No decorrer dos últimos anos, poucos problemas sociais receberam tanta atenção quanto a síndrome de imunodeficiência adquirida, em alguns países conhecida como SIDA e noutros como AIDS. Esse é um assunto que toca em pontos controversos ou pessoais, morais ou políticos, na maneira de pensar de quase todos.
Se essa terrível enfermidade estivesse circunscrita a determinado grupo de pessoas, não seria de admirar que os que não se incluem nesse grupo, virassem a cara. É uma atitude humana de longa tradição e já conhecida nos tempos do Novo Testamento. Pelo menos esse é um dos aspectos da parábola de Cristo Jesus sobre o Bom Samaritano. Você conhece, decerto, a história.
Um homem é apanhado por bandidos, assaltado e abandonado meio-morto. Um sacerdote vem pela mesma estrada, vê o homem, mas passa ao largo. O viajante seguinte é um levita, que faz precisamente o mesmo. Por fim, passa um samaritano, que tem compaixão do homem machucado, limpa suas feridas, leva-o para uma estalagem e cuida dele. Essa parábola é relatada no décimo capítulo do Evangelho de Lucas.
Os comentadores bíblicos fazem notar que o benfeitor dessa história, o samaritano, é membro de uma seita desprezada pelos ouvintes de Jesus. Por isso, quando a parábola foi narrada por ele, em resposta à pergunta: "Quem é o meu próximo?", continha uma mensagem tocante.
Talvez possamos argumentar que o homem caído na mão dos assaltantes era, em essência, inocente, ao passo que certas doenças e enfermidades têm raízes em comportamentos essencialmente imorais e que, por essa razão, tal parábola não se relaciona diretamente com os doentes da AIDS. Infelizmente, por mais atraente que pareça essa interpretação, ainda nos deixa sem resposta para a questão do que fazer quanto à ameaça que a AIDS representa para a sociedade.
Quando a vida humana é ameaçada por uma doença virulenta, e esta de que estamos falando ameaça tanto a vida de crianças inocentes como a de confiantes parceiros matrimoniais, somos impelidos a examinar com maior profundidade a natureza do homem e seu relacionamento com Deus.
Muito progresso ocorreu desde a velha concepção teológica que encarava Deus como juiz severo, pronunciando, como sentença pelos desvios à Sua lei, a ida para o inferno. Ao longo dos séculos, enquanto essa concepção prevalecia largamente, sempre foi possível encontrar, mesmo no Antigo Testamento, declarações proféticas da ternura de Deus e de Seu papel como Redentor, ao invés de carrasco.
As ambigüidades sexuais, a tensão social, as desigualdades sociais, a toxi-dependência, a solidão, o desespero, a revolta e o pecado minam com gravidade, e às vezes mortalmente, o discernimento moral dos indivíduos. Sim, é preciso haver arrependimento pelo pecado, pois é esse o mal que deturpa a imagem do homem enquanto filho amado de Deus. Mas o propósito do cristianismo do Cristo foi precisamente salvar do mal a humanidade e isso inclui a cura, no seu significado mais amplo e profundo: cura moral, espiritual e física.
Diz-se que a AIDS, ou SIDA, é um sintoma do mal-estar moral dos tempos que correm. Fome, pobreza, destruição ambiental, guerras regionais, tudo aponta para a necessidade de profundo progresso espiritual na humanidade. E que progresso espiritual seria esse, se não aquele que, de acordo com os ensinamentos de Cristo, desenvolve em nós coragem e força moral, compaixão, desprendimento, um genuíno espírito de amor?
Foi isso que a Sra. Eddy percebeu que acontecera com o reaparecimento da cura cristã. A certa altura, ela escreveu em termos amplos sobre o impacto da cura cristã científica: "Diante das crenças fatais de ser o erro tão real quanto a Verdade, de ser o mal igual em poder ao bem, se não superior, e de ser a desarmonia tão normal quanto a harmonia, até mesmo a esperança de se ficar livre do cativeiro da doença e do pecado, tem pouca inspiração para incentivar o esforço.
"Quando chegarmos a ter mais fé na verdade do ser do que no erro, mais fé no Espírito do que na matéria, mais fé em viver do que em morrer, mais fé em Deus do que no homem, então nenhuma suposição material nos poderá impedir de curar os doentes e de destruir o erro." Ciência e Saúde, p. 368.
Quando essa profunda mudança ocorre em nós e em nossa vida, somos atraídos pelo poder do bem sobre o mal. Não ficaremos imobilizados pela desgraça. Ao contrário, por meio do afeto e da compreensão espirituais, encontraremos a verdade que conduz a humanidade ao Amor e à Verdade divina. Encontraremos o caminho da libertação, para nós e para nosso próximo, de tudo aquilo que nega ou pretende destruir a idéia do homem como sendo a imagem e semelhança espiritual de Deus.
Essa reforma começa quando não desviamos o olhar ou atravessamos a rua, ao deparar-nos com nosso próximo caído e deixado meio-morto. Mas nossos esforços não ficarão apenas nisso. Tal como o samaritano, descobriremos alguma maneira de cuidar das feridas e desempenhar um importante papel no ressurgimento da cura espiritual genuína.