Já lhe aconteceu procurar fazer a coisa certa e depois ficar pensando se valia a pena o esforço? Se, no final das contas, ser “uma boa garota” ou “um bom rapaz” significava algo mais do que deixar de se divertir? Eu já pensei muito nisso. Por isso, eu sempre procuro examinar os meus motivos, especialmente quando estou agindo de acordo com as regras. Será que eu estou sendo obediente a essas regras só porque tenho medo das conseqüências que podem resultar da minha desobediência? Será que o meu bom comportamento não passa de uma fachada hipócrita, em vez de ser a expressão de um desejo sincero de fazer o que é correto? Será que, no fundo, eu não gostaria de me rebelar contra essas normas?
Embora a mera obediência à letra da lei moral possa nos proporcionar proteção e segurança, pode também causar decepção. Precisamos viver o espírito da lei, para receber todas as bênçãos que resultam da obediência. E se, nesse processo, a pessoa vagueia entre o espírito da lei e a excessiva indulgência com os próprios desejos, ou o abandono negligente, nunca é tarde demais para voltar ao refúgio do amor de Deus.
Uma das mais brilhantes parábolas de Jesus aborda esse assunto. Ela conta a história de um filho que, de posse de sua herança, abandona a casa de seu pai e gasta tudo “vivendo dissolutamente” (ver Lucas 15:11-32). Ao se encontrar sem dinheiro e relegado ao serviço de cuidar de porcos, o filho se dá conta de que, até mesmo os empregados de seu pai estão em situação muito melhor do que a dele. Embora ele agora se considere indigno de ser filho de seu pai, toma o caminho de casa, arrependido, esperando que lhe seja permitido trabalhar ali como empregado. Porém, quando o pai o avista, corre ao seu encontro, o abraça e organiza uma festa para celebrar o seu regresso.
O irmão mais velho desse rapaz, que era um sujeito bem-comportado e muito trabalhador, sente-se injustiçado com tudo isso. Ele não acredita que o seu irmão voluntarioso mereça que o pai o receba de braços abertos. É difícil para o filho mais velho aceitar o amor incondicional do pai por seu filho mais moço. Aparentemente, ele acha que o amor deve ser merecido por boa conduta. Até onde sabemos, pelo fato de ter observado as regras durante toda a sua vida, ele se manteve longe de problemas. Isso, porém, não fez com que ele sentisse o abraço que sempre estivera esperando por ele, porque ele não havia captado realmente o espírito de amor que predominava na casa de seu pai.
O irmão voluntarioso, por sua vez, aprende muito bem a diferença entre o vazio da indulgência excessiva com seus próprios desejos e as ricas bênçãos que acompanham a verdadeira bondade. A sua busca e a autocrítica que se operou nele ao chegar ao “fundo do poço”, finalmente o conduziram de volta ao lar, para um reencontro alegre e uma feliz comemoração.
Deus aceita aqueles que vêm a Ele com humildade e sem egoísmo.
Para mim, a parábola de Jesus ensina que, apesar da idéia que fazemos de nós mesmos, sempre fomos e sempre seremos filhos do nosso Pai verdadeiro. Tudo o que Ele tem é nosso e nada temos sem Ele. Até mesmo na pocilga, o filho teimoso continuava sendo o filho de seu pai. Enquanto o filho mais velho trabalhava nos campos do pai, seu direito estava à sua disposição, para que ele o reivindicasse. O afastamento do grande amor do pai, que os dois filhos sentiam, lhes havia sido imposto por eles mesmos.
O apóstolo Paulo salienta a diferença entre viver em conformidade com a letra e viver de acordo com o espírito, numa mensagem em que ele escreve: “...a nossa suficiência vem de Deus, o qual nos habilitou para sermos ministros de uma nova aliança, não da letra, mas do espírito; porque a letra mata, mas o espírito vivifica” (2 Cor. 3:5,6). Que grande diferença existe entre deixar que Deus purifique nosso coração e nós mesmos tentarmos fazer isso, partindo de um sentido de bondade pessoal. A segunda alternativa não traz muita satisfação e não é convincente.
Descobri que os jovens são particularmente perspicazes e notam quando a correção moral não passa de fachada. Lecionar na Escola Dominical e educar três filhos ensinaram-me o valor da franqueza. Quando as crianças me fazem perguntas difíceis, creio que não há mal nenhum em respondê-las honestamente. Às vezes, isso significa dizer: “Sabe, eu também não compreendo isso.” Todos nós, crianças e adultos, estamos sob o cuidado do nosso Pai-Mãe Deus. Todos nós temos liçóes a aprender.
Precisamos ser
pacientes para
conosco e para
com os outros.
Precisamos também ser pacientes para conosco e para com os outros, à medida que a individualidade vai se desenvolvendo. A verdadeira individualidade corresponde ao que Deus vê em nós. O que os outros pensam a nosso respeito não tem muita importância. Pôr em prática o pouco que compreendemos dá resultado, mesmo que, às vezes, cometamos erros.
Paulo falava por experiência própria quando escreveu: “.. . prossigo para o alvo, para o prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus. Todos, pois, que somos perfeitos, tenhamos este sentimento; e, se, porventura, pensais doutro modo, também isto Deus vos esclarecerá” (Filip. 3:14,15). Deus aceita aqueles que vêm a Ele com humildade, livres do ego. Às vezes, precisamos passar por experiências dolorosas, como a do filho voluntarioso, para que a disposição de nos volver a Deus desperte em nós. Já em outras ocasiões, a oração e a comunhão com Deus nos elevam suficientemente, e assim somos poupados da experiência de ter de aprender da maneira mais difícil. Muitos de nós, em uma ou outra ocasião, passamos pelos dois tipos de experiência. Mas, durante todo o tempo, o amor de Deus por nós permanece inabalável.
Como acontece com os irmãos na parábola de Jesus, nós também compreenderemos melhor o nosso direito divino inato. Como eles, nos sentiremos cada vez mais envolvidos pelo amor do nosso Pai celeste misericordioso, cujo cuidado está sempre à mão.
