Da Minha Cama, podia ver uma gravura representando um corredor solitário, esforçando-se para subir uma ladeira comprida e íngreme, sob a luz dos derradeiros raios de sol. Meu pai dera-me essa gravura quando eu cursava a 8a série. Embaixo estava escrito: "Para ser de fato o primeiro, é preciso constante esforço para ultrapassar a si próprio, não a competição." Eu participava de corridas na escola e gostava daquele pensamento, apesar de não conseguir ver como se relacionava com as corridas, ou com qualquer outra atividade de minha vida, uma vida em que a competição com outros requeria tanta atenção e energia.
Eu aprendera, na Escola Dominical da Ciência Cristã, que nosso valor se encontra em Deus, só em Deus. Provém de uma profunda percepção espiritual de si próprio como sendo filho de Deus, da capacidade de se perceber cada um da maneira como Deus o criou, à Sua imagem e semelhança, espiritual e completo. Essa percepção não resulta de um processo de melhoramento físico ou psicológico, mas de crescimento individual em compreensão da realidade espiritual como fato atual da vida.
Mas opondo-se ao ensinamento que eu recebera na Escola Dominical, estava a sensação muitas vezes intimidante, impetuosa e derrotista de que, para ter valor, eu tinha de ser melhor do que os outros em tudo o que fazia. Em qualquer aspecto da vida (trabalho, esportes, estudos, relacionamentos e assim por diante), há pressão para se melhorar de maneira a alcançar o topo da pirâmide imaginária do sucesso material. Essa perspectiva abre a porta à dúvida e ao desânimo, porque é raro não haver alguém já um passo à frente, saindo-se melhor.
Para resolver esse conflito, volvi-me às Escrituras. Estava determinado a descobrir o que significa "ser o primeiro".
Cristo Jesus utilizou parábolas, tanto para ilustrar idéias, como para elevar o povo de um ponto de vista material para uma perspectiva espiritual. Na parábola dos talentos, Jesus apresenta um ponto surpreendente. Um amo, antes de deixar o país, distribuiu sua riqueza entre seus servos, para que a guardassem. A um servo deu cinco talentos (uma quantia de dinheiro); a outro servo deu dois talentos; ao terceiro, um talento. Quando o senhor voltou, o primeiro servo que aplicara o dinheiro e o fizera render, duplicando seu valor, devolveu a seu amo dez talentos e recebeu uma bênção.
O segundo servo devolveu quatro talentos. Quatro decerto não se compara a dez, mas nem por isso o segundo servo deixou de receber a mesma bênção que o primeiro. O amo não estava comparando as quantidades. Ambos os servos haviam usado o que lhes fora entregue e o aumentaram em benefício de seu senhor e, por sua vez, em seu próprio benefício.
O terceiro servo, contudo, descontente com a situação, nada fez com o único talento. Quando o devolveu a seu amo, foi amaldiçoado. Teria feito diferença, se tivesse recebido cem talentos e devolvido cem talentos? Não seria culpa dele, o ter desperdiçado a oportunidade de fazer algo mais útil e proveitoso?
Embora, na parábola, talento signifique dinheiro, essa palavra adquiriu na linguagem comum o significado de habilidades e dons individuais. Em vista disso, é legítimo nos perguntarmos: "Será que procuro uma compreensão mais profunda de quem sou do ponto de vista espiritual, e então aprimoro minha habilidade de expressar essa espiritualidade, sem comparação humana com outros? Aceito os talentos, habilidades e qualidades concedidos por Deus e utilizo-os, valorizando-os?" Em Ciência e Saúde, a Sra. Eddy, Descobridora e Fundadora da Ciência Cristã, escreve: "... o anseio por sermos melhores e mais santos, expresso na vigilância diária e no esforço de assimilar mais do caráter divino, há de nos moldar e formar de novo, até que despertemos na Sua semelhança."
A Bíblia define Deus como Amor, Espírito, o criador de tudo o que é bom e eterno. Despertar na Sua semelhança requer o reconhecimento de nosso valor como rebentos do Espírito, conhecendo nosso valor como a manifestação espiritual de Deus. Essa espiritualização do pensamento e da ação é completamente diferente da tentativa de nos melhorarmos por meio de auto-afirmação e força de vontade humana. Aquilo que estamos a ultrapassar em nós mesmos é nosso nível anterior de compreensão e demonstração da verdade espiritual. O progresso espiritual revela que nosso verdadeiro valor está baseado em nossa filiação, ou unidade, com Deus.
Mas o que nos leva à comparação constante com outros, em vez de à demonstração de nossa inteireza como criação de Deus?
Uma atitude que se manifesta com frequência resulta deste pensamento: "Já sou bastante bom nisto. Uma vez que sou melhor que muitos, por que esforçar-me mais?" Já imaginou o que seria subir uma escada rolante descendente? Não podemos simplesmente parar de correr e esperar manter nossa posição. Nosso trabalho espiritual para ultrapassar as limitações humanas é contínuo.
Deus não se impressiona com quão bons somos numa escala de avaliação humana. Ele conhece-nos como Suas imagens, ou idéias, espirituais e perfeitas. Por isso, quando se trata de avaliar nosso valor genuíno, por que aceitar um modelo de comparação material, que é o contrário da natureza do Espírito divino? Aprender a nos conhecermos como Deus nos conhece não é tarefa da qual possamos tirar folga.
Outra atitude que pretende nos impedir de utilizar nossas habilidades ao máximo é similar à do terceiro servo. É fácil achar, seja qual for a atividade, que já ficamos tão para trás da maioria, que não vale sequer a pena participar. As comparações do mundo nos fazem ter medo de tentar alguma coisa nova, medo de empregar qualquer talento que esteja brotando novo, ou qualidade não desenvolvida, por receio de não estar à altura dos demais.
Ora, é assim que Deus nos vê? Decerto que não, de acordo com a parábola de Jesus. Somos avaliados pelo emprego que fazemos da inteligência, força, integridade e amor que Deus nos deu, por mais modesta que seja nossa expressão de Suas qualidades num dado momento. Quando a sociedade nos faz pensar que temos de ser a orquestra toda para ter valor, é reconfortante recordar que um concerto não pode ser tocado sem que cada um dos instrumentos esteja afinado. Por isso, se em determinada apresentação não passarmos de um só instrumento, que o sejamos com entusiasmo, apreciando nossa expressão espiritual, tal como nosso Pai a aprecia.
Na carta de Paulo aos Colossenses, ele diz que tem orado a Deus por eles, para que "transbordeis de pleno conhecimento da sua vontade, em toda a sabedoria e entendimento espiritual; a fim de viverdes de modo digno do Senhor, para o seu inteiro agrado." À medida que aumenta nossa compreensão espiritual de quem e do que somos, também nós vivemos de modo digno de nosso Pai-Mãe Deus. As comparações humanas são baseadas em medidas materiais. Mas o Espírito infinito desconhece tal medição ou ordem. Deus conhece nosso valor espiritual. E quando nos conhecemos como Ele nos conhece, compreendemos o que é preciso para ser o primeiro — não tanto para que sejamos melhores do que os outros, mas para que expressemos melhor as qualidades concedidas por Deus.
