Cerca de 800 milhões de pessoas no mundo passam fome, segundo uma declaração recente de Jacques Diouf, Diretor Geral do departamento de Agricultura e Alimentação da Organização das Nações Unidas. Se você prestar atenção, poderá ver algumas dessas pessoas em sua própria cidade, vivendo nas ruas. Outras, nós não vemos, mas entre elas incluem-se algumas pessoas idosas, que vivem em suas casas com parcos recursos.
Trabalhei como correspondente de um jornal na África durante oito anos e nesse período tive a oportunidade de viajar bastante pelo continente na companhia de minha fotógrafa e esposa, Betty. Embora a seca fosse um fator importante, especialmente na Somália e no sul do Sudão, a guerra civil era a principal razão de morte por inanição naquelas localidades. Isso me deixava muito triste. Minha esposa, por sua vez, ficava triste e também indignada, mas voltarei a falar sobre isso mais adiante.
O que podemos fazer a respeito da necessidade de mais alimento para o mundo? Essa pergunta, algumas vezes, é respondida muito precipitadamente. Caso você seja uma pessoa que costuma orar, poderá ler na Bíblia exemplos da providência e do cuidado de Deus para com Seus filhos e talvez se convença de que o problema da fome pode ser resolvido. Poderá até mesmo fazer uma rápida oração nesse sentido, mas talvez depois nem pense mais no assunto.
Você poderá também ficar tentado a achar que o problema é grande demais, sem qualquer perspectiva de solução, e que não há nada que uma pessoa sozinha possa fazer para ajudar.
Nenhuma dessas respostas, porém, é adequada para ajudar a resolver o problema da fome no mundo.
A oração é poderosa e também pode levar à ação que irá aliviar, de alguma forma, o sofrimento de outra pessoa. Proporcionar alguma espécie de ajuda financeira não diminui a eficácia de nossas orações. Na verdade, se não ajudarmos quando a necessidade for evidente, nossas orações poderão parecer vazias e teóricas.
Compreendi isso num momento de extrema necessidade, quando fazia a cobertura da situação na Somália. Uma enfermeira americana, sozinha, estava ajudando um grupo de crianças e adultos famintos, vítimas da seca e da guerra civil. Coloquei meu gravador e meu computador portátil em um canto e comecei a levar água para algumas das pessoas que estavam deitadas ali. Talvez essa não pareça uma grande contribuição, mas foi uma forma prática que eu encontrei de ser útil, sem interferir no trabalho da enfermeira.
Mas, o que dizer das pessoas sem-teto que vivem em nossa própria cidade? Certo dia, em Washington, capital dos Estados Unidos, vi um homem enrolado num plástico, debaixo de chuva. Eu poderia ter feito uma oração, talvez ter-lhe dado algum dinheiro e ido embora. Mas, por alguma razão, convidei-o para vir comigo ao prédio onde Betty e eu estávamos morando antes de ir para a África. A proprietária do imóvel gentilmente ofereceu-lhe um quarto e comida. Ele ficou ali algumas semanas e então partiu.
Patrick, meu amigo desde o ensino médio, disse-me que estava querendo ajudar financeiramente uma pessoa necessitada, mas que preferia “ensinar alguém a pescar ao invés de simplesmente dar-lhe um peixe”, conforme diz o velho ditado. Patrick sugeriu que fizéssemos contatos diretos com as pessoas. Ele dizia que, se cada um de nós ajudasse ao menos uma pessoa necessitada a reerguer-se, já estaríamos ajudando bastante. Concordei com ele.
A oração e a ação constituem uma combinação natural. “A mansidão e a caridade têm autoridade divina”, escreveu Mary Baker Eddy (Ciência e Saúde com a Chave das Escrituras, p. 270). Ela percebeu a necessidade de “alimentar o faminto, restaurar o coração...”, conforme consta do original em inglês de um de seus poemas. Para mim, essa mensagem se refere também ao alimento espiritual e a uma mudança de postura ou de pensamento.
As pessoas podem desviar-se do faminto e do sem-teto, mas o preço que se paga por isso é alto, se é verdadeiro o versículo que diz: “Aquele que não ama não conhece a Deus, pois Deus é amor” (1 João 4:8). Em outras palavras, se não amamos os necessitados, então nós realmente não sabemos muito bem o que é Deus. Jesus disse simples e claramente, que depois de amar a Deus, amar nosso próximo como a nós mesmos era o segundo maior mandamento.
Se não amamos os necessitados, então nós realmente não sabemos muito bem o que é Deus.
Perguntaram a Jesus: Quem é nosso próximo? Ele respondeu a essa pergunta com a história do bom samaritano, que ainda hoje tem um grande significado prático. Algumas vezes, ao agir como bons samaritanos, descobrimos que as pessoas que ajudamos são ricas em caráter.
Certa manhã, em Nairóbi, Quênia, quando estava correndo perto do apartamento em que eu morava, passei ao lado de um rapaz que estava deitado na calçada, junto a um grande saco de papel usado que ele juntara para vender por alguns trocados. Passei por ele. Então, lembrando-me da história do bom samaritano, voltei. Acabei levando o Peter, que foi como ele se apresentou, a um albergue da Associação Cristã de Moços. Betty e eu pagamos por sua hospedagem naquele local enquanto ele fazia um curso para se tornar alfaiate.
Peter tornou-se muito popular na ACM por ser meigo com as crianças, agradável e gentil com todos, do cozinheiro ao diretor.
Um dia, quando caminhava com ele pelo centro de Nairóbi a caminho de uma clínica que ele queria visitar, saí da calçada e comecei a andar pela rua. Peter puxou-me pelo braço, forçando-me a voltar para a calçada. Naquele exato momento, um carro em alta velocidade passou por nós, rente ao meio-fio, bem no lugar onde eu estaria se não tivesse voltado para a calçada. Eu pensava que o havia ajudado, mas afinal foi ele quem acabou me ajudando, salvando minha vida.
E o que é que podemos fazer no nosso dia-a-dia, agora que talvez nos tenhamos dado conta do problema da fome em nosso e em outros países, lembrando-nos de que Deus é Amor e de que precisamos amar nosso próximo, inclusive nossos próximos que passam fome? Existem alguns pontos que devemos considerar:
1. Oração e conscientização
A oração pode elevar nosso pensamento e orientar nossas atitudes. Richard Harley, jornalista que trabalhou na redação do The Christian Science Monitor e que escreveu diversos artigos sobre o problema da fome, disse-me: “Precisamos mudar totalmente nossa maneira de pensar. O grande problema é que nossa perspectiva a respeito do que a humanidade seja ou possa vir a ser é muito limitada”.
Se, em nosso entender, a humanidade é formada de seres humanos com mentes egoístas, se tememos que a indiferença, a ignorância e o ódio sejam mais poderosos do que o amor, então teremos realmente um problema. Consideradas a partir desse ponto de vista, muitas situações parecem não ter solução. Se alcançarmos um estado de consciência mais elevado e mais espiritual, se reconhecermos o poder do amor, da oração e da bondade, e percebermos que somos mais do que meros seres finitos, ou seja, que temos uma identidade espiritual, então perceberemos que há esperança. Quando oramos, podemos pedir para compreender que esse conceito mais elevado de humanidade é verdadeiro, e então questionar tudo o que não esteja em consonância com ele, cada um à sua própria maneira. Não existe nenhuma fórmula para isso.
A oração funciona. As revistas publicadas por esta igreja estão repletas de testemunhos de curas obtidas através da oração. Muitas igrejas divulgam relatos de bênçãos que são fruto de oração. O Dr. Larry Dossey, médico, cita mais de 50 experiências conduzidas sob “rigorosas condições de laboratório” que ”demonstraram que a oração produz mudanças significativas numa grande variedade de seres vivos”, inclusive seres humanos (Healing Words: The Power of Prayer and the Practices of Medicine, Nova York: Harper Collins, 1993, p. xv). A oração pode levar a uma consciência mais elevada e também a uma atitude prestativa e eficaz, que ajude a minorar a fome.
Comentei no início deste artigo que minha esposa Betty ficava triste e indignada diante da situação que víamos na Somália. O que a indignava eram as atitudes egoístas de alguns políticos e milícias armadas que não levavam em consideração o bem-estar do povo. As orações podem fomentar iniciativas políticas altruístas, podem apoiar os líderes conscienciosos e o direito que todos têm de ser alimentados e de usar seus talentos para produzir mais alimento. Elas também podem estimular o respeito aos direitos humanos e políticos de todas as pessoas.
2. Oração e ação. Na condição de indivíduos, podemos orar e ser guiados pelas nossas orações a contribuir com dinheiro, mercadorias ou dedicando parte do nosso tempo a organizações locais de combate à fome. A oração “nos dá uma sensação de esperança, mas isso não basta”, diz Asha Confer, que trabalha num programa de capacitação profissional voltado para os sem-teto em Seattle, Estados Unidos. Não existe nenhuma solução rápida, diz ela, acrescentando que as pessoas que se preocupam com o problema podem apoiar a aprovação de leis e a destinação de recursos voltados para a prevenção ao uso de drogas e ao crime, bem como ao treinamento profissional. Isso ajuda a combater a fome e atende às necessidades dos famintos.
Pessoas de todas as idades têmse unido a organizações que ajudam a combater a pobreza no mundo, como o Peace Corps (Corpo da Paz). Outras, têm destinado parte de seu tempo ao trabalho realizado por grupos nos Estados Unidos, os quais se dedicam a objetivos semelhantes. Muitas comunidades mantêm programas que levam alimentos e ajuda humanitária a pessoas que estão impossibilitadas de se locomover.
As igrejas também têm participado desse esforço, fornecendo alimentos, roupas e abrigo aos necessitados. Durante as duas Guerras Mundiais muitas igrejas, inclusive a Igreja da Christian Science, organizaram-se e enviaram muita ajuda a pessoas de diversos países. Hoje, não há nenhuma guerra mundial, mas existem muitas mortes ocasionadas pela fome. E as igrejas podem fazer muito mais.
3. O progresso e a necessidade de se fazer mais.
O número de pessoas subnutridas está diminuindo em cerca de 8 milhões por ano, de acordo com a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação. Mas, se continuar nesse ritmo, levaria ainda 100 anos para erradicar totalmente a fome. Nos Estados Unidos, os pedidos de envio de alimentos em caráter de urgência aumentaram 17% no ano passado. Em alguns países em desenvolvimento, a fome “diminuiu sensivelmente” nos últimos 30 anos, mas dobrou na África no mesmo período, diz o Reverendo David Beckmann, presidente da organização Pão Para Todos. Essa organização estima que, com um centavo por dia por americano, os Estados Unidos até 2015 reduziriam pela metade o número de pessoas famintas que vivem na região ao sul do Saara, na África. Técnicas agrícolas avançadas impulsionaram a produção de alimento em todo o mundo. Pequenos empréstimos a pessoas de baixa renda têm ajudado a impulsionar a economia, à medida que eles provam ser pagadores confiáveis.
Ainda não encontrei uma resposta satisfatória ou definitiva com relação ao problema. É difícil sentir-se satisfeito quando tantas pessoas ainda passam fome. Mas, talvez o fato de eu me sentir assim me ajude a permanecer atento e a fazer um pouco mais a esse respeito. Oro para ter a coragem de, ao menos, encará-lo e poder encontrar maneiras humanitárias de ajudar as pessoas que o estão enfrentando.
