Muito embora eu esteja vivendo como estrangeira na Turquia há muitos anos, sempre tive medo de andar de ônibus pela cidade. Sei que pode parecer absurdo, mas até mesmo a idéia de ter de sair sozinha — para caminhar, dirigir um carro, pegar um táxi, quanto mais um ônibus lotado — me causava um ataque de pânico. Contudo, recentemente, tive de enfrentar o desafio de andar sozinha pelos arredores de Ancara.
Comecei indo para a academia de ginástica todos os dias da semana. Meu marido me deixava ali, a caminho do trabalho, mas como não lhe era possível me buscar, decidi que já era tempo de começar a andar de ônibus e acreditar que Deus cuidava de mim. Foi difícil tomar a iniciativa de entrar no ônibus (eu estava literalmente tremendo de medo). Mas, uma vez sentada, esqueci-me da agitação interior e comecei a prestar atenção no caminho que estávamos fazendo. Logo, entramos em uma estrada transversal que nos levou à entrada principal de um hospital. Naquela parada, várias pessoas embarcaram e imaginei que talvez elas estivessem doentes, cansadas, necessitadas, confusas, desanimadas. Talvez tivessem passado a noite toda fazendo companhia a um ente querido ou acabado de saber que não havia mais nada que pudesse ser feito. Crianças, idosos, grávidas, todo tipo de pessoas se encontrava ali. Parecia que a humanidade inteira estava ali representada.
Imaginei que isso deveria ser o tipo de coisa com a qual Jesus constantemente se deparava em sua ronda diária. "Percorria Jesus toda Galiléia... curando toda sorte de doenças e enfermidades entre o povo" (Mateus 4). Compreendi que agora era a minha vez de seguir os passos de Jesus e orar pelos meus irmãos e irmãs muçulmanos. Assim que o ônibus deixou a entrada do hospital, fechei meus olhos, curvei minha cabeça e orei a Oração do Senhor, de forma humilde e reverente como nunca havia orado antes, tendo em mente o sentido espiritual da oração, conforme consta em Ciência e Saúde (ver pp. 16:17).
"Pai nosso que estás nos céus..." "Nosso Pai-mãe Deus, todo-harmonioso." Deus todo-poderoso, Tu estás sempre presente e és supremo. Supre as nossas necessidades com Tua graça abundante.
"E perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós temos perdoado aos nossos devedores." Possamos nós, de hora em hora, prestar-Te contas, lembrando-nos sempre não das falhas do nosso próximo, mas que ele é Teu filho espiritual e perfeito. Possamos nós optar por perdoar, refletindo somente o Amor. Livra-nos do pecado, da doença e da morte. O Senhor Deus, a Mente divina, é infinito e harmonioso, o único poder que reina na consciência que temos da Vida, da Verdade e do Amor Possa o amor de Deus, que é Tudo-em-tudo, governar cada pensamento. Esse é nosso desejo fervoroso.
Aquela primeira viagem de ônibus foi uma verdadeira revelação e uma cura para mim. Agora, sou muito feliz por andar de ônibus — é uma grande oportunidade de sentar-me junto aos meus irmãos e irmãs, orando por eles e amando-os. Freqüentemente, vendo um bilhete do meu talão de passagens para alguém e seu sorriso agradecido diz tudo. Ainda estou aprendendo muitas lições nessas viagens. Como no outro dia, por exemplo, um homem entrou no ônibus e perguntou se alguém tinha um bilhete extra. Imediatamente lhe ofereci um dos meus, mas só depois de ter o bilhete perfurado foi que me disse que não tinha nenhum trocado e sentou-se no banco à minha frente. Ele começou a mexer em seus bolsos como se procurasse por algum trocado, mas não encontrou nada. Veio-me a idéia de que talvez esse homem não tivesse nenhuma intenção de pagar pelo bilhete que eu lhe dera.
Então, meu pensamento começou a trabalhar velozmente: "Olhe para esse homem. Está bem vestido e não precisa de esmola. Aposto que faz isso toda vez que anda de ônibus, aproveitando-se de pessoas crédulas como eu".
Parecia que eu simplesmente não conseguia parar o curso dos meus pensamentos (da mesma forma que não poderia parar o percurso do ônibus), mas sabia que, de alguma maneira, precisava fazer isso.
Estudo diariamente a Bíblia, juntamente com o livro Ciência e Saúde, e estou descobrindo as leis curativas do Amor divino e como elas se aplicam à nossa experiência diária. Desejava realmente praticar o amor sobre o qual estava aprendendo. Essa odiosa conversação interior certamente não vinha de Deus, que é o Amor, a única Mente. Mas, aquele homem continuava me irritando.
Quando chegamos à parada de ônibus em frente ao hospital, uma mulher grávida subiu e, como os assentos vazios estavam sendo rapidamente ocupados, aquele homem ofereceu seu assento a ela. Pensei comigo mesma: "Ele não pode ser de todo mau." Lembrando-me da promessa que havia feito a mim mesma de orar diariamente por todos os passageiros, comecei a orar com meu principal apoio, ou seja, a Oração do Senhor. Quando cheguei à parte que diz: "E perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós temos perdoado aos nossos devedores", quase caí do banco. "É isto", pensei. "Perdoar!" Então, logo depois disso, fiz a escolha consciente de perdoar meu devedor e regozijar-me, o que me fez sentir muito melhor.
Compreendi que a verdadeira identidade desse homem não era nada diferente daquela que havia reivindicado o dia todo para mim mesma: uma filha preciosa de Deus, feita à Sua imagem e semelhança. Aos olhos de Deus, nunca fomos vilão e vitima, cada qual com uma mente separada. Existe apenas uma única Mente, da mesma maneira que há um só Deus para todos e sobre todos. A lei do amor de Deus e do perdão fraternal é universal e, como Sua filha obediente, eu tinha de perdoar — eu desejava perdoar — de boa vontade, de todo meu coração e seguir adiante. Portanto, eu o perdoei por não ter comprado o bilhete antes de subir para o ônibus. Eu o perdoei por não ter o troco. Eu o perdoei por tentar tirar vantagem de mim, se, de fato, ele o havia feito. Preenchi meus pensamentos com o puro perdão que só nosso Deus único, o Amor divino, o amado Alá, pode perdoar.
Preenchi meus pensamentos com o puro perdão que só nosso Deus único, o Amor divino, o amado Alá, pode perdoar.
À medida que o ônibus se aproximava da minha parada, comecei a me preparar para descer. De repente, meu "devedor" perguntou-me: "A senhora não vai descer no centro da cidade?" Quando lhe disse que não, ele tirou uma cédula de 20 liras turcas (aproximadamente R$34,00) e freneticamente começou a perguntar aos outros passageiros se eles tinham troco. Ninguém tinha. O homem me pediu desculpas, dizendo que ele havia pensado que eu seguiria até o centro da cidade, onde pretendia comprar um bilhete para mim. "Tudo bem," disse-lhe. Não querendo deixar por isso mesmo, ele perguntou a um outro passageiro se ele podia emprestar-lhe 1,50 liras comprometendo-se a reembolsá-lo quando chegassem à cidade. O passageiro concordou e, exatamente quando o ônibus se aproximava da minha parada, meu devedor pegou o valor de 1,50 liras de seu credor e colocou-o em minha mão. Fiz objeção quanto aos "juros" de 0,50 mas, ele insistiu em me pagar. Assim, agradeci rapidamente a ambos enquanto as portas se abriam. Desci e as portas se fecharam ruidosamente atrás de mim — ufa, tudo perdoado.
Alguns dias mais tarde, vendi um bilhete para uma senhora. Ela não tinha troco para inteirar 1 lira, portanto, lhe disse que estava tudo bem. Por duas vezes ela me disse: "Helal edin!" e sentou-se em um assento próximo. Mas, ao se assentar, algumas moedas, que haviam passado desapercebidas no fundo de sua bolsa, apareceram e, sorrindo, ela imediatamente entregou-as para mim. Quando lhe disse que havia pagado muito mais, ela respondeu que estava tudo bem.
Na primeira oportunidade, procurei em um dicionário turco-Inglês o significado das duas palavras que ela usara. Elas podem significar: "Não retenha", ou, em outras palavras, perdoe! Portanto, agora, sempre que parece que recebo menos troco que o devido no ônibus, digo: "Helal olsun", que significa: "dou isso com prazer para você". Em outras palavras, eu perdôo!
Andar de ônibus tornou-se natural para mim. Além do mais, também fui curada dos ataques de pânico. Para isso, tudo o que se requer é perdoar.
