A crucificação de Jesus não foi um acontecimento inesperado. Os fariseus e os herodianos, praticamente desde o início, pretendiam destruí-lo. Em várias ocasiões durante seu ministério, Jesus já profetizara que o matariam. Ele não contestou os testemunhos falsos apresentados durante seu julgamento perante o Sinédrio, e a principal preocupação de Pilatos era manter a paz, a qualquer custo. Agora é chegada a hora e ela será implacável.
15:21-32 Anteriormente, Jesus havia dito que aqueles que desejassem segui-lo, teriam de tomar sua cruz e fazer exatamente isto: segui-lo. Seus discípulos, porém, o abandonaram. Os romanos obrigaram a Simão Cireneu, que casualmente passava por ali, a carregar-lhe a cruz.
E chegaram a um lugar chamado Gólgota, que quer dizer Lugar da Caveira. As crucificações eram espectáculos públicos cruéis, que tinham o intuito de dissuadir outras pessoas de cometer crimes. A fim de aliviar sua dor, deram-lhe a beber vinho com mirra, uma espécie de narcótico, que ele, porém, não tomou. Então, o crucificaram e repartiram entre si as vestes dele, lançando-lhes sorte. Os bens do acusado eram confiscados e o fato de lançarem sorte para ver quem ficava com suas vestes, ecoa como o antigo lamento bíblico do Salmo 22:18.
Era a hora terceira, aproximadamente nove horas da manhã, quando o confiscados. A acusação formal foi afixada à cruz, acima de sua cabeça, a fim de alertar os que passavam para o crime que fora cometido. A inscrição colocada acima da cabeça de Jesus dizia: O REI DOS JUDEUS. Com ele crucificaram dois ladrões, um à sua direita, e outro à sua esquerda, as duas posições que haviam sido, certa vez, cobiçadas por Tiago e João. Ver Marcos 10:35–45. E cumpriu-se a Escritura que diz: Com malfeitores foi contado.
As pessoas que iam passando, blasfemavam dele, dirigindo-lhe insultos, meneando a cabeça, num gesto de desprezo. E zombavam dele, dizendo: Ah! Tu que destróis o santuário e, em três dias, o reedificas! Salva-te a ti mesmo, descendo da cruz!
A atitude da multidão era compartilhada pelos principais sacerdotes com os escribas que, escarnecendo, entre si diziam: Salvou os outros, a si mesmo não pode salvar-se. E continuava a zom-baria: desça agora da cruz o Cristo, o rei de Israel, para que vejamos e creiamos. Da mesma forma, os que com ele foram crucificados o insultavam. Agora Jesus está só.
15:33–41 Chegada a hora sexta, houve trevas sobre toda a terra até a hora nona. Essa repentina escuridão pode ter tido algum significado para aqueles que estavam pedindo sinais. Tem sido aventado que a escuridão decorreu de algum fenômeno natural. Mas, era a época da Páscoa, que é um período de lua cheia. Teria sido impossível ocorrer um eclipse solar enquanto estivesse na fase de lua cheia. Marcos, porém, provavel-mente reconheceu nesse fato outro cumprimento das escrituras. Ver Amós 8:9. À hora nona, clamou Jesus em alta voz: Eloí, Eloí, lamá sabactâni? Que quer dizer: Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste? Essa é a frase inicial do Salmo 22, que contém versículos que falam de esperança, confiança e fé. Alguns intérpretes acreditam que Jesus estivesse transmitindo uma mensagem velada de esperança a seus seguidores, no sentido de que tudo estava muito bem. Pode ser, mas será que havia seguidores perto dele para ouvir isso?
Aliás, essa não é a primeira referência ao Salmo 22 nessa seqüência de acontecimentos. Outras incluem a divisão das vestes de Jesus lançando a sorte (versículo 18), o meneio da cabeça e a zombaria (versículo 7) e a injúria e o desprezo do povo (versículo 6). A última frase de Jesus é um grito de desespero, que expressa a agonia de não ser entendido e de ser abandonado. E, se ele acreditasse que Deus o havia abandonado, não haveria razão para evocá-Lo!
Entretanto, alguns dos que ali estavam, ouvindo isto, diziam: Vede, chama por Elias! Segundo a tradição judaica, Elias ajudaria os justos na hora da tribulação. Porém, a ironia é que, do ponto de vista de Marcos, Elias já havia vindo na pessoa de João Batista.
Ao ouvir o comovente lamento de Jesus, um deles correu a embeber uma esponja em vinagre e, pondo-a na ponta de um caniço, deu-Ihe de beber, Ver Salmos 69:21 na esperança de entorpecer os sentidos de Jesus, dizendo: Deixai, vejamos se Elias vem tirá-lo! Mas Jesus, dando um grande brado, expirou, sabendo que era o fim.
Nesse exato momento, o véu do santuário rasgou-se em duas partes, de alto a baixo. O verbo rasgar, utilizado neste versículo, também foi usado por Marcos quando houve o batismo de Jesus (Marcos 1:10). Alguns historiadores encaram isso como uma tentativa de Marcos, do ponto de vista lingüístico, para definir o início do ministério de Jesus e, agora, o fim de sua carreira terrena.
Há muito tempo os estudiosos vêm debatendo a que véu do santuário, ou templo, é feita referência neste trecho. Tradicionalmente, pensava-se que fosse à cortina que separa o Santo dos Santos do resto do templo. Acreditava-se, entre outras coisas, que a crucificação de Jesus havia destruído, simbolicamente, qualquer separação entre Deus e o homem.
Mais recentemente, porém, os estudiosos da Bíblia concluíram que a cortina não poderia estar separando o Santo dos Santos. Pelo contrário, eles têm defendido a idéia de que se trata da cortina que ficava pendurada em frente à porta da entrada do templo. Curiosamente, essa cortina foi descrita pelo historiador Josephus, que registrou que ela possuía vinte e cinco metros de altura e era decorada por uma paisagem que retratava o céu. Em outras palavras, o templo parecia o céu. Ao tomar conhecimento de que aquela cortina fora rasgada, os leitores saberiam que o“s céus” se haviam rasgado em duas partes. Isso corresponderia ao que aconteceu por ocasião do batismo de Jesus.
Então, o centurião romano que estava em frente dele, vendo que assim expirara, disse: Verdadeiramente, este homem era o Filho de Deus. Essa frase é uma analogia à declaração de Deus: “Tu és o meu Filho amado”, ouvida durante o batismo de Jesus quando os céus se rasgaram (Marcos 1:11). As palavras do centurião são uma confissão da verdadeira identidade de Jesus. Alguns estudiosos, porém, têm argumentado que, nesses últimos capítulos, as palavras corretas foram ditas apenas em tom de escárnio e zombaria. Eles concluem então que essa frase também carregava um tom irônico, ou seja, o centurião estava tão desapontado com a morte prematura de Jesus que sarcasticamente afirmou: “E ele pensava que era o Filho de Deus!” Tenham ou não essas palavras sido proferidas com profunda compreensão ou em tom de ironia e zombaria, o que acontece é que elas foram imortalizadas como a confissão de fé dos cristãos.
