“Não adianta voltar para o dia de ontem, porque ontem eu era uma pessoa diferente.”
É o que diz a protagonista na obra Alice no País das Maravilhas e o Outro Lado do Espelho (Lewis Carroll). E nós, depois de tomar uma resolução de Ano Novo, esperamos poder dizer o mesmo!
No entanto, parece que estamos mais propensos a nos identificar com o personagem representado por Bill Murray no filme “Groundhog Day” [O Feitiço do Tempo], que voltava todas as manhãs exatamente ao ponto em que havia estado no dia anterior. As pesquisas revelam que apenas 9,2 por cento das pessoas acharam que tiveram êxito em pôr em prática suas resoluções de 2016.
É evidente que não há nada sobre o Dia de Ano Novo que possa, de alguma maneira mágica, nos tornar mais resolutos. Por outro lado, esse dia tem tanto potencial quanto qualquer outro, para dar início a uma mudança de vida realmente transformadora, porque todos os dias são na verdade propícios para novos começos. Como diz um hino no Hinário da Ciência Cristã: “O dia de hoje Deus o fez” (342, letra em inglês e trad. © CSBD). Isso é perenemente verdadeiro, e onde o amor de Deus está no comando, a mudança é sempre possível.
Esse é o “agente de mudança” de que precisamos, para trazer à luz novos começos, em vez da resolução humana. Por meio do amor de Deus, podemos conhecer a nós mesmos da mesma maneira como a Deidade nos conhece, ou seja, como filhos e filhas imutáveis de Deus, que é inteiramente bom. Essa ideia espiritual da relação permanente do homem com a bondade divina é o Cristo, que vem ao pensamento humano para tirá-lo de uma percepção material e elevá-lo até a compreensão espiritual sobre o existir. O poder de fazer isso foi exemplificado no tipo de mudança de caráter que Cristo Jesus produzia. Por exemplo, quando uma mulher adúltera lhe foi trazida por uma multidão empenhada em puni-la, ele se deteve, orou, e mudou o foco dos pensamentos dos possíveis punidores para a necessidade que eles mesmos tinham de reforma. Em seguida, ele consolou a mulher e depois também lhe indicou o caminho, para que sua vida mudasse para melhor (veja João 8:1–11).
Ao ponderar sobre as inúmeras histórias bíblicas, que mostram como a compreensão espiritual transforma a vida das pessoas, encontramos a resposta à pergunta: “Podemos realmente nos libertar de hábitos negativos?” Claro que sim! Podemos ver para além do falso senso de nós mesmos como pessoalidades mortais encurraladas em um ciclo de indiscrições repetitivas do passado e, em vez disso, perceber nossa verdadeira individualidade, coexistindo com Deus no reino espiritual, que não existe no tempo, e que está nitidamente indicado na linha de abertura da Bíblia, que diz: “No princípio, criou Deus os céus e a terra” (Gênesis 1:1).
Essa passagem não está se referindo a um ponto no passado. De acordo com a Ciência Cristã, essa é uma maneira bíblica de captar o fato de que Deus está perpetuamente nos renovando, à Sua perfeita imagem e semelhança. Referindo-se a essa frase, o livro-texto da Ciência Cristã, Ciência e Saúde com a Chave das Escrituras,de Mary Baker Eddy, diz: “O infinito não principia. A palavra princípioé aqui empregada para significar o único ― isto é, a eterna realidade e unidade constituída por Deus e o homem, incluindo o universo” (p. 502).
Nesse sentido, o caminho rumo a novos começos é saber que na verdade não há começos. A individualidade puramente espiritual que cada um de nós tem em nossa eterna unidade com Deus nunca começou, nunca cessará e não precisa ser melhorada. No entanto, essa mesma realidade sobre o que nós divinamente somos aponta para o fato de que o eu humano precisa ser purificado, passo a passo, demonstrando melhor, todos os dias, a individualidade que reflete a Deus, a qual os hábitos humanos centrados no ego parecem obscurecer. O livro Miscellaneous Writings [Escritos Diversos] 1883–1896, de autoria da Sra. Eddy, fala sobre essa purificação como um novo nascimento, que “começa com momentos e continua com os anos; momentos de entrega a Deus, de confiança como a dos pequeninos e de jubilosa aceitação do bem; momentos de renúncia do ego, consagração de si mesmo, esperança celestial e amor espiritual” (p. 15).
Como muitos, eu também tive experiências preciosas ao me render ao chamado de Deus para abraçar novos começos, nos quais traços de caráter negativos, tais como cinismo, irritabilidade e autocondenação desapareceram diante do reconhecimento de que, se tais traços de caráter não são qualidades de Deus, e nunca são, então eles não podem caracterizar a reflexão, o reflexo de Deus, que é o homem. Também, como resultado dessa mudança, senti uma “confiança como a dos pequeninos e de jubilosa aceitação do bem”, o que tornou a vida mais feliz e mais produtiva.
Ao lutar contra hábitos que se renderam mais lentamente do que outros, constatei também como o coração humano pode sentir-se profundamente relutante em abandonar o velho pelo novo. Como filhos e filhas de Deus, sempre refletimos o eterno frescor de Deus como a Mente imortal, mas o sentido oposto equivocado sobre nós mesmos como sendo materiais e não espirituais, ou seja, uma mentalidade que a Ciência Cristã descreve como “mente mortal”, está decididamente pouco inclinado a mudar, não importando quantas resoluções possamos tomar e nos comprometer a cumprir.
Em última análise, a maneira de “despir[-se] do velho homem”, ou seja, o processo espiritual de reformar nossa natureza, é descrito em Colossenses 3:9. Consiste em reconhecer que a Mente divina é a fonte dos nossos verdadeiros pensamentos. Até mesmo os nossos maus hábitos mais arraigados começam a perder seu senso de ser um peso morto, quando são vistos como uma pequena ponta visível da crença subjacente de sermos materialmente mentais, ao invés de puramente espirituais. O poder transformador do Cristo nos revela que somos puramente espirituais. Essa é a verdadeira natureza da nossa mentalidade como a expressão do Espírito. Portanto, todo senso de apego aos velhos costumes pode ser superado. Mesmo se houver sucessos e retrocessos em nossos esforços, à luz da realidade de que a Mente divina é verdadeiramente a nossa única mente, podemos com firmeza rejeitar o desejo de condescender com hábitos negativos, pois esse desejo não vem do nosso próprio pensamento. Dessa forma, nós progressivamente pomos a descoberto a falácia do suposto poder que a mente mortal alega ter sobre nós, e comprovamos esse fato.
Evidentemente, tal transformação por meio do Cristo é muito mais do que abordar de modo superficial a questão da mudança de caráter. Ela exige de nós, e nos capacita cada vez mais, a viver de acordo com a visão radical e espiritual de nós mesmos, motivados unicamente pelo Amor divino, como Jesus comprovou de maneira tão constante. Um dos primeiros trabalhadores no movimento da Ciência Cristã, Joseph Mann, lembra-se de quando Mary Baker Eddy lhe disse: “Tu não te livras do velho homem, se tentas torná-lo melhor. Se conseguisses torná-lo melhor, ele permaneceria contigo. Se remendas aquilo que é velho e dizes que ficou suficientemente bom, tu não o descartas, mas sim o conservas” (We Knew Mary Baker Eddy, Expanded Edition, Vol. II, [Reminiscências de pessoas que conheceram Mary Baker Eddy, Edição Expandida, Vol. II], p. 167).
Então, podemos aceitar em todos os momentos esse desafio de ir mais além do que consertar um senso humano defeituoso de nós mesmos, e de ceder à verdade do Cristo sobre a perfeita individualidade do homem, na qual os traços negativos, tanto em nós mesmos como nos outros, não têm começo, nem duração, e não aguardam nenhuma cessação futura. Eles são simplesmente mentiras a respeito da maneira como Deus nos conhece, exatamente agora e para sempre. E assim, de 1º de janeiro a 31 de dezembro, podemos encontrar uma renovação real e irreversível nas provas diárias do que somos, como o reflexo eterno do nosso Criador.
Quando fazemos isso, somos capazes de dizer, não apenas no dia a dia, mas de momento a momento, que somos “uma pessoa diferente”, à medida que nossa individualidade espiritual, que não está presa ao tempo, vem cada vez mais à luz.
Tony Lobl
Redator-Adjunto
