Chovia torrencialmente e ela estava sentada na calçada em frente ao correio, pedindo esmolas. Ela me chamou de sovina quando não parei para lhe dar dinheiro.
A razão de eu ter agido assim, não tinha nada a ver com ser sovina. Na verdade, tive uma percepção clara sobre ela. Eu a vi com muito mais valor do que ela via a si mesma ou esperava ver-se algum dia.
Pude avaliar como ela estava se sentindo. Ao olhar para ela, lembrei-me de uma ocasião quando me sentia financeiramente liquidada. O socorro financeiro e a piedade das pessoas não me ajudavam a sair da miséria; foi a descoberta da minha verdadeira identidade que me tornou uma pessoa independente.
Eu estava estudando em Londres, havia contraído pesadas dívidas, havia negligenciado meus estudos e estava vivendo às custas de meus amigos. Finalmente, eles se cansaram dessa situação e pararam de me ajudar. Quando a situação ficou irremediavelmente precária, tive de olhar para dentro de mim mesma, se quisesse sobreviver. Esse foi o começo da busca pela minha identidade, o que me levou a uma empolgante jornada de autoconhecimento e domínio próprio.
Essa jornada levou uns vinte anos! Foi um tempo de busca. Cada vez que eu achava que aquilo que eu estava planejando me deixaria feliz e realizada, ficava desapontada. Então, um dia, quando achava que não havia mais nenhuma esperança, alguém me falou sobre o livro de Mary Baker Eddy, Ciência e Saúde com a Chave das Escrituras. Isso mudou totalmente a minha busca. O livro me deu as respostas pelas quais estava procurando. Uma das coisas que li foi: “A escravização do homem não é legítima. Cessará quando o homem entrar na posse de sua herança de liberdade, ou seja, o domínio que Deus lhe deu sobre os sentidos materiais” (p. 228).
Esse foi o início de todas as coisas novas para mim. Nunca havia percebido que eu tinha um direito inato de domínio e que realmente podia reivindicá-lo. Eu havia perdido tudo na vida. Eu era uma sobrevivente, embora pensasse que tinha dado murros em ponta de faca. Agora compreendia que podia lutar a partir de um ponto de vista de uma pessoa vitoriosa. Eu era a filha de Deus. Eu era o produto de Sua força e domínio e nada estava bloqueando o meu caminho, a não ser a maneira como via a mim mesma. Deus era o meu espelho e eu estava refletindo de volta a luz do meu potencial, de um ponto de vista infinito de perfeição, como o Seu reflexo.
Compreendi que seria uma perda de tempo escrever o roteiro da minha vida como uma perdedora, desejando estar em algum outro lugar e ser uma outra pessoa. Decidi viver a minha própria vida, ao invés de tentar viver a vida de alguma outra pessoa.
Um pássaro tem de soltar-se do ramo da árvore a fim de voar. Se eu desejasse conhecer a liberdade de atingir o mais alto potencial da minha vida, tinha de abandonar o galho da árvore, isto é, o medo intenso do fracasso e da pobreza.
Meu próprio despertar impeliu-me a ajudar, de alguma maneira, aquela mulher. Continuei a vê-la várias vezes por semana, sentada na mesma esquina em frente ao correio, próximo do escritório onde eu trabalhava. Ela havia se acostumado a me ver passar e a sorrir para ela. Ela nunca retribuiu o sorriso e me lançava olhares de reprovação. Na verdade, porém, parou de me dirigir palavras injuriosas.
Quando voltava para o escritório, eu anotava as diferentes qualidades que eu havia percebido nela naquele dia e louvava a Deus pela bondade de Sua obra, ou seja, por criá-la com tanta força interior. Reconheci a força e a perseverança que ela possuía, ao vê-la sentada, naquele mesmo lugar desprotegido, durante o rigoroso inverno que estávamos tendo naquele ano. Era uma força que podia romper quaisquer barreiras.
Era a força inata de sua riqueza espiritual, que não permitia, a ela ou a qualquer outra pessoa, ficar atada com algemas ou mantida prisioneira das circunstâncias. Nada poderia paralisar nossa capacidade interior, naturalmente boa e forte, de independência e fazer-nos confiar em qualquer outra coisa, a não ser naquilo que é legitimamente nosso, como filhos amados de nossa divina Mãe, o Amor. Cada um de nós tem um nicho em Seu propósito e somos receptivos a ele.
Um dia, ela se foi.
Não muito tempo depois, uma bela e jovem senhora, bem vestida, passou por mim na rua. Deu-me um radiante sorriso. Sorri de volta. Sabia que conhecia aquele rosto, mas não conseguia me lembrar de onde. Naquela noite, a caminho de casa, de repente, me lembrei. Era a mulher que costumava sentar-se na esquina do correio, pedindo esmolas.
Espero que ela tenha encontrado o que estava procurando. Gosto de pensar que minhas orações a ajudaram em sua jornada, porque alguém, em algum lugar, também deve ter orado por mim, quando eu estava em busca de ajuda.
