A libertação, em 2 de julho de 2008, de colombianos mantidos reféns havia muito tempo, inclusive da ex-candidata à presidência da Colômbia, Ingrid Betancourt, foi mundialmente comemorada e teve aquele sabor que se sente quando uma ameaça de violência é derrotada. As negociações de paz no Quénia, depois de meses de luta, foram descritas como "um modelo de pressão internacional e de mediação liderada pela África" (The Christian Science Monitor, 7 de agosto de 2008). Uma variedade de fatores práticos levou a esses resultados muito bem-vindos e muitas pessoas estiveram orando na esperança de que se realizassem.
Entretanto, centenas de reféns que ainda permanecem cativos na Colômbia, grande número de jovens mortos a facadas no Reino Unido nos últimos anos, e os persistentes atos de brutalidade entre a Rússia e a Geórgia mostram a necessidade de mais progresso para se por um fim à onda de violência global.
Esse cenário constantemente repleto de manchetes trágicas pode provocar uma atmosfera mental de ansiedade e, até mesmo, de pavor. Isso fica bem acentuado caso um incidente afete diretamente a nós ou a um ente querido. A violência se vangloria de sua própria inevitabilidade. Ao invés de confrontar a ameaça de violência, nossa mais acalentada esperança talvez seja afastá-la o mais possível, precavendo-nos com relação ao local onde morar, para onde viajar, de quais atividades participar.
Usar de cautela com relação a essas escolhas, tanto para nós mesmos, como para nossa família, não é necessariamente algo errado. A sabedoria divina está sempre propensa a nos guiar. Entretanto, acaso é suficiente estabelecer um modelo de segurança para uns poucos, enquanto outros ainda são obrigados a morar em locais mais perigosos ou estão submetidos pela sociedade a estilos de vida que os tornam vulneráveis?
Uma perspectiva espiritual que compreende a Deus como o bem infinito e universal determina que a vulnerabilidade de qualquer pessoa à violência deve importar a todos. Tal como Mary Baker Eddy, a Descobridora da Ciência Cristã, indicou em seu livro Miscellaneous Writings (Escritos Diversos) 1883—1896, p. 18: "Somente quando admitimos o mal como realidade e nos deixamos levar por maus pensamentos, é que podemos, na crença, separar os interesses de um homem dos interesses de toda a família humana, ou assim tentar fazer separação entre a Vida e Deus". A segurança pessoal para si e para a própria família pode ser motivo de grande gratidão, mas não precisa ser o limite para nossas orações.
Mary Baker Eddy propôs estas duas questões em Ciência a Saúde: "Porventura os meios materiais são o único refúgio contra os acasos fatais? Porventura não haverá permissão divina para vencer toda espécie de discórdia pela harmonia, pela Verdade e pelo Amor"? Então, ela respondeu de forma encorajadora, com a seguinte declaração: "Devemos lembrar-nos de que a Vida é Deus e de que Deus é onipotente" (p.394). A implicação aqui certamente é de que há permissão divina para se acabar com a violência. Essa é uma sólida razão para começarmos a superar ativamente todo tipo de perturbações nas comunidades e no mundo.
Ver que a violência é uma imposição sobre a consciência humana, tanto individual como coletiva, é um bom começo. Em tal caso, é possível provar progresivamente, por meio da oração, a universalidade da harmonia espiritual. Um sentimento sombrio de raiva e perigo se dissipa quando tivermos em mente a natureza do Divino como a Verdade, a Vida e o Amor universais e eternos, em toda a sua infinitude. Sempre que ouvirmos falar de violência, ou a enfrentarmos em nossa própria vida, podemos imediatamente nos volver à luz de Deus a fim de vislumbrarmos uma sólida segurança que pertence a cada um e a todas.
A experiência de uma amiga mostra que o pensamento inspirado pela oração pode fazer a diferença quando se trata de combater a violência urbana, que muitas vezes é percebida como aleatória e irracional em sua natureza.
Quando minha amiga, ao sair de uma estação do metrô de Londres, foi detida por alguém que portava uma faca, antes que fizesse qualquer coisa para se defender, ela já possuía algo a seu favor. Estava se sentindo espiritualmente elevada em virtude de um evento do qual acabara de participar. O foco do evento era o de compartilhar relatos pessoais de cura por meio da oração. Conforme ela mesma relata: "Estava cheia de maravilhosas ideias a respeito de quem eu sou em relação a Deus e como nós todos somos Seus filhos, e, portanto irmãos e irmãs". Ela estivera ponderando essas ideias antes que aquele homem se aproximasse.
Consequentemente, ela não sentiu medo nem desespero. Ao contrário, sentiu-se amparada por reconhecer que Deus amava tanto a ela quanto àquele homem e que Deus estava cuidando de ambos naquele exato momento. Contou que, quando disse ao homem que ele realmente não queria fazer aquilo que estava prestes a fazer, ele olhou para ela, depois para a faca e disse simplesmente: "Não, não quero". Em seguida, virou-se e foi embora.
Pela consciência espiritual de que todas as ideias de Deus coexistem espiritualmente como irmãos, a ameaça de violência simplesmente perdeu o poder de convencer minha amiga de que ela seria uma vítima. Essa consciência elevada também ajudou o homem a abandonar a ideia de que ele poderia causar algum mal. Longe de ver isso como uma lembrança traumática, ela encara esse incidente como uma nítida prova da proteção de Deus.
O evento do qual ela participara antes do ataque frustrado era a reunião de testemunhos da quarta-feira, em uma igreja filial da Ciência Cristã. Entretanto, não é preciso ser um frequentador assíduo de uma igreja para se sentir, e ser, protegido da maneira como ela o foi. A reunião à qual ela assistira foi uma via de inspiração naquela noite, e foi essa inspiração que veio em seu auxílio. A Ciência divina de Deus e Sua criação, o destaque daquela reunião, está universalmente disponível a todos.
Essa Ciência do Cristo é a compreensão, a percepção de que Deus está irrevogavelmente uno ao homem (significando todos os homens, mulheres e crianças), e é a percepção e o reconhecimento da inocência eterna e espiritual do homem. É a compreensão inspirada que Jesus teve ao caminhar ileso através de uma multidão hostil que tencionava matá-lo (ver Lucas 4:28-30). É o entendimento que pode vir a todo coração receptivo às ideias e intuições espirituais que Deus está sempre provendo a todos, a despeito das circunstâncias.
Portanto, é razoável inferir, a partir de uma prova de superação da violência, como no caso de minha amiga, que um crime com faca é "curável"? É lógico e justo ver uma demonstração individual de proteção como um indicativo da possibilidade de se dissolver a violência em todos os casos?
Não de maneira ingênua e simplória! No entanto, qualquer exemplo de superação da violência por meio da oração prova que a regra protetora do Princípio, Deus, está universalmente disponível, está aqui presente e tem poder. Nem todo crime de rua ou instabilidade no governo será erradicado de uma tacada só, mas é justo concluirmos que um princípio comprovado, em um único caso, tem de ser exatamente tão acessível e passível de comprovação em todos os casos.
Entretanto, o que dizer da violência que parece menos aleatória e fortuita e mais planejada e reacionária? Da violência que muitas vezes coloca grupos de pessoas uns contra os outros e está centrada em conflitos entre planos e ideais diferentes?
Mesmo que a instabilidade seja sistêmica ou política (tal como a repressão aos protestos de monges em Miamar, em 2007), ela pode ser anulada em grau cada vez maior pelo reconhecimento de tudo o que é espiritualmente verdadeiro.
Ciência e Saúde menciona um tipo de armadura espiritual disponível a todos, que é capaz de manter alguém a salvo de intenções agressivas: "Revestido com a panóplia do Amor, estás ao abrigo do ódio humano" (p. 571). De acordo com a definição de um dicionário, panóplia significa "uma armadura completa".
Como mencionei anteriormente, há dois mil anos, Jesus provou que isso é verdadeiro quando aquela multidão o ameaçou, enfurecida e profundamente frustrada por ter tido suas tradições religiosas desafiadas pela genuína clareza espiritual do Salvador (ver Lucas 4:16-32). Um homem contra uma multidão furiosa talvez parecesse uma desigualdade terrível, uma situação explosiva destinada a acabar em um violento desfecho. Contudo, os pensamentos de Jesus deviam estar ancorados na realidade espiritual, onde Deus é Tudo e é reconhecido pelos Seus filhos como sendo Tudo. Nesse estado mental, não existem desigualdades assustadoras, somente a certeza da proteção já estabelecida de Deus.
Devido à compreensão de Jesus daquilo que era divinamente real, ele conseguiu caminhar, sem ser visto, por entre aquelas pessoas obcecadas pela vingança. Ele buscou um santuário e o encontrou, desafiando a ideia de que existam forças materiais nocivas das quais precisamos nos proteger e provando a falácia dessa ideia. A totalidade de Deus, diante do ódio, foi o bastante.
Todo ódio humano bem como a intenção de causar dano, se nutridos no pensamento ou se realmente colocados em prática, são produtos da voluntariosa "mente carnal", conforme a Bíblia chama a suposta oposição à Mente divina (ver Romanos 8:7). A mente carnal inclui em si mesma todas as crenças de violência, seja como força motriz, seja como consequente ação. Em outras palavras, tanto o impulso de cometer violência quanto a submissão à violência são produtos dessa mentalidade.
No entanto, nem o desejo de ser violento nem a suscetibilidade a ser vítima da violência se originam na Mente divina ou encontram apoio nela. A mente carnal é simplesmente destituída de realidade em presença dessa Mente infinita. Podemos até mesmo pensar corretamente sobre aqueles que têm sido vítimas inocentes de crimes fatais, podemos saber que estão envoltos pela realidade de Deus, onde a violência não tem alcance. Quando vemos a nós mesmos e a outros revestidos com a panóplia do Amor, afastamo-nos da linha de fogo da mente carnal. Então, a sugestão de que a violência possa ser causa (motivo) ou efeito (ação) perde sua potencialidade. Na verdade, a única causa é Deus e o único efeito é a expressão e a vivência do bem. O ódio humano enfraquece na medida em que nós, em oração, alcançamos a convicção dessa perspectiva mais santa, mais elevada.
O que se faz urgentemente necessário em todo o mundo, para ajudar a inverter o fluxo de violência, é a disposição dos cidadãos de comprovar a disponibilidade e a acessibilidade da presença e do poder de Deus, em sua própria vida e em seus pensamentos inspirados pela oração, com relação às suas comunidades e nações. O desejo de ver o amor protetor, que Deus tem por todos, comprovado mais universalmente é um objetivo legítimo que exige um comprometimento compassivo à oração.
A violência e a harmonia celestial não podem coexistir e não coexistem. Portanto, à medida que nos tornamos mais conscientes de que nós verdadeiramente "vivemos, e nos movemos, e existimos" (ver Atos 17:28) no universo do bem de Deus, a violência perde sua capacidade de se impregnar em nossos pensamentos. Dessa maneira, ela desaparece da experiência humana.
Cada pensamento individual que se volta sinceramente à Verdade divina, em busca de melhor compreensão da ilegitimidade da violência, tem importância. Tudo o que nega a totalidade de Deus não pode perdurar na presença do Cristo.
A única causa é Deus e o único efeito é a expressão e a vivência do bem. O ódio humano enfraquece na medida em que nós, em oração, alcançamos a convicção dessa perspectiva mais santa, mais elevada.
Podemos contribuir com nossas orações sinceras, quando oramos consistentemente para ver além do véu do medo e permanecer alerta para o fato de que a "inevitável" instabilidade global é nula sob a lei de Deus, ou seja, é destituída de poder, não pode concretizar-se porque é, em última instância, desprovida de realidade!
