O mundo procura abundância, mas na maioria dos casos procura na direção errada — na matéria e na personalidade. Quando compreendemos a verdadeira natureza do bem, vemos que ela não está nalguma coisa material, nalgum país distante ou nalgum pasto mais luxuriante. Quando discernimos o bem espiritualmente, esse bem é nosso até mesmo no nosso próprio deserto, na nossa própria selva, no nosso quarteirão ou no nosso quintal.
S. João conta que depois de Cristo Jesus haver multiplicado os pães e os peixes para milhares de pessoas num lugar deserto, algumas delas que haviam comido tentaram fazer dele um rei (ver João 6:5—15). Mas não foi mediante alguma coisa sobrenatural nem mediante um rei na carne que o suprimento veio, mas através da compreensão espiritual.
O Mestre possuía a compreensão que lhe permitia ver a identidade espiritual do homem. Não a escondia como se fosse um mistério. Ele a demonstrava, a comprovava. Conhecer e comprovar nossa identidade é a chave de todo verdadeiro emprego, de nossa utilidade, da satisfação, de nosso progresso e realização. Mas o conhecer nosso eu perfeito não é tarefa fácil.
Não há como desviar-se dessa tarefa, mas nela há uma promessa reconfortante. Até mesmo um pequeno grau desse conhecimento começa, de imediato, a nos recompensar. Não existe alternativa praticável em ignorar-se o próprio eu.
A Ciência Cristã mostra-nos que a identidade de cada um é inconfundível e que, portanto, é impossível ser ela duplicada no tempo ou na eternidade. A identidade espiritual encontra-se além do plano da crença em que supostamente se verifica a propagação clônica, a transferência de identidade, ou a reincarnação. Entre as miríades de identidades criadas pela Mente divina não há crença alguma no que é físico ou mortal. “O Espírito único inclui todas as identidades” Ciência e Saúde, p. 333;, afirma a Sra. Eddy.
Jesus, em toda as suas obras, exemplificou o fato de que a identidade é espiritual. Disse: “Permanecei em mim, e eu permanecerei em vós.” J. B. Phillips dá-nos uma versão interessante dessa frase. Referindo-se ao quadro que Jesus apresentou com a videira e seus ramos, ele oferece a paráfrase: “Tendes de prosseguir crescendo em mim e eu crescerei em vós.” Na mesma palestra, Jesus disse aos seus seguidores de todos os tempos: “Sem mim nada podeis fazer.” João 15:4, 5; Jesus não se referia à sua personalidade mas ao Cristo invisível.
No entanto, a maior parte da humanidade ainda não está familiarizada com a Verdade. Será que a humanidade em geral está sofrendo do que se poderia chamar de crise de identidade? Uma crise de identidade pessoal induziu o filho pródigo, da famosa parábola de Jesus ver Lucas 15:11–32;, a declarar: “Pai, dá-me a parte que me cabe dos bens.” De acordo com a parábola, o jovem era herdeiro de uma parte dos bens de seu pai — todas as posses que ele alguma vez pudesse desejar. No entanto, sua exigência para que se lhe antecipasse sua porção, talvez indique uma falta de certeza de sua parte quanto à sua qualificação de herdeiro.
Acaso os problemas de deflação e inflação que se manifestam hoje no mundo não se originarão diretamente de um semelhante descuido trágico? O quadro econômico do mundo — enorme como possa parecer — precisa ser visto, em primeiro lugar, como um problema individual, e só em segundo como uma crise mundial.
A herança interpretada na parábola tem origem espiritual. Está inexaurivelmente presente, não podendo ser utilizada às custas de outrem. Nenhuma das partes precisa ir à guerra por causa dela. Quanto a esse pormenor, será que Jesus tinha a cabeça nas nuvens? É mais do que certo que ele não ignorava as necessidades humanas. No Sermão do Monte ele se referiu a “todas estas cousas” — presumivelmente: alimento, bebida, vestimenta, emprego, e assim por diante; incisivamente, porém, ele exortou todos a procurar em primeiro lugar “o reino de Deus e a sua justiça; e todas estas cousas vos serão acrescentadas” Mateus 6:33 (conforme a versão King James);.
“O reino de Deus” é a realidade espiritual — invisível para a vista mortal, mas real e prático para nosso sentido espiritual, e completamente afastado da “terra distante” do testemunho do sentido físico. A “terra distante” é a crença de que seja preciso cuidar materialmente de todas as nossas necessidades.
No seu desespero extremo, o filho pródigo mudou seu modo de pensar, desfraldou, por assim dizer, as cores de sua verdadeira identidade, e começou a pensar na casa de seu pai. Poderíamos dizer que ele caiu em si, ou melhor, voltou ao seu sentido espiritual. Havia cometido dois enganos: ignorado deliberadamente sua verdadeira identidade e recalcitrado em servir a seu Pai (o Princípio divino).
Esses enganos foram corrigidos pela reforma, “quando ele caiu em si”. A reação do filho pródigo não foi uma de compromisso, mas de ressurreição. A solução para os maiores problemas do mundo está oculta nesse versículo — está no despertar para a identidade espiritual (e não há outra).
O engano do mundo, igual ao do filho pródigo, está em pensar que cada qual precisa ter uma parte, ou participar, da matéria, e que essa parte pode ser-lhe esvaziada. O filho pródigo despertou a tempo de constatar que o suprimento verdadeiro não pode ser desperdiçado, que ele não é material mas espiritual, e que há “pão com fartura” para todos. O perigo está em esquecer a abundância de Deus ou de não viver com ela. O reconhecer a substância de todo o bem acompanha um despertar para o nosso verdadeiro eu, e silencia distrações apresentadas pela jactância da personalidade material carente de substância.
Mudar a nossa motivação, da expectativa de ganho para a de prestação de serviço, mudar o desejo por pagamento finito para o de reconhecimento do bem infinito — Deus e Sua idéia, o homem — é a solução crística. Quando compreendemos a espiritualidade da criação não excluímos dela pessoa alguma, mas incluímos a todos nos serviços amáveis que prestamos à fraternidade da humanidade. A súplica: “Trata-me como um dos teus trabalhadores” foi um passo importante na jornada mental do filho pródigo. Até mesmo uma aproximação hesitante a esta resolução espiritualmente inspirada, tão afastada da atitude de o-mundo-me-deve-um-meio-de-vida, traz progresso.
Podemos reconhecer que o-suficiente-para-cada-um realmente não está à mercê do passado ou do futuro. A Sra. Eddy escreveu: “Nunca peçais para amanhã; é suficiente que o Amor divino seja um auxílio sempre presente; e se esperardes, nunca duvidando, tereis a cada momento tudo quanto necessitardes.” Miscellaneous Writings, p. 307. Somente o sentido material pensa que reconhece a carência e a privação, ao passo que o aceitar a ajuda sempre presente do bem infinito conduz à vida que pertence a Deus, o bem; Deus é Vida.
Toda vez que renovamos nosso esforço de tratar nossa identidade espiritual com justiça, elevamo-nos um pouco acima dos modos mendigantes de viver. Tornamo-nos conscientes dos motivos mais elevados de servir ao Princípio, Deus, e ao Seu Cristo. Começamos a provar em maior proporção que o Espírito, não a matéria, é a fonte de todas as coisas de que o mundo verdadeiramente necessita.
