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Chegou a hora de perdoar

Da edição de agosto de 1994 dO Arauto da Ciência Cristã


Durante Muitos Anos vivi em meio à violência da Irlanda do Norte, em uma pequena estrada entre as duas facções de nossa comunidade dividida. Além de toda violência na cidade, havia bastante discórdia em minha própria casa e eu, como esposa, era o que se costuma chamar "vítima da violência doméstica".

Como estudante sincera da Ciência Cristã, eu vinha orando acerca desses desafios, havia muitos anos, e alcançara certo grau de progresso em minha própria situação, mas parecia que nunca conseguia sair completamente dela. Continuava a orar para que Deus me mostrasse o que precisava ser mudado em meu pensamento. Meu único motivo e desejo real, em tudo isso, era descobrir para mim mesma como Deus era realmente.

Embora tivesse me tornado praticista da Ciência Cristã, (isto é, alguém que ajuda outras pessoas pela oração), eu não percebera que meu modo de pensar estava se tornando amargurado, duro e, devo admitir, incapaz de perdoar.

A incapacidade de perdoar é um dos maiores problemas do mundo de hoje, porque provavelmente pode-se dizer que existem poucas pessoas que não tenham um sentimento de mágoa por algo que lhes foi feito no passado. Assim, esse problema cresceu, até se tornar "um grande dragão vermelho" — uma crença mundial de que há algumas coisas ou algumas pessoas que são imperdoáveis.

Certa noite aprendi uma grande lição. Foi na época da greve de fome e do protesto que estava ocorrendo na casa de detenção Maze, nos arredores de Belfast. Os terroristas do IRA não estavam satisfeitos com as condições do cárcere, por isso destruíram suas celas, recusaram-se a comer e danificaram as paredes do edifício. Isso foi manchete em todo o mundo e nós víamos os acontecimentos na televisão e líamos a esse respeito nos jornais, todo dia. Ouvíamos falar disso não só na estação de rádio local, mas também nas conversações das pessoas no decorrer das atividades normais.

Dois desses detentos haviam morrido na greve de fome e, uma noite, quando eu estava indo me deitar um tanto tarde, ouvi no noticiário do rádio que um terceiro grevista viveria apenas mais alguns dias. Eu me lembro da irritação que se apoderou de mim e do pensamento que me veio: "E daí? Que morra! Será um a menos para nos preocupar, porque mesmo que ele viva e fique na prisão, sairá de lá mais amargurado, mais cheio de ódio do que antes e mais perigoso para nossa sociedade." Ah, sim! Eu justificava minha raiva, relembrando as terríveis atrocidades das quais os prisioneiros eram culpados, e tinha certeza de que todos, em nossa comunidade, sentiam a mesma coisa.

Mas, quando estás a serviço de Deus, Ele nunca permite que algo errado te passe desapercebido. Aconteceu que esse homem não morreu e, gradualmente, a greve de fome chegou ao fim. Muitas outras tragédias ocorreram depois disso, mas um domingo pela manhã, meses mais tarde, ouvi um programa religioso, em nossa rádio local, no qual diversos homens que haviam encontrado o cristianismo na prisão foram entrevistados. Eles haviam sido terroristas de ambas as facções em luta e estavam contando sua história de como haviam formado um grupo chamado "Soldados da Cruz". Desejavam compensar as ações erradas que haviam praticado e estavam agora trabalhando juntos a fim de fazer coisas úteis para nossa comunidade.

Eu conhecia pessoalmente dois desses detentos e fiquei muito interessada no programa de rádio, mas não estava preparada para o que ouvi depois. A um jovem foi solicitado que contasse sua história e ele era exatamente o homem que quase morrera na greve de fome.

Ele contou que estava no qüinquagésimo segundo dia de seu jejum e havia perdido a visão, quando as autoridades do presídio lhe disseram que teria apenas alguns dias de vida. Trouxeram sua mãe para visitá-lo e um sacerdote veio administrar-lhe os últimos ritos da Igreja Católica. Enquanto o sacerdote orava, pedindo a Deus perdão pelo jovem, este ouviu sua mãe chorar e dizer, de repente: "Não permitirei que faças essa coisa horrível, acrescentando-a a teus outros pecados. Sei que fizeste muitas coisas erradas, porém sei que deve haver algum bem, em alguma parte de ti. Por isso, irei agora às autoridades do presídio e pedirei que te tirem dessa greve de fome, e não me importa o que o IRA fará a mim. Sou velha e já vivi minha vida, mas ainda deve haver algo que valha a pena na tua."

Quando ele ouviu a mãe falar assim, sabendo que ela poderia estar pondo a si e aos outros familiares em grande perigo, disse: "Não, mamãe, não faças isso, eu mesmo o farei. Chama os guardas da prisão."

Levaram-no a um hospital, onde ele se recuperou. Sua visão voltou e ele começou a recuperar peso. Então voltou à sua cela, que havia sido desinfetada, pintada e mobiliada novamente. Contou que na primeira noite após seu retorno, tomou um banho, vestiu seu pijama novo e sentiu que tudo o que lhe dizia respeito era tão limpo e novo que, repentinamente, sentiu-se grato por estar vivo. Pôs-se de joelhos em sua pequena cela e orou a Deus, implorando perdão pelas coisas terríveis que havia feito, e pedindo ajuda para redimir sua vida e ser capaz de auxiliar outras pessoas.

Olhou na gaveta de seu armário para ver se ainda tinha a Bíblia e abriu-a em Mateus, capítulo 5, versículo 44, onde Cristo Jesus ensina: "Amai os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem". Então, ele se perguntou: "Será que eu tenho feito isso?" Viu que a resposta era negativa. Ele estava na ala do edifício onde ficavam detidos todos os republicanos e na outra ala estavam os legalistas. Ele contou que todas as manhãs, quando as portas das celas se abriam, ele costumava sentir o desejo de ter uma arma e poder matar todos os prisioneiros legalistas. Mas, depois disso, quando olhou para eles, repentinamente sentiu que os amava e disse a si mesmo: "Ora, esses são meus irmãos, meus compatriotas e temos mais coisas que nos unem do que as coisas bobas que nos separam. Temos isso em comum: somos todos filhos de Deus."

Naquele mesmo dia, ao sair da cela, ele fez questão de falar com os legalistas, e foi assim que se tornou membro do grupo "Soldados da Cruz", que vinha fazendo um trabalho tão bom.

Ele chorava, enquanto contava sua história no rádio. As vezes soluçava tanto que eu mal ouvia o que ele dizia, e não me envergonho de admitir que eu estava soluçando com ele. Eu pedia a Deus que me perdoasse pela dureza de coração e pela falta de misericórdia e perdão. De repente, compreendi que, enquanto eu e milhares como eu estivéramos condenando-o à morte, havia, na mais negra das noites, uma mulher sozinha orando por seu filho.

Compreendi o poder e a pureza do amor de mãe — amor que pôde ver algo de bom no filho, quando ninguém conseguia ver nenhum bem. Um amor que estava disposto a sacrificar a vida pela do filho. Lembro-me de que orei assim: "Deus amado, ensina-me sobre o amor, porque meu amor é limitado demais. Meu amor diz: 'Amar-te-ei se fores bom, ou se agires conforme aquilo que eu julgo bom; só assim estarei disposta a amar-te.’ " Compreendi que esse não é amor; é egoísmo e uma espécie de ódio contra o outro indivíduo.

Não precisei esperar muito por uma resposta porque, no final do programa, foi pedido a um pastor protestante que resumisse o assunto e ele leu em Oséias, capítulo 3. Oséias foi um grande profeta escolhido por Deus para pregar e profetizar aos seus compatriotas. Gozava de boa reputação, mas era casado com uma mulher que era prostituta. Ele pôs a mulher para fora de casa. Mas Deus estava ensinando a Oséias que Ele é um Deus de misericórdia e amor e que aquilo que estava acontecendo no casamento de Oséias era exatamente o que estava ocorrendo em seu país. Justamente como sua mulher o havia traído, abandonado e desonrado, assim os habitantes do país estavam vivendo em pecado. Haviam rejeitado a Deus, desobedecido à Sua voz, mas Deus queria que soubessem que Ele era um Deus misericordioso, que perdoava. Como prova disso, disse a Oséias para ir e comprar sua mulher de volta. Ele a comprou de volta por quinze peças de prata e vários punhados de cevada e uma promessa: "Desposar-te-ei comigo para sempre". Oséias 2:19.

Esse é um exemplo de como o amor e o perdão de Deus abrem o caminho para a regeneração. Não foi isso o que o amor daquela mãe fez pelo jovem terrorista? Primeiro, veio o perdão e depois, a redenção. Entretanto, eu estivera pensando que devia ser o contrário. Que lição foi essa para mim! Durante anos, depois disso, estudei para descobrir mais por mim mesma como era esse amor, até que, um dia, compreendi que a capacidade para amar dessa maneira pode ser obtida somente quando há perdão verdadeiro e incondicional em nossos corações. Pois dizer meramente: "Eu perdôo" e ainda alimentar mágoa ou falar sobre o que nos aconteceu no passado, não é, de modo algum, perdão.

Tudo isso ajudou-me muito a amar verdadeiramente o homem que prejudicara a mim e a meus filhos. Comecei a sentir por ele um amor que não era desta terra. Ele não estava disposto a mudar de atitude. Mas o aprender a refletir o amor de Deus, fez maravilhas para mim. Muito embora meu marido e eu acabássemos nos divorciando, consegui manter-me em contato com ele e cuidar dele durante os anos que antecederam seu falecimento.

Essa lição de amor foi a maior bênção de minha vida, porque me ajudou a perdoar todos os que eu sentia que me haviam prejudicado alguma vez. Também ajudou-me a perdoar a mim mesma.

Nosso querido Mestre, Cristo Jesus, mostrou-nos o caminho pelo exemplo, quando perdoou os pecados de tantas pessoas, mesmo dos que, entre seus mais queridos discípulos, o traíram, renegaram e abandonaram, quando ele mais necessitava deles.

Em Mateus, capítulo 5, é interessante que os versículos que sucedem àquele anteriormente citado, dizem-nos por que devemos amar nossos inimigos: "para que vos torneis filhos do vosso Pai celeste, porque ele faz nascer o seu sol sobre maus e bons, e vir chuvas sobre justos e injustos. Porque se amardes os que vos amam, que recompensa tendes?" diz Jesus. Esse capítulo termina assim: "Portanto, sede Vós perfeitos como perfeito é o vosso Pai celeste." Mateus 5:45, 46, 48.

Certamente, ser perfeito deve significar que não há em nós dureza de coração, condenação ou sentimento de mágoa. A única mentalidade que precisamos mudar é a nossa. Não somos responsáveis pelos pensamentos dos outros. Mas, ao perdoá-los e ao eliminar do conceito que temos deles todo senso de pecado e de pecador, estamos reconhecendo sua identidade genuína e espiritual e isso pode ajudar a efetuar a cura.

É interessante que parte da definição do verbo condenar, no dicionário, é "considerar incuràvel". Acreditar que uma pessoa seja incurável, é acreditar que haja alguma condição ou indivíduo inatingível para Deus. Mas acaso a Bíblia não nos diz que "para Deus tudo é possível"?  Mateus 19:26.

Talvez acreditemos, às vezes, que se não se vê uma mudança imediata na outra pessoa, tal mudança é impossível. Esquecemos, no entanto, que a vida é eterna e que o Amor divino tem infinita paciência e infinito poder para transformar.

É preciso que não nos deixemos enganar pelo pecado e que compreendamos que a verdade espiritual tão verídica para nós, é verdadeira para todos. Isso realmente significa todos! Sem exceções. Agora, esse perdão não significa que o pecado fique impune. Não há injustiça, porque "aquilo que o homem semear, isso também ceifará". Gálatas 6:7. Quando, porém, perdoamos realmente, estamos ajudando a abrir a porta da liberdade para os outros, à medida que eles demonstrarem a regeneração que anula o pecado.

Quando sofremos alguma ofensa, podemos pensar que alguém seja nosso inimigo. Contudo, a Sra. Eddy aconselha: "Simplesmente considera como teu inimigo aquilo que profana, desfigura ou destrona a imagem do Cristo que tu deves refletir. Tudo o que purifica, santifica e consagra a vida humana não é um inimigo, por muito que se sofra com o processo."Miscellaneous Writings, p. 8.

Aquele homem do IRA que eu pensara ser um inimigo, ensinou-me a lição de minha vida, assim como aprendi muito com meu ex-marido. Fui obrigada a voltar-me cada vez mais para Deus para encontrar minhas respostas, até aprender a depender somente dEle. Isso proporcionou-me uma liberdade que eu não conhecera antes — um senso de inteireza e satisfação absolutas. Propiciou–me também provas tão vívidas do carinhoso cuidado de Deus, que nunca mais pude duvidar dEle novamente. Aprendi que o perdão não é fraqueza humana. É preciso mais força para perdoar e para amar, do que é preciso para odiar e combater.

Somente o Amor divino curará este mundo. As represálias e todas as bombas, mísseis e munições dos arsenais do globo jamais poderão curar. Nem o podem todos os argumentos humanos e ponderações feitas com base mortal e material. Em algum lugar li, certa vez, que o perdão é como o perfume das flores: mesmo que se pise sobre uma flor, caminhar-se-á adiante com sua doce fragrância nos sapatos. Independentemente do quanto tenhas sido ofendido ou maltratado, teu perdão terá, certamente, efeito curativo.

Estas cousas vos tenho dito para
que tenhais paz em mim.
No mundo passais por aflições;
mas tende bom ânimo,
eu venci o mundo.

João 16:33

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