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Mártires e heróis trágicos

Da edição de abril de 1984 dO Arauto da Ciência Cristã


Recordo-me bem de quais eram meus sentimentos de adolescente enquanto lia grandes romances clássicos de amores trágicos! Os personagens pareciam talhados um pouco acima dos simples mortais, cujas vidas insípidas exigiam sacrifícios menos extremos. Que magnífico, pensava eu, amar com tanta profundidade e na mesma proporção sofrer! Como jovem atriz sentia-me atraída pelos papéis trágicos, ignorante de que meu talento condizia mais com as comédias.

Mais tarde, no entanto, depois que eu mesma sofri duramente com a perda de um amor, lembrei-me do que a Sra. Eddy diz sobre o falso sentido de martírio nas relações humanas: “Fazer o papel egoísta de martir é o artifício de uma mente desonesta, nada menos que interesse próprio; e o sofrimento real haveria de fazer cessar essa farsa.” Miscellaneous Writings, p. 288. O sofrimento real pôs fim a essa farsa, mas não antes de que eu estivesse disposta a admitir que sofrimento algum, em si mesmo e de si mesmo, confere grandeza à sua vítima.

Deus não nos recompensa por permanecermos perpetuamente de coração partido pela perda de um amor ou por desempenharmos o papel autoconferido de mártir de alguma causa pessoal. O único compromisso digno de nossa dedicação total é o de devotarmo-nos em nossa vida a expressar o Amor universal. Somente no desempenhar desse compromisso podemos encontrar a glória e desfrutar, também, de relacionamentos que proporcionam alegria ao invés de desespero.

Deveríamos, então, deixar de levar em conta tudo o que a literatura e a história nos falam da vida de personagens trágicos? Se assim fizéssemos, talvez iríamos perder valiosas lições e vislumbres a respeito do caráter. Os dramas trágicos em geral expõem o mal oculto e ilustram como sua natureza se autodestrói; ou talvez chamem atenção para injustiças sociais que precisam ser corrigidas. A história dos mártires pode proporcionar exemplos inspiradores de pessoas que colocaram a consciência e a Verdade acima do medo à morte. Haveria dano apenas se interpretássemos erroneamente a mensagem do sofrimento trágico — interpretação errônea que procuraria fazer-nos engrandecer e acalentar o conceito de sofrimento na vida, como se suportar a dor fosse virtude especial. Tal interpretação errônea consideraria que a glória da vida de Jesus havia culminado na agonia de sua crucificação ao invés de em sua ressurreição e ascensão. A vida de Jesus, corretamente compreendida, enfatiza a necessidade de elevarmos a consciência acima da dor causada pelo sofrimento a fim de glorificarmos a Deus mediante lealdade mais divina.

Provavelmente todos conhecemos pessoas que, diante de tragédias pessoais, lastimaram-se, dizendo: “Por que eu?” de tal maneira que quase soava como se acreditassem terem sido escolhidas a dedo para receber uma distinção especial — a de terem de sofrer mais do que outros. Muitas vezes é por um sentimento sutil, mas errado, que pessoas perfeitamente capazes de se elevarem acima da tragédia e de continuarem a ir para frente são levadas a se apegarem a sua tristeza, dor, a suas recordações de injustiças e seus desejos frustrados. Essas atitudes são fomentadas pela tendência, nos meios noticiosos, de dar cobertura sensacionalista, de destaque, a tragédias pessoais.

O reconhecimento de que Deus é a única fonte quer da honra quer do domínio, e de que Deus os outorga imparcial e abundantemente aos que fazem Sua vontade, liberta os mortais de futilmente estarem à procura de adulação pessoal. Um recurso de que Satanás lançou mão para tentar Jesus foi o da glória pessoal. Jesus rejeitou essa oferta citando as Escrituras: “Ao Senhor teu Deus adorarás, e só a ele darás culto.” Mateus 4:10. Daí por diante, em seu ministério, Jesus identificou a honra apenas com Deus. Até mesmo a glória que resultou de seu sofrimento na cruz não adveio do sofrimento como tal, mas da vitória sobre o sofrimento. A Sra. Eddy escreve a respeito desse acontecimento: “Glória a Deus e paz aos corações em luta! Cristo removeu a pedra que obstruía a porta da esperança e da fé humanas, e pela revelação e demonstração da vida em Deus, elevou-as à possibilidade de uma unificação com a idéia espiritual do homem e seu Princípio divino, o Amor.” Ciência e Saúde, p. 45.

Ao buscarmos em Deus a fonte do reconhecimento ao invés de em circunstâncias pessoais de destaque (trágicas ou não), cessamos de romancear a tristeza. Vemos que o homem está eternamente caracterizado pelo que reflete de Deus.

Às vezes, unir a glória e a dor não é escolha consciente na mente do sofredor. Ao tratar de um caso em que a tristeza parece ser particularmente agressiva e renitente, o praticista da Ciência Cristã pode ser levado a dar atenção específica, no tratamento mental para esse paciente, à negação veemente da crença generalizada no mundo de que existe grande mérito no sofrimento em si. Em muitos casos, essa negação, seguida pela afirmação de que Deus é a fonte de toda glória, sera exatamente aquilo que se faz necessário para libertar o paciente da tenaz da tristeza e trazer nova receptividade e disposição de ceder ao Consolador que cura. Então encontramos satisfação mediante a revelação de nossa união com Deus, de nossa unidade com a bondade e com o Amor universal, que não conhece separação ou perda, injustiça nem dominação pessoal, nem lealdade obstinada e mal empregada, nem paixão voluntariosa. Começamos a sentir a recompensa incomparável de saber que pertencemos a Deus.

Quando o Apóstolo Paulo se regozijou nas tribulações, não foi porque o sofrimento lhe desse prazer, mas porque seu domínio sobre o sofrimento o unia com a glória de Deus, glória que Cristo Jesus demonstrou de maneira tão completa. E assim hoje, ater-se persistentemente a um sentido trágico de sofrimento nada nos proporciona de que nos possamos orgulhar. Só o nosso domínio sobre tal tristeza (mediante o reconhecimento da eterna presença do poder do Cristo) dá-nos abundantes razões de regozijo. Como Paulo o coloca quando escreve aos romanos: “Para mim tenho por certo que os sofrimentos do tempo presente não são para comparar com a glória por vir a ser revelada em nós.” Romanos 8:18. Mas, quando? se poderia perguntar. A Sra. Eddy escreve: “Agora é o tempo de desaparecer aquilo a que se chamam dores e prazeres materiais, pois ambos são irreias, porque impossíveis na Ciência.” Ciência e Saúde, p. 39.

Quanto há de liberdade em se compreender, mediante a Ciência Cristã, que não existe realidade no sofrimento, mas que a glória eterna está disponível para cada um de nós agora mediante o reflexo do que é divino! Quando desaparece a crença sutil que diz haver vantagem em identificar-se alguém com circunstâncias trágicas, perde-se do pensamento mortal o apelo que lhe faz o sofrimento, e assim se torna mais fácil superá-lo.

A alegria que provém de se despertar cada dia e saber que se é filho querido de Deus — e não uma personalidade finita cujo passado está cheio de cicatrizes ou cujo futuro está condenado a ser sem alegria, mas filho mantido no eterno agora da eterna presença do Amor — é infinitamente mais satisfatória do que a distinção dúbia de acreditar-se alguém um sofredor talentoso. Essa alegria é algo mais do que meramente encarar o lado bom das coisas. A influência divina rompe o apego mórbido a experiências trágicas, cura toda crença em que nelas tenha havido realidade, e troca o desespero pelo domínio.

Alguém que tenha sentido a tentação da autocompaixão e que tenha procurado glorificar-se mediante o martírio pessoal ou a tristeza pessoal pode regozijar-se agora com um ponto de vista mais similar ao do Cristo. Pode experimentar a transformação que acompanha a obediência ao conselho bíblico: “Aquele que se gloria, glorie-se no Senhor.” 1 Cor. 1:31. Com profunda alegria, podemos repetir, juntamente com a linha final da grande oração de Jesus, consignada no Evangelho de Mateus: “Pois teu é o reino, o poder e a glória para sempre.” Mateus 6:13.

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