Para alguns adultos, a oportunidade de estudar pode ser a linha divisória entre afundar ou não na miséria. Mas quando os adultos voltam a estudar, às vezes sentem novamente velhos temores e limitações. especializado em dar aulas a pessoas adultas, constata que um senso espiritual de amor ajuda tanto ao professor como ao aluno, no sentido de romper limitações.
Você poderia descrever sua classe e dar uma idéia do que nela acontece? Eu não me ponho diante da classe fazendo discursos. Os alunos descobrem o que precisam fazer, por meio de vários recursos: livros-textos, fitas gravadas, programas de computador e conversas comigo. Eles aprendem por si mesmos. Estou ali para auxiliá-los nesse processo. Trabalho muito com eles, dando-lhes atenção individual, às vezes em pequenos grupos, mas a maioria das vezes com cada aluno, de um por um.
Como é que a Ciência Cristã faz diferença em seu trabalho? Ajuda-me a combater os estereótipos. Propicia um senso de afeição, de estar nos ajudando uns aos outros, compartilhando nossos talentos. Eu respeito muito aquilo que os alunos tiveram de vencer apenas para estar ali. Alguns têm quatro ou cinco filhos que precisam levantar muito cedo. Outros talvez tenham ficado acordados durante metade da noite. O crime e as drogas fazem parte de seu ambiente. Às vezes estão cansados e exaustos pelas condições inseguras em que vivem.
Meu estudo da Ciência Cristã
Christian Science (kris’tiann sai’ennss) abre-me uma perspectiva a respeito dos alunos que me permite ver que, independente das condições em que eles chegam aqui, seja falta de capacidade ou de motivação ou de cooperação, eu não preciso aceitar nenhuma das limitações, porque Deus fez o homem à Sua imagem e semelhança, tendo total domínio.
Procuro lembrar que Deus está sempre presente, é onipotente, que os ama e que eles podem sentir esse amor e apoio e, assim, elevar-se acima de seus problemas. Também respeito suas realizações no decorrer do curso, pois eles se formam, apesar dos problemas.
Pode dar um exemplo? Quando os alunos entram nesta escola, para muitos é nova a idéia de poderem traçar seu próprio curso, assumir a responsabilidade e seguir até o final. Estão mais acostumados a que alguém lhes diga o que fazer; é esse o seu conceito de escola. À medida que se acostumam com a atmosfera, vendo o que os outros fazem, ficam entusiasmados porque alcançam algum êxito. E esse êxito, muitas vezes, é novidade para eles.
Com freqüência, porém, quando começam, têm uma atitude de autodepreciação e falta de confiança. Sentem-se indecisos e por isso não tentam, não persistem.
Lembro-me de uma aluna que era nova na classe e nunca viera falar comigo. Não incomodava ninguém e parecia estar em atividade. Quando lhe perguntava como estava, encolhia os ombros e dizia: “Tudo bem. Mas há muito que aprender.” Ela já havia estado na escola antes e nunca tivera êxito. Parecia-lhe que agora aconteceria a mesma coisa. Sempre se sentira sem capacidade.
Em situações como essa, gosto de pensar num parágrafo de Ciência e Saúde com a Chave das Escrituras que realmente me auxilia. Nesse livro, a Descobridora e Fundadora da Ciência Cristã, Mary Baker Eddy, escreve: “Na Ciência o homem é o descendente do Espírito. O belo, o bom e o puro constituem sua ascendência. Sua origem não está no instinto bruto, como a origem dos mortais, e o homem não passa por condições materiais antes de alcançar a inteligência. O Espírito é a fonte primitiva e derradeira de seu ser; Deus é seu Pai, e a Vida é a lei de seu ser.” Muitas vezes penso nessas palavras, enquanto trabalho ao lado de um aluno que tem dificuldades. Eu não desanimo ante as crenças dos alunos de que o passado lhes impõe limitações, pois o homem, como idéia espiritual de Deus, como Sua expressão, não tem uma história material que lhe limite as capacidades e oportunidades. Assim, em verdade, não há passado, mas somente a eterna presença constante do Cristo.
Comecei a trabalhar com essa aluna. Ajudei-a a perceber, pelas perguntas que lhe fazia, que ela podia entender as coisas. Sentiu-se amparada e começou a ganhar confiança. Acho que começou a perceber melhor qual era sua verdadeira capacidade. Sua atitude e seu proceder mudaram como um todo. Começou a gostar dos exercícios e a sentir que estava realizando algo. Fiz-lhe um teste sobre a parte que ela estava estudando e obteve cem por cento de aprovação.
Acaso você teve a experiência de trabalhar diretamente com um aluno que continuou a não entender? Claro que tive. Houve uma aluna com quem estivera trabalhando vários dias. Ela simplesmente parecia não captar as coisas, mesmo depois de orientada passo a passo no exercício. A cada etapa, ela dava a resposta certa, mas ao final, quando se esperava que ela tivesse entendido o conjunto, não conseguia fazer nada.
Meu método tivera êxito com outros alunos e, nesse caso, fui tentado a pensar que ela estava com má vontade. Eu sabia que isso não era correto. Tive de retornar à minha própria convicção de que, como filhos de Deus, somos todos capazes e que Deus deu domínio ao homem. Eu precisei pensar mais sobre isso. Precisei ver que minha habilidade de trabalhar com os alunos e o êxito que eu havia obtido antes não eram pessoais. Se os aceitasse como pessoais, então começaria a ficar frustrado ou aborrecido. A Bíblia, porém, afirma: “Todos os teus filhos serão ensinados do Senhor.” Assim sendo, tanto os alunos como eu refletimos de Deus a habilidade de aprender e de ensinar.
Comecei, assim, a pensar em Deus como a fonte da inteligência. Também comecei a perceber que eu poderia continuar trabalhando e tentando, porque sabia que ela conseguiria compreender. Portanto, simplesmente experimentei outros métodos. Trabalhamos juntos. Ela tentou outros tipos de exercícios; por fim começou a captar as questões e acabou passando no exame.
Quando completou o curso, escreveu-me um cartão com os seguintes dizeres: “O senhor foi muito paciente e compreensivo. Havia um problema e o senhor sabia que podíamos solucioná-lo. Gostei disso, o senhor sabia que podíamos vencer.”
Como pôde antever que ela alcançaria a meta final? Vejo o exemplo de Cristo Jesus, quando curava os proscritos da sociedade, pessoas que eram vistas como proscritos. Penso em sua atitude, sua paciência e compaixão e, é claro, sua obra de cura, pois sua paciência não consistia em tolerar os problemas. Se o sigo, não posso tolerar a crença de que os alunos sejam menos do que a imagem e semelhança de Deus. Sendo apenas paciente, eu estaria aceitando limitações. Enquanto que, do ponto de vista da Ciência Cristã, essas limitações são meramente crenças falsas por parte dos alunos e por parte de outros. Portanto, não é com as limitações que precisamos ter paciência, mas sim, paciência em observar o desenvolvimento da verdadeira identidade do aluno. É assim que o exemplo de Jesus me ajuda a persistir e me proporciona inspiração e criatividade.
Você ora a respeito de seus alunos? Quando entro na classe, assumo o compromisso de estar alerta para não aceitar nenhuma influência negativa, quer a respeito de meus alunos, quer a meu respeito ou sobre qualquer outra pessoa do curso, da administração e tudo mais. Respondendo a sua pergunta, sim, eu oro, não por eles, mas por mim, pelo meu modo de vê-los. Tento ver que os estereótipos das condições atuais e da história que remonta aos primórdios da escravidão, e assim por diante, são completamente falsos no que se refere à verdadeira identidade espiritual do homem e de suas capacidades como filho de Deus. O homem não pode absolutamente ser modificado pelos estereótipos.
Como pode afirmar isso? Porque nosso Criador não é um Deus antropomorfo, mas Vida, Verdade e Amor. Portanto, a identidade é verdadeiramente espiritual, isto é, íntegra e completa agora mesmo. Assim posso ver os alunos como totalmente capazes de serem livres desses estereótipos negativos.
Édifícil estar alerta o tempo todo para rebater as imagens negativas? Exige muito. Os desafios são diários. Quanto a mim, consigo melhores resultados quando sou humilde. Quando abro meu pensamento, percebo que sempre há algo novo a aprender. Há alguns dias li um artigo sobre a síndrome alcoólica fetal, sugerindo que filhos de pais alcoólatras poderiam nascer com lesão cerebral. Sugeria ainda que talvez esse fosse o caso de certos estudantes observados pelos professores especializados em alunos adultos, alunos que poderiam, por exemplo, estudar hoje a tabuada, sabê-la bem e, no dia seguinte, esquecê-la completamente. Pensei que esse parecia ser o caso de alguns alunos de nossas classes. Eu não havia pensado anteriormente em lesão física, ou seja, outro aspecto da crença de que a inteligência seja material. Precisei, assim, aprofundar-me no conceito cristãmente científico de que o cérebro não é realmente a fonte da inteligência. A inteligência vem de Deus.
Essa questão veio à tona exatamente no dia seguinte, com a última aluna com quem trabalhei. Estávamos vendo frações e equações e ela não sabia como proceder. No dia anterior, havíamos estudado a regra da divisão de frações e ela entendera bem. Nesse dia, ela já não lembrava nada. Se não fosse a Ciência Cristã, eu teria desistido. Percebi, porém, que todo esse assunto de lesão cerebral devida ao alcoolismo ou às drogas ou à intoxicação por chumbo, não é a palavra final. Meu ponto de partida era Deus como fonte da inteligência, e não se pode danificar a inteligência que vem de Deus. Assim, continuei trabalhando com ela, incentivando todo e qualquer lampejo de percepção por parte dela; e seguimos em frente. Então ela começou a lembrar de coisas que havia aprendido no passado e foi capaz de fazer os exercícios.
Bem, mas se você diz que o cérebro não é um fator que possa obstruir a inteligência, então o que é que ocorre quando os alunos aprendem corretamente? Para mim, quando eles vão bem, trata-se de desenvolvimento. Não é pelo uso do cérebro; é o exercício da capacidade que eles já têm como reflexos de Deus, a Mente única.
Acho que poucas pessoas concordariam com essa afirmação. Existe o ponto de vista material, mas em nossa sociedade há também grandes perspectivas. Em verdade, perspectivas espirituais de igualdade e de liberdade das limitações e, certamente, o programa em que eu trabalho exprime essa esperança para as pessoas. Expressa, sob a forma de um programa oficial, a noção de que as pessoas podem superar suas limitações.
Você não acha que está renegando sua formação profissional de professor, ao afirmar que a inteligência tem origem espiritual? Não, porque a busca empreendida por educadores liberais era essencialmente essa. Montessori, por exemplo, falava do fenômeno da atenção como tendo raízes “espirituais”. Dewey encarava o pensamento como original. Para mim, isso significa que o pensamento não tem base na matéria; porque se é original, não é algo que se possa quantificar ou captar em termos materiais, no que se refere à sua origem. E para Paulo Freire, a educação inclui transformação da consciência, que eu vejo como um fenômeno espiritual. Assim, vencer as limitações a fim de atingir uma elevação do gênero humano é o objetivo que compartilho com outros educadores.
Começo cada dia com expectativa, não de encontrar limitações materiais, mas de vencer barreiras de forma criativa, o que muito inspirador. Não encaro isso como superação de limitações materiais. É a superação de falsas crenças. A cada novo dia, os alunos e eu podemos mostrar e ver em maior grau o homem perfeito.
Mas não devemos pensar que isso vem automaticamente. Lembro-me de certa feita quando me senti febril, na aula. Eu sabia, pelo estudo da Ciência Cristã, que o que parece ser um problema físico, é fundamentalmente uma percepção errônea sobre Deus e o homem. Por isso examinei meu pensamento e descobri que estava alimentando certo temor de que houvesse pessoas, no caso, os alunos, que não tinham nada. Eu estava vendo os alunos como governados por desigualdades de riquezas e desigualdades de préstimos. Em essência, eu estava acreditando que eles eram separados de Deus. E isso, por sua vez, abriu a possibilidade para a crença de que eu também estava separado de Deus, o que se traduzia num falso senso de responsabilidade de que dependia de mim ensiná-los corretamente, senão o programa fracassaria e eles não superariam seus problemas. Eu tinha de separar a questão do âmbito da personalidade humana. Não havia ali um punhado de alunos e eu. Há um só Ego, que é Deus, e o homem reflete esse Deus único. Assim, quando me livrei da sensação de falsa responsabilidade, fiquei curado. Pude, então, ajudar os alunos, pois os via sob a luz verdadeira, em pleno domínio.
Muitos propósitos há no coração do homem,
mas o desígnio do Senhor permanecerá.
Provérbios 19:21
