Nesta parte, Jesus continua seus ensinamentos a respeito das implicações do discipulado, enquanto Marcos apresenta de forma condensada diversos tópicos que foram expandidos por Mateus, no Sermão do Monte. Há também lições sobre tolerância e Jesus fala mais sobre a necessidade de sermos como crianças.
9:38—40 Imediatamente depois de os discípulos terem recebido uma lição de humildade, que ensinava a acolher aqueles que não tinham uma posição social destacda, João disse ao Mestre que eles haviam visto um homem que ... expelia demônios em nome de Jesus, mas como o homem não era um deles o haviam proibido de continuar a fazer isso. João estava em dúvida sobre se a atitude deles tinha sido acertada. Poderia alguém realizar obras em nome de Jesus, sem ser um verdadeiro discípulo dele?
Jesus respondeu: Não lho proibais. Esse homem, que tinha tanta fé em Jesus a ponto de fazer milagre em seu nome, provavelmente não falaria mal de Jesus nem lhe faria oposição. Pois quem não é contra nós é por nós. Se é a missão que é importante, então aqueles que tomam parte nessa missão precisam ser acolhidos, mesmo que sejam um pouco heterodoxos. Há inúmeras oportunidades de realizer o trabalho de Deus.
9:41—42 Em seguida, são mencionadas diversas instruções relacionadas com o discipulado. A hospitalidade era essencial no mundo antigo. Mas oferecer um copo de água a uma pessoa em ... nome de Jesus, pelo fato de essa pessoa ser de Cristo, significaria o reconhecimento do Cristo e seria um sinal de fé e obediência. Mesmo um pequeno gesto que encerrasse a disposição de servir, seria notado e a pessoa que o fizesse de modo algum perderia o seu galardão dado por Deus, o Pai.
Por outro lado, quem fizer tropeçar a um destes pequeninos que crêem em Jesus, receberá uma dura e imediata punição. Melhor lhe fora que se lhe pendurasse ao pescoço uma grande pedra de moinho, e fosse lançado no mar.
9:43—48 Mas as pessoas não devem se descuidar de seus próprios pecados. É utilizada uma fraseologia paralela, com mão, pé e olho. Cada uma dessas partes do corpo tem funções importantes a desempenhar, mas se elas se constituem em motivo para o pecado, se te fazem tropeçar, corta-as. Trata-se de um tratamento radical para o pecado e provavelmente não era destinado a ser tomado literalmente. Na verdade, ele enfatiza que o mal não deve ser ignorado nem tolerado. É melhor entrares maneta na vida, no reino de Deus, do que ... ires para o inferno, para o fogo inextinguível. Tomar parte no reino, obedecer à vontade de Deus e obedecer-Lhe é algo que vale qualquer preço. A outra opção é desembarcar no inferno, que simboliza desolação e profanação. A escolha é evidente. De um lado se encontra a vida em seu sentido mais amplo. Do outro lado, está a aniquilação, onde não lhes morre o verme, nem o fogo se apaga. A referência parcial a Isaías (66:24) nos remete a imagens de uma terrível destruição.
9:49—50 Imediatamente depois desse fogo do julgamento, aparece um fogo de purificação e preservação. Porque cada um será salgado com fogo, preservado e purificado. Bom é o sal; mas ele pode perder o sabor. Se o sal vier a tornar-se insípido, seu sabor nunca poderá ser restaurado e ele não servirá para mais nada. Se os seguidores perderem as qualidades de discípulos, eles se tornarão inúteis. Por isso, é fundamental ter sal em vós mesmos para ter paz uns com os outros.
10:1-12 Levantando-se Jesus, foi dali para o território da Judéia, continuando sua jornada para o sul, rumo a Jerusalém. E outra vez as multidões se reuniram junto a ele, e ... ele as ensinava, prosseguindo em seu ministério público.
No meio da multidão, encontravam-se alguns fariseus que se aproximaram, perguntando-lhe: É lícito ao marido repudiar sua mulher? Não se tratava de uma pergunta inócua; eles o estavam experimentando, tentando apanhá-lo em uma armadilha. Não havia consenso sobre o que se constituía motiva para divórcio. As opiniões se polarizavam em dois lados: um bastante liberal e outro conservador. A opinião popular era a favor da posição liberal; assim, se Jesus se colocasse ao lado dos conservadores cairia no desagrado do povo da época.
Jesus então respondeu, fazendo com que eles voltassem a sua atenção para a lei mosaica, para a autoridade das Escrituras: Que vos ordenou Moisés? Tornaram eles: Moisés permitiu lavrar carta de divórcio e repudiar. A carta de divórcio permitia que a mulher se casasse novamente e voltasse a ocupar uma posição na sociedade.
Mas Jesus lhes disse: Por causa da dureza do vosso coração, ele vos deixou escrito esse mandamento, cuja finalidade era estabelecer ordem e impor limites a uma sociedade que adotava posições desumanas. O divórcio, sem dúvida, era permitido, mas nem por isso devia se acreditar que ele fizesse parte do propósito original de Deus. Desde o princípio da criação, Deus os fez homem e mulher, separados e distintos. O homem deveria deixar seu pai e mãe e unir-se à sua mulher e se tornariam os dois uma só carne. O objetivo desse ensinamento era dar ênfase ao amor que deveria unir os cônjuges, bem como à consideração que um deveria ter para com o outro. Ele instigava as pessoas a terem um amor tão grande pelo cônjuge a ponto de considerá-lo como parte de seu próprio ser. O casamento deveria servir a um propósito divino, e o que Deus havia ajuntado era indissolúvel, não estando sujeito a nenhuma separação ocasionada pelo homem. Se, por qualquer razão, acontecesse a separação, ela seria uma decorrência do coração endurecido dos homens, não da vontade de Deus.
Será que Jesus estava querendo dizer exatamente isso? Em casa, voltaram os discípulos a interrogá-lo sobre este assunto. Ele então lhes explicou: quem repudiar sua mulher e casar com outra comete adultério contra aquela. E essa advertência se aplicava indistintamente tanto a homens quanto a mulheres, dessa forma conferindo à mulher posição de igualdade em relação ao homem, no que se referia a divórcio.
Ao contrário de Mateus, Marcos não inclui nenhuma exceção por infidelidade conjugal. Contudo, como naquela época, as pessoas hoje em dia também se divorciam e se casam de novo. O divórcio continua a ser uma concessão à fraqueza humana e, embora possa anular um compromisso legal, não pode anular a vontade e o propósito de Deus. Assim, Jesus não aconselha: "Não se casem de novo." A sua posição não é a de recomendar o que pode ou não pode ser feito, segundo as disposições legais estabelecidas pelo divórcio. Seu objetivo é fazer com que as pessoas desenvolvam uma compreensão mais elevada de amor. Ele não estabelece o mínimo a ser feito; em vez disso, convida as pessoas a sentirem um amor mais amplo, o ideal perfeito, e estende esse convite a todos.
10:13—16 Esse amor mais amplo também é estendido às crianças que lhe foram trazidas, para que ele as tocasse e abençoasse. Não sabemos por que os discípulos repreendiam aqueles que as traziam. Jesus, porém, vendo isto, indignou-se. A indignação de Jesus encerra uma profunda tristeza. Disse-lhes: Deixai vir a mim os pequeninos, não os embaraceis, porque ... o reino de Deus é formado pelos que são como eles. Em verdade vos digo: Quem não receber o reino de Deus como o recebe uma criança, de maneira nenhuma entrará nele. As crianças dependem totalmente de outros para as suas necessidades. Sem direitos legais nem dispositivos que lhes permitam reivindicar em causa própria, elas têm de confiar completamente nos adultos e só podem aceitar o que lhes é oferecido. Da mesma forma, não podemos fazer exigências a Deus, mas precisamos confiar em que Ele atende nossas necessidades. Colocamo-nos diante de Deus com as mãos vazias, sem poder propor condições nem negociar uma posição de destaque. Só podemos nos oferecer para fazer a Sua vontade e receber o que Ele tem para nos dar: o bem infinito. O reino de Deus não pode ser "adquirido", ele precisa ser "recebido".
Então, tomando as crianças nos braços e impondo-lhes as mãos, as abençoava.
