Enquanto ouvia pequenos trechos de novos livros em áudio, esta afirmação chamou minha atenção: "O mundo aprendeu a como acabar com a escassez de alimentos e como vencer a fome crônica. Temos a informação e as ferramentas necessárias, mas ainda não fizemos nada para resolver o problema."
O narrador do livro em áudio continuou dizendo que Norman Borlaug havia alertado sobre as consequências de tal fracasso, ao argumentar, no discurso que deu quando recebeu o Prêmio Nobel da Paz de 1970, em Oslo, que a humanidade deve e precisa impedir a tragédia da fome no futuro, em vez de meramente tentar, com piedoso pesar, salvar os destroços humanos da fome como ele tantas vezes o fizera no passado. Seremos culpados de negligência criminosa sem justificativa, se permitirmos no futuro uma nova escassez de alimentos. O narrador continuou: "Em meados de 2008, o número de pessoas subnutridas no mundo havia aumentado para quase um bilhão" (ver Audible. com; e Roger Thurow e Scott Kilman, Enough: Why the World's Poorest Starve in an Age of Plenty [Basta: Por que os mais pobres do mundo morrem de fome em uma época de abundância], Perseus Books Group, 2009).
Fiquei ali sentada por um momento, ponderando o quão angustiante é esse problema. A geografia e os números envolvidos são complexos. Não sou responsável pela política agrícola, pelos preços das commodities, pelas condições atmosféricas adversas ou pela instabilidade política crônica, pensei. O que eu poderia fazer, na verdade, para aliviar a fome do mundo de uma maneira significativa?
Comecei a imaginar se Jesus teve alguma orientação para saciar a fome global. Nos tempos de Jesus, as políticas da Roma imperial governavam a distribuição de alimentos. As tradições judaicas ditavam as regras alimentares e impediam o consumo de certos alimentos ou a colheita de alimentos no sábado, por exemplo. Entretanto, os discípulos de Jesus colhiam milho (ou trigo), quando tinham fome, mesmo no sábado. Em outras ocasiões, Jesus alimentou milhares de pessoas com uma quantidade mínima de pão e peixe, como resultado de sua oração e poder espiritual. Quer fosse para suprir as necessidades de poucos ou muitos, Jesus saciava a fome fazendo uso de meios práticos e espirituais.
Em vez de explicar as necessidades como físicas, a espiritualidade busca a causa mental
Houve também a demonstração sem paralelo de Moisés, alimentando dezenas de milhares de bocas famintas todos os dias, durante 40 anos, sem precisar plantar, colher ou caçar. O maná e as codornizes surgiam por meios divinos, quando as tribos de Israel vagavam pelo deserto e se preparavam para entrar na Terra Prometida. Moisés, ao alimentar os famintos, violou todas as leis materiais de limitação e distribuição.
Meu marido e eu estivemos na Jordânia e vimos algumas das áreas do deserto que foram percorridas pelos israelitas. Havia pouca agricultura. O alimento e a água disponíveis supriam somente pequenas tribos de beduínos estabelecidas fora dos limites de cidades e dos oásis. Em meio a esse tipo de escassez, Moisés e Jesus compassivamente e de modo eficaz supriram as necessidades diárias de seus seguidores. Era a expressão natural da espiritualidade e compreensão profunda do governo de Deus sobre a terra, que os capacitava a alimentar o faminto, curar o doente e salvar os que estavam perdidos.
Espiritualidade é a capacidade de compreender a Deus. Esse mesmo senso espiritual discerne as necessidades de homens e mulheres e tem a percepção de como resolvê-las. Em vez de explicar as necessidades como físicas, a espiritualidade busca a causa mental. Ao penetrar através da superfície da materialidade, rumo á realidade espiritual subjacente, o pensador e obreiro espiritual libera as possibilidades divinas ocultas na criação de Deus. Embora a manifestação de alimento pareça vir de fora, é o crescimento e a transformação espiritual que verdadeiramente alimentam e sustentam homens e mulheres.
Não existe nenhuma ideia de Deus que seja inferior
Jesus e Moisés demonstraram que a fome física foi saciada mediante a divina graça de Deus. O que dizer daqueles que estão famintos por amor e afeição? Daqueles que estão financeiramente enfraquecidos por meses de desemprego ou subemprego? Daqueles que têm desafios crônicos de saúde? As mesmas verdades espirituais utilizadas por Moisés e Jesus são suficientes para satisfazer a toda necessidade humana.
Talvez seja importante compreender que, aqueles que estão famintos, até mesmo morrendo de inanição, não são indignos do amor de Deus. A pobreza não é um sinal de desaprovação divina. As multidões que clamavam pela ajuda de Jesus não eram enteados negligenciados de Deus. Da forma como vejo, é farisaico e hipócrita o conceito de que uma raça, nação ou continente possa ser menos importante do que outro, menos merecedor ou inerentemente inferior e, portanto, merecedor do seu destino. Essa é uma velha visão teológica que condena os outros como pagãos ou gentios, simplesmente porque eles não fazem parte de uma determinada igreja, círculo social ou hemisfério.
Cada indivíduo é criado por Deus, a Mente divina, e é inerentemente abençoado. Não existe nenhum canto maldito neste mundo. Cada pessoa é dotada de abundantes qualidades espirituais, incluindo inteligência, humildade, criatividade, força e propósito. Cada ideia da Mente é importante, acalentada, merecedora e capacitada para o reino dos céus. Não existe nenhuma ideia de Deus que seja inferior.
Jesus ensinou: "Bem-aventurados os humildes de espírito, porque deles é o reino dos céus" (Mateus 5:3). "Humildes de espírito" não significa carentes. Na verdade, significa que são humildes, dispostos a aprender. Talvez uma das razões pela qual Jesus e Moisés foram tão eficazes ao alimentar multidões e na resolução de problemas, seja a de que eles perceberam a verdadeira identidade espiritual e dignidade de todos os amados filhos e filhos de Deus. Uma vez que eles conseguiam identificar cada um como pertencente ao reino de Deus, as janelas da abundância divina se abriam para todos, pois cada um tem seu lugar á mesa de Deus.
Constatei como a esperança consegue literalmente sustentar um indivíduo faminto, até que a evidência tangível da provisão de Deus seja vivenciada
A partir dessa perspectiva espiritual de dignidade, vamos analisar três maneiras de orar a respeito da fome.
Primeiro, podemos considerar o faminto como hóspede de Deus. Mary Baker Eddy escreveu sobre ser um "peregrino na terra" e um "hóspede de Deus" (Ciência e Saúde, p. 254). Devíamos começar nossa oração para saciar a fome global, afirmando que cada indivíduo ao redor do mundo é um hóspede de Deus, que, sendo o Amor divino, acolhe cada criança, homem e mulher. Deus é o Anfitrião e Seus recursos divinos são suficientes para saciar os famintos.
Um bom convidado sempre traz um presente para o anfitrião. Á medida que orarmos para os hóspedes de Deus podemos oferecer gratidão como nosso presente ao Anfitrião divino. Gratidão é um reconhecimento pelas bênçãos do passado e do presente. A gratidão abre e fortalece a intercomunicação de Deus com Seus hóspedes. A gratidão prepara tanto nós como os outros para receber respostas inspiradas com relação a formas eficientes de se produzir e distribuir os alimentos para os hóspedes de Deus no mundo inteiro.
Outro presente que podemos oferecer é a esperança. Manter a esperança em nossos corações e oferecê-la como um presente para os outros, transforma-nos em hóspedes cheios da expectativa do bem, á mesa do Amor. Constatei como a esperança consegue literalmente sustentar um indivíduo faminto, até que a evidência tangível da provisão de Deus seja vivenciada.
Ao ficar sozinha, debilitada pela fome, ela pensava em seu marido, que a esperava no final da viagem
Um exemplo de esperança que acho particularmente inspirador consta da experiência de Isabel Godin, que sobreviveu a uma viagem através da inóspita floresta Amazônica, em 1770, após seus companheiros terem perecido de fome e doença. Ao ficar sozinha, debilitada pela fome, ela pensava em seu marido, que a esperava no final da viagem. Com essa única esperança em mente, ela se levantava e seguia em frente: "Em seu terceiro dia vagando sozinha, suas orações foram atendidas. Em um pequeno arbusto rasteiro, ela se deparou com um ninho cheio de ovos frescos, uma coisa muito rara de se encontrar em uma floresta tropical, e que acabou se tornando sua maior refeição durante semanas" (Robert Whitaker, The Mapmaker's Wife [A esposa do cartógrafo], p. 270). Ao encontrar frutas silvestres nos dias subsequentes, Isabel conseguiu sobreviver até ser resgatada por uma tribo indígena. Isso pode servir para ilustrar como nossa oração de gratidão e esperança pode ajudar a sustentar indivíduos, até que os recursos de Deus sejam descobertos e vivenciados.
Segundo, vamos considerar a fome mental, emocional e física, como recolhedores de espigas que ficam da sega no campo de colheita de Deus. Os recolhedores apanham o que restou de bom ao final da colheita. Por exemplo, a filha de uma mulher de Canaã foi curada quando sua mãe reivindicou seu direito de colher a inspiração de Jesus. A mãe disse a Jesus: "...os cachorrinhos comem das migalhas que caem das mesas dos seus donos" (Mateus 15:27). Jesus reconheceu o valor de recolher as migalhas da inspiração. A filha foi curada e estabelecida a lei divina, que protege o direito de todo indivíduo de colher inspiração e cura do banquete da Alma.
Todos podemos ser recolhedores da inspiração para compartilhá-la com outros. O ato de recolher valoriza cada migalha de conforto e coloca essas ideias em uso. Falando de modo prático, os bancos de alimentos em minha cidade natal, Nashville, nos Estados Unidos, e estou certa que também em outras comunidades, praticam essa recolha ao juntar o alimento dos restaurantes e de outras fontes, a fim de alimentar os sem-teto. Orar para apoiar o princípio divino dessa recolha é uma maneira de valorizar a abundância que já está à mão, ao invés de permitir que esses recursos sejam desperdiçados no campo. A recolha espiritual e prática é um meio eficaz de alimentar o faminto e curar o doente.
Pratiquemos a recolha prática e espiritual. Oremos pelos viandantes
Terceiro, podemos orar pelos viandantes fatigados para que encontrem descanso e tenham sua sede mitigada. Mary Baker Eddy menciona em Ciência e Saúde que "milhões de mentalidades sem preconceitos" e "que com simplicidade procuram a Verdade". Ela os denomina "viandantes fatigados, sedentos no deserto". Em seguida, ela insta aos leitores para darem a eles "um copo de água fresca em nome de Cristo, e nunca [recearem] as consequências" (ver p. 570). Esse copo de água fresca é a oração. Muitos famintos no mundo são refugiados de guerra, de desastres naturais, de perseguição religiosa ou política. Muito frequentemente, esses refugiados são mães com seus filhos ou crianças órfãs à procura de alimento e da promessa de uma vida melhor.
Deus abençoa aa cada um com mais do que migalhas de conforto. Deus está agora mesmo abrindo as janelas do céu derramando bênçãos.
Será que não podemos deixar uma luz acesa em nosso coração para orarmos pelos viandantes fatigados e ajudá-los a serem conduzidos ao Cristo, a Verdade, que atende a todas as necessidades humanas? O Cristo é a mensagem espiritual de Deus à humanidade, que provê inspiração prática para solucionar os problemas diários. Podemos orar para que a luz do Cristo, a Verdade, esteja presente para guiar o viandante. Também podemos orar para que da rocha, em outras palavras, do maior obstáculo, possa sair água, a solução que cura e salva. Podemos orar pela segurança dos viandantes fatigados, sabendo que o caminho deles está protegido da inveja e do ódio. Cada oração por eles tem um efeito sanador e salvador.
Existe algo que podemos fazer para ajudar tanto a nós mesmos como a outros que estejam famintos. Acalentemos cada um como o hóspede de Deus. Pratiquemos a recolha prática e espiritual. Oremos pelos viandantes.
Deus abençoa a cadaa um com mais do que migalhas de conforto. Deus está agora mesmo abrindo as janelas do céu e derramando bênçãos e "não haverá espaço suficiente para recebê-las" (Malaquias 3:10, conforme versão bíblica King James).
