Há dois anos atrás, depois de ter recebido uma carta minha na qual eu havia manifestado um certo desânimo, um amigo respondeu com uma declaração simples porém maravilhosa. “Precisamos,” escreveu ele, “admitir o que é possível.” Esse meu amigo é Cientista Cristão. Portanto, o que estava dizendo era que precisamos saber o que é possível ao homem conseguir como semelhança exata e ilimitada do Espírito, Deus, e precisamos fazer desse ideal espiritual a base da oração e da expectativa científica.
Certa ocasião, lembraram-me novamente dessa afirmação útil quando eu estava ouvindo e lendo as notícias sobre a seca e a fome na Africa. A tragédia humana parecia quase incompreensível e o problema grande demais para ser resolvido a tempo de salvar centenas de milhares de pessoas que necessitavam de ajuda naquela mesma hora. Desertos áridos, anos sem chuva, governos empenhados em guerra, transporte precário e outros fatores desafiadores apresentam um quadro que sugere serem problemas de porte tão grande, que não se pode evitar a perda de grande número de vidas antes de se encontrar qualquer solução permanente.
Não há dúvida de que um bom número desses problemas envolvem decisões de ordem moral que podem ser resolvidas somente através de profunda regeneração. Mas será que um povo inteiro precisa esperar uma completa regeneração moral para receber alimento? Sabemos que os filhos de Israel passaram por uma fase de crescimento moral depois do Êxodo, e a nação levou quarenta anos — uma geração inteira — para aprender as lições necessárias antes que pudesse entrar na Terra Prometida. O povo, no entanto, foi alimentado durante aqueles quarenta anos, porque Deus, o Princípio divino que impõe exigências estritas, é também o Amor divino, cuja misericórdia os sustenta e consola enquanto as lições estão sendo aprendidas. A natureza individual da salvação exige, é claro, que todos os indivíduos, de si próprios, finalmente aceitem a Verdade, na proporção em que estiverem preparados para recebê-la. Admitir, porém, o que é possível, inclui compreender a natureza imparcial do Amor divino e a transcendente e ininterrupta ação dessa lei. Esse fato indica a possibilidade de que até mesmo um só indivíduo de pendor espiritual é capaz de trazer à luz algumas soluções para ajudar multidões — assim como um só homem, por inventar a lâmpada elétrica, iluminou um mundo ainda ignorante da ciência que esse fato envolvia.
Realmente, é importante, pelo menos por duas razões, admitir nosso potencial individual para abençoar multidões. Precisamos agir vigorosamente contra a sofreguidão com que a humanidade admite ser possível a um só indivíduo causar danos a multidões. Precisamos expor a crença sutil de que algumas pessoas não merecem ser salvas ou de que o julgamento pessoal possa paralisar a ação divina do bem. É bem interessante notar que Mary Baker Eddy, a Descobridora e Fundadora da Ciência Cristã, ao falar da imediação do reino de Deus e dos frutos sempre prontos para a colheita, escreveu, referindo-se a uma das curas efetuadas pelo Mestre: “Jesus não precisava de ciclos de tempo nem ciclos de pensamento a fim de fazer amadurecer a aptidão de chegar à perfeição e suas possibilidades.” Unity of Good, p. 11. Jesus exemplificou a ação da inexorável lei espiritual. Nossa própria capacidade de seguir seu exemplo e de viver a constância da lei espiritual é o que deve preocupar-nos ao admitir aquilo que é possível.
Essa lei espiritual informa-nos que podemos provar humanamente, mediante o poder-Cristo, tudo o que é espiritualmente verdadeiro — embora as provas radicais certamente exijam uma consagração espiritual profunda. Sabemos, por exemplo, que na Ciência Cristã, Deus é a fonte de toda vida verdadeira. Portanto, é possível provar que o corpo humano pode ser sustentado na condição em que se julga necessária (pela mente humana) tanto para a vida e para a saúde como até mesmo em tempos de fome. Isso é possível porque o fato espiritual está em que o alimento não é causativo. Deus, a Mente, é a causa única. Em realidade o homem depende da Mente, não da matéria, para seu sustento, porque ele é espiritual, não material.
E não apenas o corpo, porém a terra, toda a flora, a fauna e as substâncias minerais estão sujeitas a essa causa única. Por exemplo, o livro de Isaías diz do povo de Deus: “O deserto e a terra se alegrarão; o ermo exultará e florescerá como o narciso. Florescerá abundantemente ...; deu-se-lhes a glória do Líbano, o esplendor do Carmelo e de Sarom. ... Águas arrebentarão no deserto e ribeiros no ermo. A areia esbraseada se transformará em lagos, e a terra sedenta em mananciais de águas.” Isaías 35:1, 2, 6, 7.
Será que isso pode acontecer agora, hoje, na África? Se julgamos ser necessária água, será que os desertos da África podem florescer, ou será que a água ou as colheitas simplesmente aparecem? Sobre que base podemos admitir que tal fato seja possível? Somente uma: A irrealidade da matéria e a realidade do Espírito e de suas idéias. Obviamente, admitir e provar que isso é um fato, requer grande espiritualização do pensamento e regeneração substancial da parte daqueles que querem prestar ajuda mediante oração. Mas o esforço que fazemos em dar testemunho da oniação da lei de Deus, talvez produza soluções que bem poderiam levar algumas das pessoas que foram ajudadas, a procurar a fonte da bênção, e assim levá-la a se aproximar um pouco mais da Verdade. Uma vez admitido que a matéria nada é — um engano, uma mentira — um ponto de vista errado sobre idéias — eliminamos qualquer reino em que as leis materiais pretendam governar. O Espírito é causa, e a criação é idéia, não matéria, porque o Espírito nunca entra nas suas formações. Aquilo que vemos como sendo minerais, plantas, animais, seres humanos e outras entidades, não são, em realidade, organismos ou estruturas atômicas, mas conceitos humanos. Estes significam idéias, que emanam inteiramente da Mente que é a Vida. Alimento e água, e tudo quanto implicam, denotam elementos espirituais vivos, não substâncias materiais. Esses elementos já estão incluídos na consciência que cada um de nós tem de seu verdadeiro ser. Existem para ser expressados, não ingeridos, pela criação divina.
Consideremos algumas das afirmações que a Sra. Eddy faz sobre isso, em Ciência e Saúde. Escreve ela: “As assim chamadas substâncias minerais, vegetais e animais dependem hoje tão pouco do tempo ou da estrutura material, como ‘quando as estrelas da alva juntas alegremente cantavam’. A Mente criou ‘a planta do campo que ainda não estava na terra’.” Ciência e Saúde, p. 509. E, noutra página, ela afirma: “As estações virão e passarão com variações de tempos e ciclos, de frio e calor, de latitude e longitude. O agricultor verificará que essas mudanças não lhe podem afetar as colheitas. ... O astrônomo não olhará mais para as estrelas — delas olhará para o universo; e o floricultor obterá a flor antes da semente.” Ibid., p. 125. Ela também pergunta: “Se a semente é necessária para produzir trigo, e o trigo para produzir farinha, ou se um animal pode dar origem a outro, como podemos então explicar sua origem inicial? Como é que foram multiplicados os pães e os peixes nas margens do mar da Galiléia — e também isso sem farinha nem mônada de onde pudessem vir pão e o peixe?” Ibid., pp. 89-90.
Acaso admitimos ser possível, crer que seja possível ao povo africano ser alimentado literalmente por Deus mediante a multiplicação das “idéias pão-peixe”, ou como os filhos de Israel, pelo maná no deserto? Será que admitimos a possibilidade de que a água ou a chuva possam aparecer no deserto sem nenhuma razão humanamente lógica, sem o apoio de um processo ou plano humano? Se é difícil responder que sim, é unicamente porque todos nós estamos apenas começando a compreender que nada existe exceto pela Palavra e vontade de Deus. Todo o bem existe, e continua a existir, devido ao seu relacionamento inseparável com a Vida; e as condições materiais cedem a esse fato, na proporção em que compreendemos nossa relação com a Vida real. Estes são fatos espirituais sobre os quais podemos basear nossa orações e expectativas. É também importante compreender que contribuímos para que essas esperanças se concretizem, quando aproveitamos até mesmo a mais simples oportunidade de provar alguma lei espiritual.
Através de uma experiência simples mas emocionante, tive uma oportunidade como essa. Depois de um inverno rigoroso com temperaturas muitíssimo abaixo de zero, a mais vigorosa de nossas roseiras parecia estar morta. Teria sido fácil substituí-la, mas isso significaria ignorar a exigência de crescer espiritualmente, exigência essa que estava sendo feita à minha compreensão. Eu necessitava aproveitar essa oportunidade para comprovar a verdade de que Deus é a Vida de todas as identidades. Comecei a orar diariamente, mas passaram-se dois meses e a roseira parecia mesmo ter morrido. Todos os outros arbustos estavam agora grandes e em plena florada.
Certo dia, dei-me conta de que meu marido e eu sempre havíamos acreditado que por termos feito todas as coisas humanamente lógicas que se recomendam para cultivar, fertilizar, podar, nutrir e proteger as roseiras, esses atos é que eram responsáveis por sua existência. Comecei a compreender que nenhuma condição ou processo material tinha qualquer coisa a ver com a saúde de uma idéia nem mesmo podia remotamente estar ligada à verdadeira identidade da qual essa roseira dava indícios. A verdadeira identidade está enraizada na Vida divina, é alimentada pela Vida, mantida e protegida pela Vida, e nunca está separada do calor do Amor, nunca está congelada pela ausência do Amor, e para sempre depende de Deus para sua continuidade.
Certo dia, finalmente, percebi que eu ainda estava olhando amedrontada para a poeira — para a terra dentro da qual a roseira estava plantada — procurando aí evidências de vida. Compreendi que a despeito da evidência material, eu tinha de saber que as amadas idéias individuais da Vida expressam vida simplesmente porque a Vida, Deus, está sempre presente. O quadro mortal de esterilidade era uma mentira. E a mentira não poderia ficar melhor. Desapareceria, dando lugar à eterna e imutável presença da frutuosidade, da produtividade, da vida.
Exatamente no fim do mês de maio (primavera no hemisfério norte) surgiu um pequeno broto. A haste delicada dera uma única rosa branca. Em agosto a roseira continuava pequena, mas coberta de flores.
Claro, eu teria perdido a bênção dessa experiência (e menosprezado a maneira pela qual Deus nos instrui), se tivesse acreditado que o objetivo era simplesmente o de salvar uma roseira. Em vez disso, essa cura foi apenas um marco de progresso em minha compreensão e na aplicação de algumas leis espirituais absolutas do Princípio divino, e em vislumbrar algo da irrealidade da morte. Alguém poderá dizer que a roseira não estava completamente morta. Talvez não estivesse. Mas não há dúvida de que, graças às minhas orações durante essa experiência, eu aprendi que é possível admitir que a esterilidade, a seca, a fome, são mentiras; que o Amor divino está agora sustentando todas as suas idéias preciosas. Esta é a realidade, o fato. O Cristo, o elo espiritual mediante o qual a realidade divina chega até a aparente necessidade humana, está agora presente e é poderoso para transformar o fluxo abundante do Amor precisamente naquilo que é necessário, precisamente quando é necessário. O Cristo não chega tarde demais para ajudar, não é demasiado pouco para salvar a todos (o Amor imparcial abrange a todos), não se apresenta numa forma que não possa ser utilizada.
O fato agora é que nenhuma medida de avidez, amargura, contenda, política, ignorância, insensibilidade; nenhuma história de preconceito; nenhuma crença em escassez, curso, tempo ou espaço; nenhuma crença no pecado ou culpa do homem — nada disso — jamais teve ou jamais terá um til de poder para atingir a inocência e a inteireza, o mérito e a dignidade do homem. Ou para impedir o poder do Amor de cuidar do homem. Este é o fato espiritual. Esta é, portanto, a verdade demonstrável sobre as pessoas e para as pessoas que vivem afetadas pela fome, como também para outras. O Cristo está à altura de enfrentar todo requisito humano. O modo de a Mente agir é original e prático. Nosso Pai-Mãe, o Amor, sustenta todas as suas idéias sem esforço, incondicionalmente. Todo indivíduo pode admitir que isso é verdade, pode demonstrá-lo com lealdade no viver diário e ver que é possível para todos admiti-lo e demonstrá-lo. Nas palavras de nosso Mestre, Cristo Jesus: “Para os homens é impossível; contudo, não para Deus, porque para Deus tudo é possível.” Marcos 10:27.
 
    
