Há alguns anos, um amigo que trabalhava como repórter fotográfico viajou durante um ano por toda a África, fotografando as crianças desse vasto continente.
Como a véspera de Natal se aproximava, ele entrou em um humilde povoado, onde foi convidado a passar a noite com uma família constituída por cinco crianças. Ele fora informado que aquelas crianças haviam ficado órfâs naquele ano, devido a complicações que seus pais tiveram com a AIDS. Seria normal esperar que o clima fosse sombrio, mas uma fita gravada naquela noite, e que meu amigo compartilhou mais tarde comigo, revelou o contrário. Havia um maravilhoso som de cantoria e risadas infantis espontâneas, tanto por parte desse amigo quanto das crianças.
Após ouvir a gravação, percebi que o som de alegria incontida permaneceu comigo durante vários dias. Fiquei imaginando como as crianças, naquelas circunstâncias, poderiam ser tão alegres e espontâneas. Elas nitidamente sentiam uma felicidade que soava de forma tão vibrante, que eu podia senti-la até mesmo de outro continente.
Se perguntarmos a alguém com o que se parece uma familia ideal, poderemos obter as mais intrigantes respostas
Enquanto analisava esses fatos repetidamente em meus pensamentos, este versículo de um Salmo me veio à mente: "Deus faz que o solitário more em família..." (Salmos 68:6). Compreendi que esse conceito não estava limitado à noção de que Deus coloca cada um de nós em uma unidade familiar humana. Deus não age como uma espécie de agência de adoçāo ou, ampliando a ideia um pouco mais, como uma agência matrimonial a que se possa recorrer para se constituir uma família. Muito mais do que essas úteis agências humanas, possuímos, por dádiva divina, esse sentimento de família em nosso coração, somos receptivos a ele, e permitimos que brilhe na nossa consciência. Essa maravilhosa dádiva de consolo está continuamente disponível para nos elevar e capacitar a vivenciar o sentimento de "família", exatamente onde estamos, a cada dia.
Normalmente, quando as pessoas pensam em suas famílias, pensam em pessoas específicas, amando incondicionalmente algumas e, outras, talvez não. Pode ser que pensem em muitas pessoas ou em apenas algumas. Para cada um, esse quadro mental pintado é diferente. Mas se perguntarmos a alguém com o que se parece uma família ideal, poderemos obter as mais intrigantes respostas, uma vez que começaríamos a falar sobre qualidades. Os pensamentos imediatamente se volvem ao amor incondicional, à aceitação, a um senso de inclusão, ao senso de consolo, apoio e encorajamento, em todas a circunstâncias. Considerado sob a forma mais satisfatória possível, o conceito de família inclui um senso de segurança, de alegria, de calor, de se ter um nicho, de compartilhamento e da asa protetora da estabilidade.
Com o estudo da Ciência Cristã, cheguei à conclusão de que essas qualidades de família se originam em Deus, o próprio Amor, em vez de se originarem em circunstâncias humanas. As qualidades que constituem a família são manifestações de Deus, estão divinamente imbuídas no pensamento e se tornam evidentes em nossa vida.
Desde que tinha dois anos de idade, meu lar foi constituído apenas por mim e minha mãe. Mas foi apenas na adolescência que me dei conta de que não tínhamos qualquer outra pessoa em nossa vida a quem poderíamos normalmente chamar de “família”. Nas ocasiões festivas, nossa mesa estava sempre cheia de risos, alegria e das conversas inteligentes de todos os amigos que minha mãe convidava para se juntar a nós. Houve muitas pessoas em minha vida que desempenharam o papel de pai e de mãe, com grande bondade e sabedoria.
Estou certa de que isso aconteceu porque minha mãe permitiu que a graça de Deus cuidasse de nós. Em vez de se mortificar por aquilo que não tínhamos, ela aceitava a abundância do amor que vinha de Deus, e isso abriu seus olhos para os exemplos concretos de ternura que estavam ao nosso redor. Muitos anos mais tarde, quando ela faleceu, essa mesma atitude, de aceitar a natureza espiritual de consolo e inclusão, capacitou-me a permitir que outras pessoas me acolhessem como mães e me proporcionassem um lindo sentimento de família.
Essa terna comunicação de Deus é a açāo do Cristo, a plena, completa e ativa expressão de tudo o que Deus é, e a revelação dessa totalidade na consciência humana. Mary Baker Eddy, que durante muitos anos ansiava pelo aconchego de uma família, descobriu que esse eterno Cristo está sempre presente e sempre ativo na experiência de cada um de nós. Ela escreveu: “Cristo é a idéia verdadeira que proclama o bem, a mensagem divina de Deus aos homens, a qual fala à consciência humana” (Ciência e Saúde, p. 332). De fato, esse Cristo consolador está, repetidas vezes e com benevolência, reconfortando-nos com um consolo materno genuíno e com força paternal que é tanto consistente quanto sábia, e cuidando de todos nós com um companheirismo diário, incluindo até mesmo a pura alegria e naturalidade infantis. Exatamente no prefácio de sua principal obra, Ciência e Saúde, Mary Baker Eddy descreveu essa ação palpável do Cristo como: “Emanuel, ou 'Deus conosco'—uma influência divina, sempre presente na consciência humana, e que se repete, vindo agora como fora prometido antigamente...” (p. xi).
O Cristo desperta em cada um a grandeza do sentimento de família que já está presente em nós
O motivo, que está por trás do fato de nos volvermos a essa influência divina, não é o de usar a Deus e Suas qualidades para fazer remendos naquilo que consideramos uma unidade familiar aceitável. Ao contrário, é revelado dentro do coração receptivo para que despertemos para uma visão mais plena de família dentro do nosso pensamento, dentro da consciência. Isso resulta em bênçãos tangíveis inundando nosso pensamento e nossa vida e, por sua vez, abençoamos a outros.
Então, o que nos impede de sentir a presença e a força do sentimento de família? Talvez a insistência mental de que as qualidades que estamos dispostos a aceitar precisem vir de um círculo específico de pessoas. Lamentavelmente, esse foco restrito pode limitar nossa receptividade à expansão e à abrangência do plano de Deus. O clamor: “Sim, mas eu quero...” precisa dar lugar, dar espaço, ao reconhecimento da natureza infinita da terna provisão de Deus para cada um de nós.
O empenho para se ter o conforto de uma família sempre fez parte da história humana. O coração anseia por se sentir conectado, aceito e como parte de algo que tanto é bom como inclusivo. Não é maravilhoso saber que o Cristo desperta cada um de nós para a grandeza do sentimento de família, o qual já está presente em nós? Já possuímos as melhores qualidades que compõem o lar e a família, e podemos compartilhá-las com todos.
