Skip to main content Skip to search Skip to header Skip to footer

REFLEXĀO

Lições de geometria

Da edição de março de 2007 dO Arauto da Ciência Cristã


A inscrição, logo acima da porta de entrada da Academia de Platão em Atenas, alertava: “Proibida a entrada de pessoas que não conheçam geometria”.

A placa na porta do gabinete de Frank Morgan, no Departamento de Matemática e Estatística da Faculdade Williams, uma pequena usina de força intelectual aninhada aos pés das montanhas Berkshire, na parte ocidental do estado de Massachusetts, faz uma advertência parecida (em grego, é claro). Entretanto, a placa está pendurada no lado de dentro da porta do gabinete. Tradução: “Não espere sair do mundo da matemática do Professor Morgan sem aprender algo sobre geometria”.

Um dos dois campos pré-modernos da matemática, a geometria (o outro é o estudo dos números), originou-se de um antigo estudo grego de relações espaciais. A palavra geometria significa medida da terra. Contudo, geômetras modernos medem mais do que a terra. Eles medem o formato do universo.

Felizmente, quando nos encontramos, em uma tarde muito quente de agosto, o Professor Morgan facilitou meu entendimento, ao dizer: “Aprendo sobre bolhas de sabão”.

“A geometria”, explica Morgan, “é o estudo do porquê as coisas apresentam as formas que têm. Por exemplo: o que é mais simples do que uma bolha de sabão redonda? Certo? Mas, um outro espaço, interessante de se compreender, é o universo inteiro. Se você deseja compreender todo o universo, por onde você começa? Com o universo ou com a bolha de sabão? Primeiro, você compreende a bolha de sabão e então, você aplica as lições que aprende com ela aos problemas mais difíceis”.

Os hipercubos, por exemplo, residem em dimensões remotas, isto é, dimensões além das três do nosso mundo do dia-a-dia, me explicou Morgan, durante o nosso casual almoço. “Se medirmos um cubo que tem um lado medindo uma polegada em dimensões remotas, a distância de um ângulo ao outro é mais de um bilhão de quilômetros. Portanto, essas são coisas nas quais nossa intuição precisa ser re-educada”.

“Eu diria que as idéias são as ferramentas necessárias para o desempenho da nossa profissão”, diz ele mais de uma vez, durante o decorrer do dia. “O matemático puro deseja abordar as questões e lacunas fundamentais, em sua compreensão teórica. Contudo, a matemática pura não se refere a um acúmulo de fatos. Refere-se a idéias. Tem a ver com uma compreensão melhor do universo. Às vezes, as mudanças de paradigmas realmente simplificam a perspectiva que temos das coisas”.

Idéias. Mudanças de paradigmas. Uma compreensão melhor do universo. Simplificar perspectivas...

Não demorou muito para eu compreender que, para o geômetra Frank Morgan, um significado implícito tangível do pensamento (um universo paralelo) existe dentro do estudo da matemática. Para ele, a matemática lança uma luz especial sobre os princípios subjacentes, ou o Princípio, do formato metafísico fundamental do universo.

Participei, juntamente com quatro alunos assistentes de pesquisa, de uma reunião com Morgan, em seu moderno gabinete de tijolos decorado em estilo da década de 60. Eles explicaram conceitos básicos, que para mim soam como se fosse grego, sobre o que é chamado de “teoria da minimização de área”. Eles comentam sobre a oscilação entre a frustração e a exaltação de trabalhar com problemas matemáticos (Morgan dá aos alunos problemas que nenhum deles resolveu ainda). Eles descrevem a criatividade e a persistência exigidas para resolvê-los.

"Você tenta ser o mais criativo possível”, resume um aluno. “Você espera que a criatividade o leve à solução, o que envolverá uma idéia completamente nova”. Morgan enfatiza: “A matemática envolve lidar com erros e concepções equivocadas. Esse é um tema comum na matemática. Sabe, temos uma maneira errada de olhar para alguma coisa que parece nos impedir de encontrar a solução, por um bom tempo”.

“A matemática envolve lidar com erros e concepções equivocadas. Temos uma maneira errada de olhar para alguma coisa que parece nos impedir de encontrar a solução, por um bom tempo”.

Depois do almoço, consegui conversar sozinho com Morgan.

Morgan formou-se pelo MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts) e fez seu doutorado na Universidade de Princeton. Escreveu seis livros sobre matemática, incluindo o “Calculus Lite” (Cálculo Leve), que pode ser qualquer coisa, menos leve. Quando nos acomodamos para uma conversa séria, ele colocou a garrafa amarela de sabão líquido (do tipo que usamos quando criança na escola) sobre a mesa, mergulhou um bastão branco de plástico e começou a soprar uma fileira de bolhas. Observei, fascinado, as bolhas flutuarem como em um complexo ato de mágica. Morgan sente verdadeiro prazer nas bolhas de sabão. As bolhas representam a força organizadora do princípio. Morgan mantém uma bolha na ponta do bastão e pergunta:

“Então, que formato é este?”

“Diria que é algo que se aproxima de uma esfera”, respondo, após uma ponderação um tanto demorada.

“É redondo. Você está absolutamente certo. Então, por que é redondo?”

Hum... pensando... E então! “Por que é redondo? Bem, por que não seria redondo? (Esperto eu, não?) Não é provável que tenha uma forma angular. É provável que seja liso. Provavelmente tem algo a ver com economia”.

Bingo!

“Exatamente, é o formato minimizador de energia/área. A maneira mais eficiente de armazenar um determinado volume de ar é dentro de uma esfera redonda. É o princípio da minimização de área. Observe como a bolha é redonda, realmente redonda. Entretanto, você sabe qual é a resposta mais comum para a pergunta sobre por que é redonda? Muitos respondem porque o bastão é redondo”.

Morgan coloca sobre a mesa seu canivete suíço com muitos bastões de plástico de fazer bolhas pendurados nele. Ele escolhe o bastão com a ponta no formato facetado de diamante e sopra uma bolha através dele. Ela não sai facetada no formato de diamante. Ela sai redonda.

“É claro que é redonda”, ele enfatiza. “A bolha não tem nada a ver com o formato original do bastão ou com o ambiente, ou com a umidade ou com as condições atmosféricas. É o princípio da minimização de área que governa o formato da bolha. É apenas geometria. É apenas o princípio matemático governando seu formato. Agora, dê uma olhada em Ciência e Saúde e você verá que Mary Baker Eddy diz: “Tudo o que oferece a aparência de uma idéia governada por seu Princípio, dá o que pensar” (p. 195). Portanto, podemos dizer que o fato correspondente na Ciência Cristã é que nossa verdadeira condição, ou seja, nossa inteligência, energia, saúde, não é o resultado da maneira como somos formados, nem do ambiente, nem das circunstâncias, mas é o resultado do governo pelo Princípio divino. Mary Baker Eddy diz: “Retira Deus, o Princípio divino, do homem e do universo, e o homem e o universo não mais existirão” (The First Church of Christ, Scientist, and Miscellany [A Primeira Igreja de Cristo, Cientista, e Vários Escritos], p. 226).

Pergunto-lhe como a Ciência Cristã o ajuda como matemático. E ele me responde com outra pergunta: “Achei que você ia perguntar algo assim. Contudo, gosto de abordar esse assunto por um outro ângulo. Parece-me que a pergunta real é: Como a matemática me ajuda a compreender a Ciência Cristã? Certo? Na matemática, fica muito claro que tudo é governado pelo princípio, pela lei. Portanto, a matemática me ajuda a pensar sobre Deus, analogicamente, como sendo o Princípio por trás do universo. Existe algo bom no universo que não é apenas uma questão de acaso e acidente, mas existe realmente esse tipo de Princípio de amor, esse Princípio de inteligência — Deus é Mente — que vemos expressado em inúmeros formatos diferentes no universo”.

Morgan mostra citações nos escritos de Mary Baker Eddy, nas quais ela ilustra, através da analogia da matemática, três lições de vida específicas e princípios que estabelecem diretrizes:

Iniciativa: “Quem se colocaria diante de um quadro negro e rogaria ao princípio da matemática que lhe resolvesse o problema?” (Ciência e Saúde, p. 3).

Honestidade: “A honestidade, sob todas as condições, sob todas as circunstâncias, é a regra indispensável da obediência. Obedecer ao princípio da matemática noventa e nove vezes em cem e então deixar que um único número torne incorreto todo o problema, não é nem Ciência nem obediência” (Miscellaneous Writings [Escritos Diversos], 1883–1896, p. 118).

Paciência: “Cristãos, como os estudantes de matemática, devei avançar rumo às regras mais elevadas da Vida, as quais Jesus ensinou e demonstrou” (Ibidem, p. 29).

“Temos de tomar a iniciativa em nosso trabalho”, Morgan acrescenta. “Temos de ser honestos. Não podemos nos afastar das regras da matemática e mesmo assim esperar obter uma resposta correta para o problema. Da mesma forma, devemos ser igualmente fiéis em nossas perspectivas morais, se queremos ser cristãos. À medida que prosseguirmos com nossos esforços legítimos na vida, obteremos um senso maior de exatidão, inteligência, de como eliminar o erro e sermos mais fiéis. Não podemos começar pela lição de vida mais avançada, mas temos de praticar as lições mais simples. Seria como se um matemático desejasse pular para o problema mais difícil primeiro. Não, temos de resolver os mais simples primeiro e, dessa maneira, avançar para os mais difíceis. Depois de um tempo, perceberemos o que está bloqueando a compreensão. Freqüentemente, são erros e pré-concepções equivocadas. Temos, sabese lá a razão, uma pré-concepção sobre a maneira como algo deva ser resolvido. Enquanto a tivermos, é como se não pudéssemos conhecer a verdadeira situação. Temos de descobrir nossos erros e vê-los pelo que eles são, antes de estarmos prontos para prosseguir e aprender uma nova lição”.

“Sinto como se aprendesse essas lições muito vagarosamente, mas acho natural, não algo meio milagroso. Considero Deus como um Princípio compreensível. Entretanto, não existe nenhuma resposta tipo fórmula. Compreendo isso cada vez mais, á medida que o tempo passa. Temos de ser realmente ativos e honestos e não apenas prosseguir com algo que aprendemos no passado e que repetimos indefinidamente. Isso se aplica também mentalmente, sobre como abordamos as coisas. É uma questão de expressar pensamentos originais”.

Morgan reconhece que a religião pode inspirar outras atividades nas quais estamos engajados e que a Ciência Cristã o inspira de forma profunda. Contudo, ele argumenta que não menos importante é como as atividades da vida levam a uma compreensão mais elevada de religião.

“O objetivo central do cristianismo é compreender melhor a Deus. Além disso, tudo o mais que fazemos deveria nos apoiar nessa direção. Qual é o propósito do mundo? É ser uma metáfora para a compreensão da realidade. A matemática é um caso extremo, pois é a menos ligada ao físico e a mais centrada em idéias”.

Morgan sopra mais bolhas.

“Vê essa bolha dupla?”, pergunta ele. “Esse formato é uma questão muito mais intrigante do que uma bolha única. O fato de a bolha única redonda prover a melhor maneira de uma área mínima armazenar um único volume de ar foi conjeturado pelos antigos gregos, Arquimedes e Zenodoro, mas, na verdade, não foi matematicamente provado até 1884, por Schwarz. O fato de que a bolha dupla é a maneira mais eficiente de armazenar e separar dois determinados volumes de ar foi provado apenas há alguns anos, pela equipe com a qual eu estava trabalhando”.

Morgan colaborou com uma equipe internacional de matemáticos e, em 18 de março de 2000, a equipe anunciou a “Prova da Conjetura da Bolha Dupla”, da qual ele é co-autor, juntamente com Michael Hutchings, Manuel Ritoré e Antonio Ros, publicada em 2002, no jornal mais respeitado dessa disciplina, Annals of Mathematics (Anais da Matemática). A tese representa o apogeu de dez anos de pesquisa. O que começou como uma simples indagação sobre algumas questões da matemática que muitos aceitavam como verdadeiras, terminou como uma asserção definitiva e sistemática da idéia original, agora reconhecida pelo campo.

“Existiam muitas coisas no problema da bolha dupla na geometria, que as pessoas não haviam avaliado dez anos antes. Havia uma falsa impressão de que compreendíamos tudo isso. Acho que muitas coisas são assim na vida. Portanto, comecei adotando um ponto de vista de que isso não era compreendido e que era uma questão maravilhosa, algo que você simplesmente gostaria muito de compreender”.

Frank Morgan formulou perguntas. Para responder a elas e a incontáveis outras questões que os matemáticos formulam, exige-se, freqüentemente, uma reformulação profunda da estrutura do mundo. Perguntei: “Você diz que a matemática é uma metáfora para se compreender a realidade?”

“Sim. Ela nos ajuda a alcançar concepções mais elevadas sobre o que a inteligência, o propósito e o amor significam”.

Como seres humanos, não compreendemos as coisas completamente e, portanto nosso senso sobre todas elas é limitado. Contudo, acho que quanto mais compreendermos sobre a Vida, melhor será nosso senso sobre tudo o mais. A matemática é mais que uma metáfora. Ela é a realidade”.

Mas, seria a matemática mais do que simplesmente uma metáfora? Seria ela uma realidade?

“Ah, essa é uma boa pergunta. Quero dizer que nós, como seres humanos, não compreendemos as coisas completamente e, portanto nosso senso sobre todas elas é limitado. Contudo, acho que quanto mais compreendermos sobre a Vida, verdadeiramente definida, melhor será nosso senso sobre a matemática, a música, o governo e tudo o mais. Você não acha? Quero dizer que o céu não pode ser esse lugar onde existe apenas um nada amorfo, ou seja, sem formatos, em que as pessoas ficam flutuando, em uma espécie de êxtase tedioso. Não acho que seja assim... Não, a matemática é mais que uma metáfora. Ela é a realidade”.

Concordo. Enquanto tento envolver minha mente em torno de cubos de dimensões remotas, compreendo, melhor do que há algumas horas, que a matemática e a Ciência Cristã têm muitas afinidades. A pesquisa e o progresso na matemática, não menos do que na Ciência do ser, exigem premissas contestantes, que desafiem pré-concepções e estimulem o pensamento a descobrir o que é verdadeiro. Uma frase do livro de Edward de Bono, Lateral Thinking (Pensamento Lateral), me vem à mente: “...a escolha da área de atenção pode fazer uma enorme diferença com relação à maneira com que uma situação é vista. Para reestruturar a situação, talvez necessitemos nada mais do que uma leve mudança no foco de atenção. Por outro lado, se não ocorrer nenhuma mudança nesse foco de atenção, talvez seja difícil olhar para a situação de maneira diferente” (p. 185).

Encaminhei-me para a porta. Levantei os olhos para a placa com as palavras de Platão e compreendi tudo. Bem, imagino que subi um pouco mais alto no grau de aprendizado de geometria. Talvez tenha sido essa razão pela qual porque o Professor Morgan tenha me dado permissão para sair de seu mundo.

Para conhecer mais conteúdo como este, convidamos você a se inscrever para receber as notificações semanais do Arauto. Você receberá artigos, gravações em áudio e anúncios diretamente via WhatsApp ou e-mail.

Inscreva-se

Mais nesta edição / março de 2007

A missão dO Arauto da Ciência Cristã 

“...anunciar a atividade e disponibilidade universal da Verdade...”

                                                                                        Mary Baker Eddy

Conheça melhor o Arauto e sua missão.