiramente, não existe lugar algum solitário e escuro, não existe deserto de solidão onde não estejam conosco a luz e o calor do Amor divino.
Os discípulos de Jesus viram a demonstração feita por ele. Talvez demorassem um pouco em compreender o significado dessa demonstração, em reconhecer suas implicações em prol do mundo. Talvez demorassem em associar o que haviam presenciado, com o que Jesus lhes havia ensinado, e em reconhecer o lugar que eles mesmos ocupavam no cumprimento da profecia. No entanto, gradativamente elevaram, até certo ponto, seu conceito sobre o homem. Quando lemos acerca deles, no livro dos Atos, surgem como homens renovados, tomados de amor, luz e inspiração. Haviam, em grande parte, perdido o medo, e foram adiante para efetuar as obras de cura que anteriormente Jesus os havia mandado realizar.
À medida que nos esforçamos em compreender nosso lugar na profecia contínua, como seguidores fiéis do Mestre, enfrentamos lutas e aprendemos as lições necessárias. Nossa Líder suavemente nos anima: “Lembra-te de que não podes ser levado a situação alguma, por mais grave que seja, onde o Amor não tenha estado antes de ti e onde a sua terna lição não esteja à tua espera.” The First Church of Christ, Scientist, and Miscellany, pp. 149–150.
Portanto, aprender a depender de Deus, o Espírito, a sós, não constitui lição dura, mas terna. Será suficiente para elevar-nos e fazer surgir em nós uma compreensão tão pura e profunda acerca do amor de Deus por nós, que nossa experiência ficará inundada com as expressões prometidas de Seu amor.
Dessa maneira, unimo-nos a tudo aquilo que realmente amamos. E recebemos, a fim de conservá-lo para sempre, tudo aquilo que é realmente belo e vale a pena conservar.
